O maior temor do mercado em relação à agitação política no Oriente Médio e no Norte da África começou a se concretizar ontem, quando as Forças Armadas da Líbia entraram em confronto com a população do próprio país. Egito e Tunísia provocavam ansiedade ? especialmente o primeiro, que controla o Canal de Suez, importante passagem de comércio ?, mas um prolongamento da crise na Líbia tem o potencial para, de fato, prejudicar a oferta da commodity no mundo.
Com o mercado americano fechado devido ao feriado do President?s Day (Dia do Presidente), o maior termômetro de ontem foi o barril de petróleo Brent, de referência na Europa e na Ásia, que atingiu a maior cotação desde o estouro da crise financeira mundial, em setembro de 2008. No momento mais elevado do dia, o barril chegou a US$ 108, mas fechou em US$ 105,74, com alta de 3,1%. A reabertura das bolsas americanas hoje deve ?precificar? com maior nitidez a instabilidade política no mundo árabe.
A Líbia é o oitavo maior produtor da Opep, o cartel dos países produtores de petróleo, e o 12.º maior exportador do produto no mundo. Embora tenha peso relativamente pequeno na oferta diária da commodity ? dos 88,5 bilhões de barris produzidos diariamente, ela é responsável por 1,6 milhões de barris, ou 1,8% ?, seu petróleo é de boa qualidade. O país também é o principal exportador individual para a Europa.
Preço estável
Enquanto em boa parte do mundo o preço do combustível varia de acordo com o mercado (a oferta e a demanda do petróleo), no Brasil o valor da gasolina e do diesel é controlado pela Petrobras. Para economistas, os efeitos no bolso do consumidor só poderão ser sentidos no médio e no longo prazo, dependendo da duração dos conflitos, se eles vão chegar a outros países e da reação do mercado ? se o preço dos derivados vai continuar a subir. Tradicionalmente, a política da Petrobras é de não tomar decisões em cima de ?oscilações de curto prazo?.
No caso de alta muito forte no barril ? especialistas citam a barreira dos US$ 120 ?, a estatal pode ser forçada a fazer um reajuste. ?Caso o conflito demore muito para se resolver e o preço do petróleo aqui fique muito defasado em relação ao exterior, a empresa pode elevar os preços por causa do impacto na balança de pagamentos?, diz Homero Guizzo, economista da consultoria LCA.
Além de ser uma medida impopular, o governo também não tem interesse em elevar o preço do diesel e da gasolina porque o Brasil vive um momento de inflação em alta ? o aumento do combustível só ajudaria a piorar esse cenário. ?O preço alto do petróleo é ruim para todo mundo. Prejudica o crescimento da economia, gera inflação e pressiona os preços das commodities. O petróleo é a principal commodity. Se ele sobe, as outras também?, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Quem pode se beneficiar da alta são os investidores com papéis da Petrobras. A tendência é que as ações da empresa, assim como das demais petroleiras, se valorizem em caso de recuo na oferta do óleo ? e consequente alta dos preços. ?Se Petrobras perde de um lado com o preço mais alto para importação, ela ganha de outro com a própria valorização do petróleo. Pode ficar mais atraente para investimentos?, afirma José Augusto Gaspar Ruas, especialista em petróleo pela Unicamp e professor da Facamp.
Otimismo
Um motivo de tranquilidade para o mercado é que tanto os velhos como os novos governos têm interesse em manter o fornecimento de petróleo estável. No caso de queda do regime do ditador Muamar Kadafi, é pouco provável que um novo governo vá sabotar a venda de óleo, principal fonte de receita do país, sem irritar a população. A indefinição, neste caso, é o maior problema.
Ontem, grandes petroleiras que atuam na Líbia indicaram que a produção de petróleo no país pode recuar drasticamente. A subsidiária da alemã Basf, a Wintershall, foi a única que confirmou a paralisação completa da produção enquanto a situação não se normalizar. A britânica BP suspendeu o processo de exploração que vinha realizando, enquanto a norueguesa Statoil e a anglo-holandesa Shell retiraram os funcionários estrangeiros e suas famílias do país.