Um projeto de lei entregue à Câmara Municipal de Curitiba neste mês reacendeu a discussão sobre o costume brasileiro de desprezar o troco de poucos centavos. A proposta do vereador José Carlos Chicarelli (PSDC) se baseia em outras leis municipais para forçar comerciantes a dar troco correto ou arredondar o preço para baixo. Economistas e especialistas em Direito do Consumidor avaliam que medidas assim ajudam a melhorar a percepção de que o cliente sempre sai perdendo afinal, é o fornecedor que escolhe cobrar preços quebrados. Mas também estão divididos quanto à vantagem que a regra traria na prática.
Um motivo é que há escassez de moedas, seja porque a produção caiu ou porque o brasileiro não as faz circular. As de R$ 0,01, por exemplo, deixaram de ser cunhadas em 2010 porque valem menos do que custam (R$ 0,16). O Banco Central considera o número de moedas "satisfatório" , com base em pesquisas de opinião. Aí está um segundo problema: faltam estudos sobre o impacto da falta de moedas para o troco retido e o montante de dinheiro que ele representa.
"Para ver o quanto isso prejudica o consumidor, teria que ver se os valores se anulam ou seja, se o troco que fica no caixa equivale ao que é eventualmente entregue a mais; se a empresa o embolsa, o que configuraria caixa dois; ou se fica com os funcionários", diz o professor de Economia do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais, Reginaldo Nogueira.
Consequências
Com algum parâmetro, seria possível medir se as perdas para os clientes seriam ainda maiores se o mercado evitasse preços fracionados. O mais provável é de que as compras encarecessem. O BC não cogita regulamentar o assunto, por considerar preços quebrados "uma prática saudável". Para o órgão, vale a orientação dos órgãos de Defesa do Consumidor, que atribuem a responsabilidade pelo troco ao comerciante na falta de moeda, o arredondamento deve ser para menos (veja infográfico ao lado).
Nesse sentido, o projeto de lei municipal reafirma princípios que estão no Código de Defesa do Consumidor e em um projeto de lei federal (n.º 3.836/2008) que tramita na Câmara dos Deputados desde 2008. O próprio vereador Chicareli reconhece que o efeito seria mais educativo do que de preencher uma lacuna. O texto prevê avisos nas lojas sobre a obrigatoriedade da devolução integral do troco. O advogado Vitor Guglinski, especialista em Direito do Consumidor, vai além ao defender que evitar preços fracionados seria uma opção mais transparente. "As empresas vendem uma vantagem que não se confirma, porque não há garantia de troco."
Resposta
A Gazeta do Povo consultou sete empresas que têm reclamações de consumidores no site Reclame Aqui por reterem troco em centavos. Nos três dias de prazo dados pela reportagem, cinco não responderam as perguntas sobre a política de preços fracionados e sobre qual a orientação para funcionários. São elas: Nissei, Extra, Pão de Açúcar e Lojas Americanas. A rede Mc Donalds diz que mantém "estrutura de abastecimento" de moedas, mas não deu detalhes sobre o porquê de preços fracionados. A Droga Raia afirma que funcionários são orientados a dar troco exato. Já o Carrefour garante que dá vantagem ao cliente caso faltem moedas. O Extra e o Pão de Açúcar responderam nesta quarta-feira (30/7), um dia depois do fechamento da edição impressa, que seguem o Código de Defesa do Consumidor e justificaram o fracionamento de preços citando despesas operacionais, como logística e armazenamento.
Interatividade
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