Os cinco acidentes ocorridos em refinarias da Petrobras em menos de 40 dias acenderam o sinal vermelho sobre o uso exaustivo das unidades da companhia. Para especialistas e petroleiros, os recordes de processamento de petróleo vem sendo obtidos com o parque de refino trabalhando quase no limite de sua capacidade, sobrecarregando equipamentos e trabalhadores e elevando o risco de acidentes.
Em comunicado ao mercado na terça-feira, a Petrobras anunciou um aumento de 8% no volume processado de janeiro a novembro de 2013 em relação ao mesmo período de 2012, passando de 1,897 milhão para 2,034 milhões de barris por dia. No mesmo documento, informou que a produção do ano passado equivale a 92% da carga autorizada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), de 2,228 milhões de barris por dia.
Embora a estatal alegue que esse índice é comparável às refinarias norte-americanas de melhor performance, há quem avalie que o limite razoável para uma operação segura foi ultrapassado. Para Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o ideal seria algo entre 85% e 90%.
"É muita coincidência ocorrerem acidentes justamente no momento em que a companhia bate recordes de refino de petróleo e produção de gasolina e diesel", afirma Pires, que atribui à política de preços defasados da companhia a origem dos problemas. "Na tentativa de reduzir a importação de derivados e amenizar seu problema de caixa, a Petrobras optou por produzir mais, mesmo com a capacidade limitada. É um risco assumido e agora a companhia está pagando a conta", diz.
Em série
A série de acidentes começou no fim de novembro, quando um incêndio na Unidade de Destilação U-2100 paralisou por 22 dias a produção da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, na região de Curitiba. De lá para cá ocorreram acidentes em outras quatro refinarias.
Com capacidade nominal para refinar 220 mil barris de petróleo por dia, a Repar opera perto de sua capacidade máxima. De janeiro a novembro de 2013, processou em média 207 mil barris diários, o equivalente a 94% do máximo. Em junho, mês de maior produção em sua história, foram 212 mil barris por dia, ou 96% da capacidade.
Procurada pela Gazeta do Povo, a ANP não informou a carga autorizada para a Repar e as demais refinarias. Mas a agência já chegou a multar a refinaria paranaense e também a de Paulínia (SP) por produzirem acima do limite permitido.
Combinação explosiva
Especialistas e petroleiros atribuem os frequentes acidentes nas refinarias a uma combinação perigosa de três fatores: o Programa de Otimização de Custos Operacionais (Procop), que foi implementado há cerca de um ano e baixou custos da área de manutenção; a redução do efetivo de trabalhadores; e a pressão por produtividade.
"Um acidente é um evento construído, principalmente dentro de uma área industrial. Fatalidades podem acontecer, mas são fatos raros e não frequentes como vem ocorrendo", afirma Silvaney Bernardi, presidente do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina (Sindipetro PR/SC).
No comunicado de terça-feira, a Petrobras disse cumprir "rigorosamente a programação e todas as normas e procedimentos de manutenção das instalações de refino", e que "tem como prática permanente a análise das ocorrências com o objetivo de melhorar seus procedimentos operacionais".
Parque de refino não dá conta da demanda
A última refinaria inaugurada no país foi a Henrique Lage (Revap), em São José dos Campos (SP), em 1980. De lá para cá, a falta de investimentos na ampliação do parque de refino, somada à crescente demanda por combustíveis, complicaram o cenário do abastecimento, obrigando a Petrobras a buscar no mercado internacional os derivados para suprir o mercado doméstico.
De um lado, o crescimento econômico do país elevou a procura por diesel; do outro, a "explosão" da frota de automóveis inflou a demanda por gasolina. Além disso, o subsídio ao preço da gasolina estimulou ainda mais o seu consumo.
Em 2009, o derivado da cana-de-açúcar atendeu 39% da demanda dos carros e a gasolina, os 61% restantes. No ano passado, a "fatia" do etanol foi de apenas 21% e a da gasolina, de 79%. Nem as ampliações de algumas refinarias como a que elevou em 10% a capacidade da Repar entre 2007 e 2011 foram suficientes para dar conta de toda a demanda doméstica.
Colaborou Fernando Jasper