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O real acumula uma desvalorização de 8% no ano frente ao dólar, uma das mais elevadas entre os países emergentes. Nesta quinta (6), a moeda norte-americana fechou cotada a R$ 5,25. Mas no dia anterior chegou a ser cotada a R$ 5,30, o maior nível desde janeiro de 2023. Pesaram o aumento das incertezas globais e a piora recente na percepção de risco da economia brasileira.
“O real brasileiro ainda está sujeito a movimentos de volatilidade enquanto se mantiver a incerteza fiscal local em um contexto em que o Fed (o BC norte-americano) não está próximo de começar um ciclo de afrouxamento monetário”, dizem os economistas Maurício Une e Renan Alves, do Rabobank.
A isso se somam as preocupações com a condução da política monetária e desancoragem das expectativas de inflação. Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, aponta que os desafios da política monetária aumentaram desde a última reunião do Copom, em 7 e 8 de maio.
As expectativas de inflação subiram devido a uma série de fatores: o cenário global adverso, incertezas fiscais domésticas, mercado de trabalho aquecido e questões relacionadas à credibilidade do Banco Central.
Há quatro semanas, o boletim Focus sinalizava para uma inflação de 3,72% neste ano. Agora, as projeções indicam para uma alta de 3,88% no IPCA. O cenário para a alta nos preços em 2025 passou, nesse período, de 3,64% para 3,75%. As de 2026, de 3,5% para 3,6%. A meta de inflação fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3%, com um intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.
Dólar está pressionado por aumento dos riscos da economia brasileira
Sílvio Campos Neto, economista sênior e sócio da Tendências Consultoria, aponta que são vários os fatores que estão contribuindo para um aumento na percepção de risco na economia brasileira:
- A fragilidade da situação fiscal,
- Os frequentes ruídos do governo em seu relacionamento com o Congresso, e
- As tentativas de interferência na atividade econômica.
Outro fator que chamou a atenção dos analistas de mercado, economistas e investidores foi a divisão de votos na última reunião do Copom, quando os cinco diretores indicados por Jair Bolsonaro optaram por um corte menor (0,25 ponto percentual) na taxa Selic, diante do cenário econômico mais adverso. Os quatro indicados por Lula votaram a favor de uma redução de meio ponto percentual, o que levaria a Selic a 10,25% a.a.
“Há o temor de uma política monetária mais leniente com a inflação quando o atual presidente sair”, diz o sócio da consultoria. O mandato de Roberto Campos Neto no Banco Central termina no final do ano. Até agora, o mais cotado para assumir o posto é Gabriel Galípolo, diretor de política monetária.
Para economistas, alta é pontual e movimento deve se reverter
Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo acreditam que essa forte alta seja pontual e não haja impactos maiores sobre a inflação. Apesar da variação nas últimas semanas, as projeções da taxa de câmbio para o final de 2024 e de 2025 estão em R$ 5,05, segundo o boletim Focus do Banco Central.
Altas eventuais - como em itens importados e insumos de produção - seriam compensadas com a volta da moeda norte-americana a níveis considerados normais. Segundo Victor Beyruti, analista de macroeconomia da Guide Investimentos, o real está subvalorizado frente ao dólar. “O valor justo seria em torno de R$ 5,08”, disse.
Apesar de reconhecer que a economia brasileira tem problemas, o economista da Tendências aponta que os fundamentos da economia não indicam para um real tão desvalorizado frente ao dólar.
Segundo Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, o cenário global não trouxe grandes mudanças nas últimas semanas, dada a perspectiva de início da queda de juros nos EUA apenas no final do ano e as tensões geopolíticas persistentes.
Os especialistas apontam que uma reversão dessa maré altista pode vir de uma ajuda externa. Dois países que competem por recursos com o Brasil, o México e a Índia, tiveram eleições no último final de semana. A líder esquerdista Claudia Sheinbaum ganhou no país latino. Já o líder nacionalista hindu Narendra Mori, pró-mercado, conquistou o terceiro mandato, mas com uma liderança não tão folgada.
“Esses resultados podem ajudar a melhorar a posição do Brasil no cenário externo”, diz o analista da Guide.
Mas os resultados não se devem aos méritos da atual política econômica. Margato destaca que, no campo doméstico, preocupações com a condução da política monetária e a desancoragem das expectativas da inflação.
“Vemos espaço para apreciação moderada até o final de 2024. A taxa de câmbio tende a continuar pressionada nos próximos meses”, diz Margato. As projeções da corretora apontam o real a níveis próximos a R$ 5,00, tendo em vista o nível mais elevado da taxa Selic no final do ciclo de redução de juro e o início da flexibilização da política monetária nos Estados Unidos.