“Buscando nos atermos ao budget inicial e não estourar o deadline do cliente, estaremos alocando colaboradores com expertise e capital intelectual para liderar a execução desse job”.
A frase anterior não fez muito sentido para você? Não se preocupe, você não está sozinho, mas precisa se acostumar a esse tipo de vocabulário se faz ou quer fazer parte do mundo corporativo.
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Professor de Fundamentos de Economia nas escolas de Negócios, Engenharia, Comunicação e Saúde da UniBrasil, Marcos José Valle explica que a função dos jargões – palavras e expressões próprias de cada atividade – é poupar tempo e energia na hora de transmitir uma mensagem. “O jargão tem a característica de ser um termo técnico. Ele representa toda uma linha de raciocínio que resume uma ideia em uma única palavra ou expressão”.
Valle exemplifica com um termo do “economês”: custo de oportunidade, que refere-se a avaliar o que é mais vantajoso como, por exemplo, alugar ou comprar um estabelecimento. “Isso funciona entre pares”, garante.
A ressalva está em entender o processo de comunicação, ou seja, o emissor precisa ter certeza que o receptor vai conseguir decodificar aquela mensagem corretamente. Quando uma das partes não tem familiaridade com esses códigos, a situação gera um constrangimento para ambas.
“Parece que a pessoa é pedante, que está apelando para conhecimentos que não podem ser comprovados pelo receptor, e outra pessoa se sente ignorante, intimidada, é colocada numa posição inferior”.
Uso cotidiano
Segundo o professor de linguística da Universidade Federal do Paraná Bruno Dallari, não é incomum que jargões ultrapassem o meio profissional e sejam incorporados ao cotidiano de pessoas que nada tem a ver com aquela área. Termos da psicanálise, trauma ou neurose, por exemplo, são usados indiscriminadamente por leigos e todo mundo entende que, nesse caso, não se está falando das condições de saúde.
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Ou seja, não há mal algum em usar jargões, mas é preciso cuidar para que o processo de comunicação não seja prejudicado. “Tudo que é exagerado é ruim. O ponto fundamental é entender como aquele ambiente funciona e que uma boa comunicação é fundamental”, diz o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças e Tesoureiro do Grupo Renault, Maurício Marchesini Carvalho. Isso se aplica tanto às situações sociais quanto à própria cultura da empresa.
Ruído de comunicação
Nessa lista entram muitos termos em inglês, como network, job, target ou business plan, e outros que são “aportuguesados”, como startar (do verbo start, que em português significa começar), performar (de perform, desempenhar) e schedular (do verbo schedule, que nada mais é do que agendar).
Mesmo havendo uma tradução literal que significaria, essencialmente, a mesma coisa, os estrangeirismos têm outro peso, explicam os especialistas. “O jargão pode remeter à criação do termo, no caso de palavras usadas por autores americanos ou instituições estrangeiras. Ou pode não querer dizer exatamente a mesma coisa”, aponta Valle.
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“Não é necessariamente mais claro usar os termos em português”, concorda Dallari. “’Deadline’ tem uma conotação mais definitiva do que ‘prazo’. ‘Delivery’ e ‘entrega’, a rigor são a mesma coisa, mas ‘delivery’ parece mais imediato. ‘Entrega’ tem um campo semântico mais amplo. É preciso tomar cuidado com a noção da equivalência, porque a palavra tem que ser percebida como equivalente pelos falantes”, acrescenta.
Carvalho acrescenta que essa prática não é mal vista e grandes companhias adotam muitos jargões em inglês como forma de padronização. “Para empresas multinacionais acaba se tornando uma coisa natural e usa-se diariamente palavras como feedback, branding, budget e outsourcing. Faz parte do negócio”.
Quando não se está falando entre pares, o professor da UniBrasil aconselha a incluir uma explicação logo em seguida da utilização da palavra estrangeira, para que não haja estranhamento e distanciamento do interlocutor.
Falar muito e dizer pouco
A mescla de jargões com termos “da moda”, no entanto, acabou criando quase um novo dialeto. “Buscar sinergias”, “ideias disruptivas”, “profissional proativo” e “liderança estratégica” são algumas das expressões que tomaram conta de sites empresariais, currículos e descrições de vagas de emprego. Usadas à exaustão, acabam perdendo qualquer significado.
“Às vezes as pessoas não sabem do que estão falando, mas percebem que as outras pessoas estão falando aquilo e não querem ser excluídas”, sugere Valle. “No LinkedIn isso é muito comum. O profissional seleciona palavras-chave e quer mostrá-las para as outras pessoas – a pompa das palavras vale mais do que o conteúdo que está sendo apresentado”.
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O linguista da UFPR afirma que esse discurso, bastante usado em contexto motivacional, foi importado dos Estados Unidos. “[O uso dessas palavras] quer passar a noção que o mundo das empresas é mais emocionante do que ele efetivamente é”. Na opinião dele, a inconsistência desses termos é o maior problema: ou não significam nada ou poderiam ser simplificados.
Para Valle, a fórmula é simples. “Pare de usar palavras pomposas e comece a ser mais claro e mais sincero na sua mensagem”.
Glossário dos jargões usados nessa matéria:
Branding: estratégia de estabelecimento e fortalecimento de marca no mercado.
Budget: orçamento.
Business plan: plano de negócios, com objetivos para o empreendimento e formas de alcançá-los.
Capital intelectual: valor do conhecimento e habilidades de um profissional.
Colaborador: sinônimo de funcionário, empregado.
Deadline: prazo final para a entrega de um projeto.
Disruptivo: produto ou método que revoluciona o mercado ou o consumo.
Delivery: entrega, concreta ou abstrata, de um projeto, produto ou processo.
Expertise: competência ou qualidade de um especialista.
Feedback: retorno, avaliação de desempenho de um profissional.
Job: trabalho, tarefa a ser executada.
Liderança: papel ou posicionamento de chefia.
Network: rede de contatos profissionais.
Outsourcing: mão de obra terceirizada.
Performar: usada como equivalente de “ter bom desempenho”.
Proativo: profissional que toma atitudes e busca soluções por iniciativa própria.
Startar: começar, iniciar um projeto ou tarefa.
Schedular: agendar, marcar um compromisso.
Sinergia: trabalho envolvendo vários setores e diferentes pessoas dentro da empresa.
Target: público-alvo.
Time: equipe de trabalho.
Pode ser que você já estivesse sentindo isso no lugar onde você trabalha e nós estejamos apenas confirmando ð. Sorry!
Publicado por Vida Financeira e Emprego em Quinta-feira, 10 de agosto de 2017