Diferentes sistemas biológicos do nosso cérebro determinam certos aspectos da nossa personalidade, diz cientista.| Foto: Bigstock/

Nosso corpo tem reações biológicas claras e imediatas quando nos apaixonamos: o coração batendo mais forte, a sensação de frio na barriga, as mãos suando frio e tudo aquilo que tem sido inspiração de poetas, músicos e escritores ao longo da história. Mas, além de tudo que conseguimos sentir e demonstrar conscientemente, nosso cérebro é constantemente bombardeado por reações químicas. Segundo a antropóloga e bióloga Helen Fisher, da Universidade Rutgers, nos Estados Unidos, o fluxo de determinados componentes químicos determina uma parcela do nosso comportamento em relação a outras pessoas – tanto no amor, quanto no trabalho.

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Um estudo desenvolvido pela Deloitte, que presta serviços de auditoria e consultoria para empresas, em parceria com Helen e com o biólogo molecular Lee Silver, mostra que tipos de pessoas são mais parecidas no ambiente de trabalho e quais precisam se esforçar um pouco mais para trabalhar bem em conjunto. Chamado de Business Chemistry, o método foi descrito em um artigo publicado no periódico Harvard Business Review e, segundo a publicação, já foi experimentado por mais de 190 mil pessoas.

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A pesquisa define quatro personalidades básicas, que se manifestam em maior ou menor grau em diferentes indivíduos: Pioneiros buscam possibilidades e despertam energia e imaginação em suas equipes. Acreditam em correr riscos e focam no todo; Condutores buscam desafio e impulsionam pessoas. O que mais vale é conseguir resultados e enxergam problemas em preto e branco; Já Guardiões buscam estabilidade e trazem ordem e rigor. São pragmáticos, se baseiam em fatos e dados e evitam riscos; Por último, Integradores buscam conexão e são os responsáveis por unir as equipes. Acham que a maior parte das coisas são relativas, são diplomáticos e focam no consenso.

Química cerebral define nossas atitudes

Para chegar a esses resultados, os participantes respondem a um questionário que elenca diferentes situações e possíveis reações a elas. As perguntas foram desenvolvidas pela antropóloga Helen Fisher, que buscava um método para unir pessoas romanticamente, mas acabou percebendo que elas também poderiam ser usadas para o entendimento de como funcionam relações familiares, de amizade e de negócios. Enquanto já existem muitos testes de personalidades conhecidos no mundo todo – como o Myers-Briggs e o Big Five – a pesquisadora afirma que o seu é diferente porque tem base na neuroquímica.

“Ele se baseia na química do cérebro. Eu analisei pesquisas neurológicas para desenvolver o questionário e, em seguida, com colegas, usamos ressonância magnética funcional para validá-lo”, disse, em entrevista ao editor da Harvard Business Review, Eben Harrell.

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Nossa personalidade é dividida em duas partes que estão constantemente interagindo: cultura (que vem da nossa criação e nos diz o que é adequado ou não) e o temperamento (que vem dos nossos genes, hormônios e neurotransmissores. Helen estuda o temperamento e, depois de dois anos pesquisando a literatura científica, concluiu que quatro sistemas biológicos estão ligados a conjuntos de traços de personalidade: dopamina/norepinefrina, serotonina, testosterona e estrogênio/oxitocina.

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Em parceria com um estatístico ela desenvolveu, então, um questionário para medir em que grau as pessoas expressam os traços ligados a cada um dos sistemas e o disponibilizou nos sites de relacionamento Match.com e Chemistry.com. A eficácia das perguntas foi comprovada com exames de ressonância magnética em grupos de casais jovens e mais velhos que tinham respondido o teste.

Os resultados foram coincidentes: aqueles que tinham pontuado alto em traços ligados ao sistema de dopamina tinham muita atividade deste composto químico no cérebro, por exemplo. O mesmo aconteceu com os outros perfis e sistemas. “Isso, em si, é diferente de qualquer outro questionário. Eu consegui validar que o meu está medindo o que eu digo que está medindo”, afirma.

Diferenças podem gerar conflitos, mas também trazer resultados

Construir equipes com personalidades diversas não é o suficiente. “Equipes que unem esses estilos deveriam, na teoria, aproveitar os vários benefícios da diversidade cognitiva, de maior criatividade e inovação até melhorias na tomada de decisão”, escrevem as autoras do artigo, Suzanne Vickberg, psicóloga e principal pesquisadora do sistema de Business Chemistry da Deloitte, e Kim Christfort, uma das desenvolvedoras originais do sistema. Porém, nem sempre as coisas acontecem assim e divergências entram no caminho do sucesso.

Em seu trabalho, elas pediram aos participantes para listar o que os motivava e alienava no ambiente de trabalho. Os resultados variaram muito, mostrando que o que é um incentivo para algumas pessoas, é o inferno de outras. “Algumas das diferenças tem a ver com como as pessoas interagem. Por exemplo, Integradores abominam qualquer coisa que pareça um conflito, mas Condutores amam debater. Isso pode criar tensão e desentendimentos”.

