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Ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad foi anunciado nesta sexta-feira (9) por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como o escolhido para comandar o Ministério da Fazenda a partir de 2023, confirmando as especulações em torno de sua indicação nos últimos dias.
"Tomei a decisão de escolher o companheiro Fernando Haddad como ministro da Fazenda. Ele tem a incumbência de ter uns dias para montar sua equipe e já começar a apresentar resultado antes da gente tomar posse", disse Lula.
O presidente eleito foi questionado por jornalistas sobre qual será o perfil do ministro do Planejamento, que ainda será indicado. "O perfil do Ministério do Planejamento será o perfil de um cara que esteja apto a cuidar do Ministério do Planejamento, do Orçamento, e bastante afinado com o Ministério da Fazenda. É preciso que trabalhem juntos, que pensem juntos, para que não haja muita divergência ente os dois ministérios", afirmou.
Lula disse não acreditar que a PEC fura-teto – chamada de PEC da Transição pelo gabinete do governo eleito – vá enfrentar dificuldades na Câmara dos Deputados, que na próxima semana deve analisar o texto aprovado pelos senadores. O presidente eleito afirmou que fará "quantas conversas forem necessárias" para garantir uma maioria ampla, como a obtida no Senado.
"Espero que as pessoas compreendam que essa PEC não é para o governo Lula, é para fazer o reparo no orçamento do presidente [Jair] Bolsonaro, e para garantir o mínimo necessário para as pessoas mais necessitadas, para a saúde, para o Minha Casa Minha Vida, para o Farmácia Popular e para a gente começar a cuidar do povo brasileiro", disse Lula.
Haddad se reuniu na quinta-feira (8) com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Na saída, ele disse que durante o encontro foram debatidos "assuntos importantes", e que ficou definida entre os dois uma agenda de trabalho a partir da próxima semana.
No fim de novembro, em um evento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), na condição de porta-voz de Lula, Haddad disse que a reforma tributária será “prioridade total” do novo governo, mencionando a proposta de emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que tramita na Câmara dos Deputados.
Além disso, questionou a qualidade dos gastos públicos nos últimos anos e disse haver uma “desorganização” nos programas federais. Embora tenha dito ser mais prudente tratar de uma possível nova âncora fiscal apenas a partir de 2023, ele criticou a atual regra que limita o crescimento de despesas. “O teto de gastos, embora reputado como o que garantiu que a inflação não voltasse, não conseguiu inibir a piora do gasto público”, disse.
Trajetória acadêmica de Haddad revela admiração por ideias de Marx
Haddad ganhou projeção nacional quando esteve à frente do Ministério da Educação (MEC), entre 2005 a 2012. Ele é bacharel em Direito, mestre em Economia e doutor em Filosofia. Muito antes de entrar na vida pública, foi analista de investimentos do Unibanco em 1986 e, em 1988, consultor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), onde idealizou a Tabela Fipe, utilizada como referência para cálculo de preços de automóveis usados no mercado de seguros e para tributação do IPVA.
De 2001 a 2003, foi subsecretário de Finanças e Desenvolvimento da prefeitura de São Paulo, na gestão de Marta Suplicy (Solidariedade, à época no PT). Deixou o cargo após ser convidado pelo então ministro do Planejamento, Guido Mantega, a integrar a equipe técnica da pasta, como assessor especial, para ajudar a estruturar a Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs).
Apesar das passagens por cargos ligados à economia, parte da aversão do mercado financeiro a seu nome como ministro está relacionada a suas defesas teóricas. Atual professor licenciado do Departamento de Ciência Política da USP e do Insper, Haddad revela em sua trajetória acadêmica ser admirador das teses de Karl Marx.
Sua dissertação de mestrado, defendida em 1990 pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, aborda a estrutura socioeconômica do sistema soviético, segundo ele, sob uma “interpretação alternativa”. O doutorado em filosofia foi obtido na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP com a tese “De Marx a Habermas – O materialismo histórico e seu paradigma adequado”, em 1996.
Em 2019, como colunista do jornal "Folha de S.Paulo", citou Marx para defender uma reforma bancária em meio a dados sobre o descompasso do spread praticado pelas instituições financeiras no Brasil em relação a países como Estados Unidos e Uruguai.
