Dezoito filmes, 21 prêmios, reconhecimento internacional. Quem passa os olhos pelo denso currículo da atriz Emma Watson talvez não imagine que a parisiense já se sentiu uma fraude. A estrela de Harry Potter chegou a dizer certa vez à revista Rookie que quanto melhor se sai, maior é seu sentimento de inadequação, como se em algum momento alguém fosse descobrir que ela não merece nada do que conquistou.
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Emma não é a única a se sentir assim. Estudado desde 1978, quando foi descoberto pelas psicólogas estadunidenses Pauline Clance e Suzanne Imes, a chamada síndrome do impostor também já atingiu as atrizes Kate Winslett e Renée Zellweger, a chefe de operações do Facebook Sheryl Sandberg e o escritor Neil Gaiman.
O Centro de Aconselhamento do Instituto Califórnia de Tecnologia definiu o problema como uma série de sentimentos de inadequação que persistem mesmo quando as evidências indicam o oposto. Quem sofre da síndrome não consegue enxergar sua importância no próprio sucesso e sempre o atribui a circunstâncias externas, como a sorte ou algum encanto repentino.
Segundo especialistas, embora em torno de 70% das pessoas do mundo experimentem esse tipo de sentimento em alguma fase da vida, o excesso desta impressão de fracasso pode comprometer carreiras promissoras.
Conforme explica a psicóloga do PUC Talentos, Daniella Forster, uma vez inseguro, o bom profissional pode desenvolver sérios transtornos de ansiedade, síndrome de burnout e, em alguns casos, até depressão. Além disso, como imagina que a qualquer momento pode ser desmascarado, tende a procrastinar decisões com medo de errar ou se tornar um workaholinc , com receio de não conseguir superar as expectativas dos outros. Em qualquer uma destas extremidades, o sujeito entra em um círculo vicioso que pode atravancar sua carreira.
Perfil
Daniella explica que a síndrome é muito comum entre pessoas esforçadas e perfeccionistas. Como a dedicação é algo espontâneo na rotina delas, não conseguem identificar o que fizeram de diferente para alcançarem o que têm. A falta de autoconhecimento impede que o indivíduo enxergue seu potencial e impossibilita que ele tenha a dimensão do quanto ainda pode fazer. Isso gera medo e insegurança.
O alto nível de comparação é outro ponto comum entre quem se sente um impostor. De acordo com a coach Elenice Brusque, pessoas com este perfil tendem a estabelecer padrões muito elevados para si mesmas, tomando como referência gente muito acima da média. Com tamanha exigência, embora sejam bons no que fazem, estas elas nunca se sentem boas o bastante.
O articulista de comportamento do The Guardian Oliver Burkeman aponta outra forma equivocada de comparação entre as vítimas da síndrome: muita gente compara o próprio interior ao exterior dos outros. Quando esse interior está repleto de insegurança, a pessoa, obviamente, se vê em desvantagem.
Homens e mulheres
Quase quatro décadas depois dos primeiros estudos sobre a síndrome do impostor, poucas conclusões foram obtidas. Segundo a escritora Valerie Young, que estuda o tema há um bom tempo, uma das coisas que realmente se sabe é que o índice de mulheres com o problema é maior do que entre os homens.
De acordo com a psicóloga, que é autora do livro “Os pensamentos secretos das mulheres de sucesso”, há duas principais razões para isto e o primeiro se diz respeito ao fato de mulheres buscarem mais ajuda. Não por acaso, em torno de 90% dos estudos sobre o assunto são escritos por elas.
O outro motivo se refere à cultura machista que ainda impera na sociedade. É em decorrência dela que as mulheres estão mais propensas a justificar seus fracassos em uma suposta falta de habilidades, enquanto os homens costumam atribuir seus problemas a fatores externos.
Autoestima
Está enganado quem pensa que a síndrome do impostor é mero problema de autoestima. De acordo com Valerie, quem tem baixa autoestima se sente mal em todas as esferas da vida. Quem tem a síndrome tende a sofrer apenas quando precisa executar tarefas mediante elevadas expectativas. “Você não se sente como um impostor quando passeia com o seu cachorro, por exemplo. E sim quando é contratado para um novo emprego ou precisa fazer uma apresentação”, escreve.
Autoconhecimento
Quebrar o círculo do impostor requer, em primeiro lugar, muito autoconhecimento, segundo Daniela. A pessoa precisa saber olhar para si mesma, reconhecer a síndrome, e deixar de entender o próprio sucesso dentro de um processo mágico.
Assim que percebe que o medo se transformou em uma pedra em seu caminho profissional, a pessoa precisa procurar ajuda o quanto antes para não paralisar, segundo Elenice. O apoio de um coach, mentor ou psicólogo pode ajudar muito nesse processo.Só assim, será possível transformar a insegurança em um desafio bom e com tudo para dar certo.