Em meio à queda vertiginosa dos mercados mundiais após o rebaixamento da nota de risco dos Estados Unidos, uma pergunta vem intrigando muitos investidores no Brasil: por que a BM&F Bovespa, como vem ocorrendo desde o início do ano, está sofrendo muito mais do que as outras bolsas de países emergentes?
A resposta está menos nos problemas dos outros e mais nas questões domésticas. A preocupação com a crise das dívidas soberanas na zona do euro e com o risco de recessão nos EUA afeta, de fato, as ações brasileiras, assim como as de outros países emergentes. Mas a bolsa brasileira sofre mais por uma questão técnica ela é mais volátil que as demais bolsas emergentes e também por motivos relacionados à conjuntura econômica brasileira: a preocupação com o real sobrevalorizado, a inflação e os juros elevados.
"Em momentos de extrema aversão ao risco, bolsas mais voláteis, como a do Brasil, tendem a ser mais atingidas do que todas as outras. Aliás, a Bovespa é uma das bolsas mais voláteis do mundo", explica Jennifer Delaney, estrategista de ações para mercados emergentes do banco UBS em Nova York. "O Brasil é um mercado exposto aos preços de commodities e, assim, a Bovespa fica mais sensível ao cenário externo."
Segundo Delaney, o "índice beta" (uma medida de volatilidade de um ativo) da Bovespa é de 1,2 em relação à média das outras bolsas emergentes. Ou seja, a Bovespa cai muito mais quando as outras bolsas de países emergentes baixam, mas também sobe mais quando o movimento é de alta nos outros mercados.
Matérias-primas
Para Greg Lesko, diretor-gerente da Deltec Asset Management em Nova York, que tem US$ 850 milhões em ativos, dos quais quase US$ 200 milhões investidos na Bovespa, outra fonte de pressão mais forte sobre a bolsa doméstica é a preocupação com o crescimento da economia se houver um freio na demanda mundial pelas exportações de matérias-primas brasileiras.
Segundo Lesko, como os investidores internacionais compraram nos últimos anos ações de empresas brasileiras em razão do crescimento econômico, eles agora estão preocupados com a recessão mundial e o seu impacto na atividade econômica do país. "Os juros tão altos no Brasil também acabam fazendo com que a bolsa tenha um concorrente na disputa pelo dinheiro estrangeiro, que são os títulos de renda fixa", diz Lesko.
Outro fator doméstico desestimula os investidores estrangeiros em período de tensão: a cobrança de 2% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nos investimentos em ações. "Num momento como esse, pagar esse imposto desestimula."
A taxa de câmbio valorizada é outro fator que vem afetando o desempenho das ações neste ano, segundo Jennifer Delaney, do UBS. "Uma moeda que muitos investidores percebem como sobrevalorizada afeta as exportações e o sentimento sobre o mercado doméstico, uma vez que muitos investidores não querem ficar com aplicações expostas a uma moeda que pode vir a se desvalorizar", diz.Selic deve permanecer estável
O ex-secretário de Política Econômica José Roberto Mendonça de Barros afirmou que, em função do agravamento da crise econômica internacional, está afastada a hipótese de o Banco Central subir a taxa básica de juros na reunião de 31 de agosto. No entanto, o Copom deve continuar a ser cauteloso e esperar a divulgação de dados econômicos nas próximas semanas para tomar sua decisão de política monetária. "Hoje, pessoalmente, avalio que o BC não deveria baixar juros no fim deste mês", comentou.
Na avaliação de Mendonça de Barros, alguns fatos indicam que o BC não deveria partir para uma mudança na trajetória da política monetária no curto prazo, sendo que ele defende que os juros fiquem estáveis em 12,50% ao ano até dezembro. "A crise é grave, mas não deve ocorrer deflação mundial", disse.
Segundo ele, Estados Unidos e Europa enfrentam problemas difíceis, mas não estão tão interconectados, especialmente em relação à exposição de bancos norte-americanos a títulos europeus. Para Mendonça de Barros, os EUA devem registrar crescimento muito baixo, mas não devem mergulhar numa recessão aguda. Por outro lado, ele pondera que na Europa as medidas adotadas por autoridades são dependentes do avanço da crise, pois há algumas semanas a disposição de atacar dificuldades de economias na região era bem inferior à registrada nos últimos dias.
Focus
O mercado financeiro também passou a estimar que a Selic terminará o ano em 12,50%, segundo o boletim Focus, divulgado ontem pelo Banco Central. Até então, os analistas acreditavam que a taxa básica de juros no fim de 2011 seria de 12,75%. A previsão para o fim de 2012 foi mantida, também em 12,50%.
De acordo com a pesquisa, também caíram as expectativas para a inflação oficial neste ano (de 6,31% para 6,28%, ainda distante do centro da meta de inflação, que é de 4,5%) e para o crescimento do Produto Interno Buto de 2011 (de 3,96% para 3,94%). A previsão para o dólar, no fim do ano, foi mantida em R$ 1,60.