“Marx defendia a criação de um banco nacional que democratizasse radicalmente o acesso ao crédito, permitindo aos trabalhadores adquirir cooperativamente os meios de produção, livrando-os da dominação”, diz trecho do texto. “Via no sistema de crédito, e não na propriedade estatal, um caminho de transição para o socialismo.”
Filiado ao PT desde 1983, ainda durante a graduação na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco da Universidade de São Paulo (USP), Haddad foi tesoureiro no Centro Acadêmico XI de Agosto, e, no ano seguinte, tornou-se presidente do órgão estudantil.
Em 2007, em um perfil do jornal "O Globo", foi definido por fontes internas do PT como “de esquerda demais nas ideias, e tucano demais nas ações”.
As passagens de Haddad pelo Ministério da Educação e a prefeitura de São Paulo
Após a passagem como assessor do Ministério do Planejamento, em 2004, tornou-se secretário-executivo do MEC, e no ano seguinte foi nomeado ministro, sucedendo Tarso Genro.
Sob sua gestão, foram criados o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid), o Sistema de Seleção Unificada (SiSU) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), implantados o Programa Universidade para Todos (ProUni), a Universidade Aberta do Brasil e os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e ampliados o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Problemas com a realização do exame, porém, deixaram manchas em sua passagem pelo MEC. Em 2009, houve vazamento da prova, que acabou adiada para a elaboração de um novo teste. Em 2010, uma pequena quantidade de provas (cerca de 3,5 mil de 4,6 milhões) teve problemas de impressão, o que exigiu uma nova aplicação para os estudantes prejudicados, gerando novo desgaste. Em 2011, foram canceladas 14 questões da prova para 600 alunos de um colégio de Fortaleza que tiveram acesso antecipado aos enunciados.
Deixou o cargo para se candidatar à prefeitura de São Paulo, sob a bênção de Lula, que à época gozava de altos índices de popularidade – dois anos antes, havia feito Dilma Rousseff (PT) sua sucessora no Planalto. Em sua primeira disputa eleitoral, Haddad venceu a eleição contra José Serra (PSDB) no segundo turno, com 55,57% dos votos válidos.
Em sua administração, criou a Controladoria Geral do Município (CGM), que revelou o escândalo da “máfia do ISS”, no qual fiscais davam descontos em certificados de obras em troca de propina. Também renegociou a dívida da prefeitura com a União, com um abatimento de cerca de 40%, caindo de R$ 76 bilhões para menos de R$ 30 bilhões. Com isso, o município chegou a conquistar grau de investimento da agência Fitch Ratings em 2015.
No entanto, a crise econômica e o crescimento do antipetismo devido aos escândalos de corrupção revelados pela Lava-Jato, além da priorização a modais alternativos de transporte levaram a uma crise de imagem do então prefeito. Ao fim de seu mandato, 48% dos paulistanos consideravam a gestão ruim ou péssima, segundo pesquisa do Datafolha. Ao tentar a reeleição, Haddad obteve apenas 16,7% dos votos válidos e acabou derrotado ainda no primeiro turno para João Doria (hoje sem partido, à época no PSDB), então estreante na política, que obteve 53,29%.
Derrotas nas disputas à presidência da República e ao governo de São Paulo
Em 2020, Haddad foi escolhido pelo PT para substituir Lula na corrida presidencial depois que o ex-presidente foi condenado e preso, sendo impedido de concorrer com base na Lei da Ficha Limpa. Com a insistência do partido em manter Lula como candidato até o último momento em que se tentava reverter a decisão da Justiça Eleitoral, o nome de Haddad foi anunciado apenas em setembro, um mês depois do início da campanha.
Esse movimento, somado ao desgaste provocado pela prisão do ex-presidente, fez com que Haddad fosse chamado por opositores de “poste” ou “sombra” de Lula. Apesar de chegar ao segundo turno das eleições de 2018, acabou derrotado para Jair Bolsonaro (PL, à época no PSL), por 55,13% a 44,87% dos votos válidos.
Sua mais recente disputa eleitoral foi nas eleições de outubro de 2022, quando perdeu a corrida ao governo de São Paulo para Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos). O ex-ministro da Infraestrutura de Bolsonaro obteve o apoio de 55,27% do eleitorado, contra 44,73% de Haddad.