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O gerente de Curitiba da empresa de recrutamento Michael Page, Thiago Gaudêncio, conta, em geral, contratantes relutam em buscar pessoas com perfis muito diferentes. “Um contador, por exemplo, normalmente é mais introvertido, mais concentrado – dentro desse estudo, seria mais Guardião e Integrador. Normalmente o gestor vai pedir profissionais assim e, se a gente indica alguém que é mais expansivo, há uma resistência, pois ele acha que o candidato não vai se encaixar”.

Para ele, o que motiva esse tipo de postura é a vontade de evitar conflitos. “O gestor quer um time que funcione e não está necessariamente orientado a criar um time que se desenvolva e cresça”, aponta. Lidar com essas tensões dá trabalho e nem todo mundo tem tempo e disposição para resolvê-las.

Colocando os resultados em prática

Alguns gestores podem acabar perdendo a oportunidade de ouvir grandes ideias simplesmente por não compreenderem o quão profundas são as diferenças entre as pessoas ou como tratar tensões no ambiente de trabalho. Isso demonstra a importância desse tipo de avaliação de personalidade, que permite conhecer como as pessoas funcionam e administrar essas diferenças.

Enquanto todas as características ocorrem em maior ou menor grau em todas as pessoas, os maiores desafios podem vir do confronto entre estilos opostos. Segundo o artigo, 40% das pessoas acreditam que o mais difícil era trabalhar com seus opostos e 50% disseram que eles eram os menos agradáveis. Guardiões são normalmente mais reservados do que Condutores, por exemplo, mas ambos são muito focados. No entanto, Guardiões e Pioneiros são totalmente opostos, assim como Integradores e Condutores. Nestes casos, quando opostos trabalham juntos e conseguem conversar sobre as diferenças e administrá-las, nascem parcerias colaborativas.

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De acordo com as autoras, ter esse denominador comum para identificar os traços diversos faz com que os colegas passem a avaliar porque alguns momentos são tão desafiadores e também reconheçam o potencial força em suas diferenças. Em um dos cases relatados pelas pesquisadoras, uma equipe estava tendo problemas e foi possível identificar pontos que desagradavam cada um dos estilos de personalidade. Depois de discutir os pontos fortes da equipe, foi feito um brainstorm para buscar estratégias para acomodar os estilos diferentes dos indivíduos e aproveitar o valor de cada um deles.

Um mês depois, membros afirmaram que estavam compreendendo melhor o grupo. “Ainda mais importante, eles relataram um senso maior de propósito compartilhado, um ambiente que melhor possibilitava que contribuíssem em seus maiores níveis e uma habilidade melhorada de atingir objetivos”, contam.

Exemplo pessoal

A própria Helen Fisher tem um exemplo da sua vida pessoal. Ela trabalhava com um colega que, assim como ela, tem altos níveis de dopamina, porém, diferente dela, tem também altos níveis de serotonina, que está ligada a evitar riscos. Em determinada situação, ela acreditava que estava absolutamente certa e o colega estava apreensivo. “Se eu não soubesse nada sobre química do cérebro, teria pensado que ele estava apenas sendo muito teimoso”, lembra.

“Porém, ao invés disso, eu vi que aquilo era o que eu chamo de ‘lacuna de serotonina’. Sua hesitação nada tinha a ver comigo ou com o projeto. É só o jeito dele. Isso suavizou o que poderia ter sido um grande desentendimento e nos tornou uma equipe melhor. Agora eu quero a serotonina dele perto de mim porque eu vejo o valor disso”.

A cientista acredita que podemos ajustar o nosso comportamento para melhor ajustar-nos aos colegas. É possível adaptar a forma como apresentamos informações, modificar a linguagem corporal quando respondemos perguntas e até ajustar como você se porta. “Se você entende como dimensionar aqueles ao seu redor, você pode alcançar qualquer um – seus clientes, chefes, subordinados – muito mais efetivamente”, afirma Helen. “Nós evoluímos para pensar de forma diferente para que possamos juntar nossas cabeças e encontrar boas soluções”. Em relacionamentos pessoais e profissionais, ir além da química e investir em comunicação é a chave do sucesso.

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Dopamina, serotonina, testosterona... Como funciona a sua química cerebral?

A antropóloga e bióloga Helen Fisher, colaboradora científica na criação do método Business Chemistry, explica à Harvard Business Review quais sistemas cerebrais estão conectados a quais traços de personalidade:

“As pessoas que expressam certos genes no sistema de dopamina tendem a ser curiosas, criativas, espontâneas, energéticas e mentalmente flexíveis. Elas assumem riscos e buscam novidades.

Pessoas que têm alta atividade de serotonina (ou que tomam antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina) são mais sociáveis, mais ávidas para pertencer. São bastante tradicionais em seus valores e menos inclinadas à exploração”.

“As pessoas expressivas no sistema de testosterona são cabeças-duras, diretas, decisivas, céticas e assertivas. Elas tendem a ser boas no que chamamos de sistemas baseados em regras: engenharia, computadores, mecânica, matemática e música.

E pessoas que expressam o sistema de estrogênio/oxitocina tendem a ser intuitivas, imaginativas, dispostas a confiar, empáticas e a pensarem sobre o contexto e a longo prazo. Também são sensíveis aos sentimentos das pessoas e tipicamente têm boas habilidades verbais e sociais”.