Promessa feita no início do governo pela equipe da presidente Dilma Rousseff: o governo iria concentrar esforços para permitir uma redução nos juros, de modo que a taxa real do Brasil caísse para menos de 3%. Os juros reais estão, de fato, baixando, mas a causa objetiva da redução não tem tanto a ver com a cruzada desenvolvimentista da administração pública. Ela é, na verdade, resultado de um aumento forte na inflação. Na média de outubro, a taxa real caiu para 4,5% o menor nível desde o início do Plano Real, em 1994.
Juros reais são calculados a partir da taxa de juros, menos a inflação do período. A conta acima leva em conta os juros prefixados cobrados nas operações de 360 dias entre bancos e empresas (os menores do mercado) e a expectativa de inflação para o período. As taxas para as pessoas e a maioria das empresas são muito maiores, mas tendem a acompanhar os movimentos deste piso dos juros de mercado. Essa taxa prefixada de 360 dias tem uma estreita correlação com a Selic, mostrando implicitamente qual é a expectativa do mercado sobre a trajetória da taxa básica nesse período.
A queda de juros reais tende a ser positiva para o país porque estimula empresas e empreendedores a investir seus recursos em produção, em vez de deixar apenas o dinheiro render em uma aplicação financeira. Para quem tem dinheiro para investir, é um sinal para ampliar a alocação em ações. "A renda fixa, que é o grande concorrente da bolsa, perde a atratividade nesse cenário", observa a economista Nastassia Romanó Leite de Castro, da Omar Camargo Investimentos.
Nos últimos anos, os ganhos da renda fixa brasileira geraram distorções no mercado. Investidores internacionais, que dispunham de taxas de juros muito baixas em casa, chegavam a tomar dinheiro emprestado para aplicar em títulos públicos brasileiros. "Como os juros lá eram próximos de zero e a remuneração aqui estava na faixa dos 12% ao ano, eles obtinham ganhos bastante altos com essa diferença", diz Nastassia.
No mercado, porém, há uma corrente bastante preocupada com a recente aceleração da queda do juro real. "Eu acho que essa redução tem sido forçada, e é por isso que hoje temos uma combinação pior de inflação e crescimento", diz o economista Fernando Rocha, sócio da gestora de recursos JGP, que prevê crescimento de apenas 2,5% em 2012, com inflação de 5,6%. O juro real brasileiro se manteve acima de 10% do início do Plano Real até o fim de 2003. Nesse período, várias vezes a taxa real atingiu níveis estratosféricos, acima de 20% ou mesmo de 30%. A partir de 2004, o juro real oscilou bastante, mas com uma tendência geral de queda. A crise global de 2008 e 2009, porém, provocou uma redução mais forte do juro real, com a queda rápida da Selic, e em julho de 2009 chegou-se a um mínimo de 4,8%.
A taxa real voltou a subir com o reaquecimento da economia, até um máximo de 7,1% em maio de 2011. No entanto, com a surpreendente decisão de cortar a Selic na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no final de agosto, o BC desencadeou uma nova rodada de queda da taxa real de juros. De uma média de 6,1% em agosto, ela despencou para 4,7% em setembro e 4,5% em outubro.
"A tendência é que continue a cair", afirma Nastassia, da Omar Camargo. "A consolidação da estabilidade econômica brasileira conduz nesse sentido." A ironia, no entanto, é que a redução dos juros reais que se verifica agora ocorre pelo aumento da inflação.