As cabeleireiras Sirlene e Fátima (sentada) dizem que a alta dos preços dos serviços afetou o orçamento doméstico| Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo

6,15% é a inflação acumulada nos últimos 12 meses.A meta para o ano é de 4,5% com uma margem de tolerância de 2 pontos percentuais. O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, garantiu ontem que a inflação cairá nos próximos meses. Ele defendeu a política monetária e reforçou sinais de que a alta de juros está perto do fim. Há um ano o BC aumenta a taxa básica (Selic) para controlar os preços, mas o IPCA não parou de subir.

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10,3% foi o aumento da receita nominal bruta do setor de serviços em fevereiro na comparação com igual período de 2013, segundo o IBGE. É a maior taxa desde abril de 2013, quando subiu 11,6% ante igual mês de 2012. A maior demanda por transportes impulsionou o setor de serviços em fevereiro, que cresceu 14,7% graças ao escoamento da produção agrícola e à maior procura por passagens aéreas. Em janeiro, a expansão havia sido de 9,7%.

Solução ou problema

Somente a desaceleração do mercado de trabalho pode reduzir os preços

A inflação dos serviços é um fenômeno dos países emergentes, mas, no Brasil, ela se tornou estrutural, na avaliação do economista Fábio Tadeu Araújo, da PUCPR. A continuidade da alta dos preços dos serviços mesmo com a demanda mais amena indica que ela é hoje provocada muito mais por problemas de baixa eficiência e produtividade das empresas do que pela procura dos consumidores.

O que torna a convergência da inflação medida pelo IPCA, para o centro da meta, de 4,5%, uma tarefa árdua. "Se a inflação dos serviços está em 8%, 9%, significa que a média está em 5,8%, 6%", lembra Lucas Dezordi, da Universidade Positivo. Com isso, o governo tem menos margem para acomodar choques de preços, como o atual de alimentos.

Para Araújo, o governo está entre a cruz e a espada, porque apenas uma desaceleração forte do mercado de trabalho poderia gerar um efeito mais radical sobre a alta de preços, já que a elevação dos juros não têm correlação direta com o setor. "E por tabela prejudicam os investimentos das empresas, o que é ruim para economia como um todo", diz. "A pergunta central é até que ponto governo e população estão dispostos a sacrificar emprego para reduzir a inflação. E essa não é uma questão fácil de ser respondida", provoca.

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Se por um lado os alimentos pressionam a inflação atual, que pode estourar o teto do regime de metas, de 6,5%, ainda no primeiro semestre, por outro, serviços como planos de saúde, educação, consertos, transporte e de telecomunicações, por exemplo, vêm comprometendo a renda das famílias há muito mais tempo. Os preços dos serviços no país crescem sem trégua e acima da inflação geral há pelo menos dez anos. O brasileiro paga hoje, em média, mais que o dobro pelos serviços do que em 2004.

Acompanhe dados da inflação no setor

A inflação acumulada do setor nesse período chegou a 104% – bem acima da inflação oficial (o IPCA, Índice de Preços ao Consumidor Amplo) acumulada, com 74,56% na mesma base de comparação. Em todos esses anos os serviços ficaram acima do centro da meta – de 4,5% – e estouraram o teto de 6,5% em seis deles.

O aumento do emprego e da renda, combinado com a baixa produtividade das empresas, encareceu o setor de serviços. Para o coordenador do setor de Ciências Econômicas da Universidade Positivo, Lucas Dezordi, boa parte dessa alta se deve ao mercado de trabalho, que aumentou renda, gerando mais demanda e ao mesmo tempo pressionando custos dos serviços. Os aumentos dos salários não foram acompanhados do crescimento da produtividade das empresas, o que gera custos e eleva preços.

Difícil controle

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Para os economistas, o Brasil ainda vai ter de conviver com uma inflação alta de serviços nos próximos anos, já que a melhora da produtividade – conquistada com capacitação e educação da mão de obra – é um processo demorado.

Além disso, existe um carregamento da inflação de um ano para outro nesse segmento, já que ainda há uma indexação forte na economia brasileira. "Se um ano os preços dos serviços sobem bastante é provável que no outro ano se tenha mais um ano de inflação forte", diz Dezordi.

A inflação de serviços é mais difícil de ser controlada por dois motivos. Primeiro porque o setor não sofre concorrência externa – ou seja, não é possível importar serviços, como se faz com a indústria. Se há pressão inflacionária de produtos, por exemplo, governos e empresas podem aumentar importações desses produtos para equilibrar preços. O segundo é que os efeitos da alta de juros não são diretos sobre esse segmento, que depende pouco de crédito.

"O efeito da alta de juros é esfriar a economia e desacelerar o mercado de trabalho. Somente assim teremos um arrefecimento desse ciclo de alta de serviços. Mas esse efeito não é imediato", diz Dezordi.

A alta dos preços dos serviços, apesar de ocorrer há pelo menos uma década, se intensificou mais na chamada segunda fase do Plano Real, com a ascensão da nova classe média, embalada pelo aumento da renda a partir de 2010. "Primeiro essas famílias passaram a consumir mais produtos. Depois, passaram a usufruir de serviços a que não tinham acesso", explica Fábio Tadeu Araújo, professor de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Em 2011, a inflação dos serviços bateu recorde e se manteve próxima de 9% nos dois anos seguidos.

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Sem saída, consumidores cortam até gastos essenciais

Luisa Nucada, especial para a Gazeta do Povo

A alta nos preços dos serviços tem forçado cortes de gastos considerados necessários pela classe média. A cabeleireira Sirlene Nunes, 50 anos, conta que há um ano deixou de contratar plano de saúde para a família. "Os preços estão subindo tanto que a gente não tira do supérfluo, tira do essencial. A academia também é uma questão de saúde, mas tem dois anos que deixei de pagar", conta.

Viúva, Sirlene mora com os filhos de 21 e 23 anos. Ambos estudam em faculdades particulares e, apesar de trabalharem para ajudar nessa e em outras despesas, acabam tendo de renunciar a serviços importantes para seu aprimoramento profissional. "Curso de inglês já não dá para manter", lamenta.

Consertos

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Fátima Ferreira, 52 anos, trabalha no mesmo salão de beleza que Sirlene e também sente a escalada da inflação. "Estou me virando sem diarista há um ano. Minha casa é muito grande e leva dois dias para limpar, uma faxina hoje em dia sairia R$ 300", diz.

A cabeleireira conta que reparos de eletrodomésticos vêm se mostrando inviáveis. "O conserto do meu secador de cabelo profissional é R$ 38. Depois da quarta vez que ele estragou, vi que saía mais barato viajar para São Paulo e comprar outro."

Com sua TV de LCD aconteceu o mesmo. Uma peça do aparelho quebrou e a troca custaria R$ 400. "Ela está lá encostada. Não vale a pena mandar para o conserto e por enquanto não vou comprar outra."

Sem vaidade

A comerciante Norman Youssef tem uma loja de roupas no Centro de Curitiba e diz que a inflação nunca pesou em seu bolso como na passagem de 2013 para 2014. Neste ano, o valor da mensalidade da escola de sua neta de 7 anos quase atingiu os quatro dígitos.

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Norman vem sendo austera no uso de serviços menos essenciais, como o de manicure. "A gente não pode mais fazer com a profissional que prefere, nem no salão mais perto. Tem que pesquisar, andar algumas quadras a mais para achar o lugar mais barato", comenta.

Ela completou 59 anos recentemente e teve de reduzir o pacote de itens cobertos pelo plano de saúde. "Além do reajuste anual, acabei de atingir a idade em que a mensalidade do seguro quase dobra", diz.