Oficialmente, o programa Paraná Competitivo garantiu R$ 35 bilhões em investimentos da iniciativa privada nos últimos quatro anos, segundo o governo do estado. Mas análise feita pela Gazeta do Povo com base em uma lista publicada no Diário Oficial do dia 27 de janeiro, pela Agência Paraná de Desenvolvimento, revela que a cifra é inflada por projetos suspensos ou de execução incerta e por empresas de origem duvidosa.
Programa contempla até empresas investigadas
- Talita Boros Voitch
Entre os protocolos de intenção assinados pelo governador Beto Richa juntamente com as empresas que buscam incentivos do Paraná Competitivo estão duas companhias envolvidas em denúncias ou fraude.
A Avio, indústria suíça de aviões e helicópteros, que deveria se instalar em Maringá, com investimentos de R$ 174 milhões, teve seu proprietário, Luigino Fiocco, condenado a seis anos de prisão por falência fraudulenta na província de Villacidro, na Itália.
Na ocasião, a empresa divulgou nota alegando que os problemas eram antigos e já estavam resolvidos. O então secretário de Indústria e Comércio, Ricardo Barros, afirmou que não havia risco de golpe.
A planta industrial da Avio, com capacidade de fabricação de até 600 helicópteros e 200 aeronaves por ano, deveria começar a produzir este ano, mas ainda não saiu do papel. A prefeitura de Maringá (Noroeste do estado) chegou a desapropriar um terreno para a construção de um parque industrial aeronáutico na cidade, mas o processo ainda encontra-se em trâmites burocráticos.
Outra empresa envolvida em denúncias, o grupo Petrópolis, dono da marca de cervejas Itaipava, assinou o protocolo em abril do ano passado, mas até agora não definiu os municípios que deve instalar um maltaria e uma fábrica de cerveja, com investimento de R$ 2,2 bilhões.
A Petrópolis é investigada pelo Ministério Público Federal do Ceará por supostamente ter feito doações à campanha da presidente Dilma Rousseff, nas eleições do ano passado, dois dias depois de ter sido beneficiada por empréstimos de risco do Banco do Nordeste, para a construção de fábricas na Bahia e em Pernambuco.
A empresa informou que suas equipes técnicas trabalham na busca pelas melhores opções de áreas onde serão instaladas as novas unidades no Paraná e que está dentro do prazo previsto no protocolo de intenções.
Na relação figuram 27 empreendimentos classificados como “efetivamente confirmados” pelo programa, somando R$ 2,54 bilhões em investimentos. No entanto, pelo menos quatro deles, com aportes acima de R$ 100 milhões cada, estão paralisados, não foram confirmados pelas empresas ou têm viabilidade difícil de aferir.
É o caso da Atto, montadora de veículos elétricos com sede em Cascavel, na Região Oeste, que assinou em julho do ano passado um protocolo de intenções para investir R$ 380 milhões no estado via Paraná Competitivo.
A companhia, que não tem site oficial ou nenhuma outra informação disponível na internet, só foi localizada por meio do registro de pessoa jurídica da Receita Federal. A reportagem entrou em contato com o responsável, Odilon Sinhorin, através do telefone registrado no órgão, mas o número não é da sede da Atto e sim de um curso de português e oratória, onde ele é diretor.
Sinhorin afirmou que a empresa está desenvolvendo um carro elétrico nacional, que deverá ser apresentado ainda no segundo semestre. Segundo ele, o protótipo já foi construído e está sendo testado, mas é totalmente sigiloso. A reportagem não foi autorizada a fazer fotos do veículo.
Apesar de afirmar que 20 engenheiros mecânicos e 30 elétricos trabalham no projeto, não há sinal de produção na planta da Atto. O barracão, que fica num distrito industrial de Cascavel, foi visitado pela reportagem, mas encontrava-se fechado em horário comercial e não havia ninguém que pudesse responder pela empresa.
R$ 35 bilhões
é o valor dos investimentos de iniciativa privada incluídos no Paraná Competitivo nos últimos quatro anos, segundo os números oficiais do governo do estado. Os recursos têm origem em 230 empresas.
O proprietário afirmou ainda que o projeto tem parceiros nacionais e internacionais, mas não cita nomes. “Não posso divulgar nada, é segredo de estado”, afirmou. Segundo ele, a Atto receberá investimento total de R$ 1 bilhão. Apenas para efeitos de comparação, a Audi deverá investir R$ 504 milhões, através do Paraná Competitivo, para retomar a produção de veículos no estado.
Mudança de planos
Outros dois projetos que aparecem na lista de “confirmados” pelo governo – o da Mili, empresa de papéis, com valor de R$ 150 milhões, e da Tirol, companhia de laticínios, no valor de R$ 215 milhões – estão paralisados e sem prazo para serem restabelecidos.
A Mili informou que o investimento foi protelado e não há previsão para ser retomado. Já a Tirol afirmou que está evitando falar sobre o novo empreendimento, pois ainda há tramites burocráticos para sua realização. “Infelizmente ainda estamos a passos pequenos neste investimento e até o momento não temos nada definido quanto ao status do projeto, ou cronograma de obras”, informou a empresa, via assessoria.
Já a instalação da Bionovis, indústria farmacêutica de biofármacos, com aporte de R$ 500 milhões, apesar de também estar na lista de investimentos garantidos para o estado, não foi confirmada pela empresa. Um anúncio em julho do ano passado mostrou que a Bionovis se instalaria no Rio de Janeiro.
Gazeta do Povo não teve acesso à lista completa do programa
O Paraná Competitivo contempla cerca de 230 empresas que são responsáveis pelos R$ 35 bilhões em investimentos no estado, de acordo com a coordenadora do programa, Kelli Reis. A Gazeta do Povo solicitou a listagem completa de projetos à Secretaria de Estado da Fazenda por diversas vezes, mas não obteve retorno. Por este motivo, a reportagem baseou sua análise em uma publicação do Diário Oficial, que representa apenas 12% do total de empreendimentos confirmados no programa.
Procurado pelo jornal para explicar os critérios usados para anunciar os investimentos e tratar dos projetos suspensos ou questionáveis citados na matéria, o governo do estado afirmou, por meio da Secretaria da Fazenda, que a lista publicada no Diário Oficial reúne projetos que ainda não foram efetivados.
“O trâmite não foi assinado e os investimentos não estão confirmados”, disse Kelli, apesar de o texto de apresentação da relação no Diário afirmar categoricamente que “os investimentos listados foram confirmados no estado do Paraná por meio da solicitação dos benefícios do Programa Paraná Competitivo”.
Reeleição
Os investimentos atraídos pelo Paraná Competitivo foram uma das principais bandeiras de Richa durante a campanha de reeleição, no ano passado. Criado na extinta Secretaria de Indústria, Comércio e Assuntos do Mercosul, hoje o programa está sob a responsabilidade da Fazenda e objetiva atrair empresas com a concessão de benefícios fiscais.
O principal deles é o parcelamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incremental, ou seja, o novo imposto que a empresa gera a partir da ampliação ou instalação no estado. O Paraná Competitivo prevê parcelas em até oito anos. Também existe a possibilidade de a empresa descontar o ICMS cobrado na conta de energia elétrica ou de gás natural. (TBV)
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