Esqueça o tradicional formato de gota: coxinha famosa, em Curitiba, hoje está mais para o estilo bola de tênis. Nas lanchonetes do centro da cidade, a massa do salgado deu espaço a uma bela quantidade de frango com "catupiry" e ele ficou mais gordinho e menos bicudo. Fugiu da inspiração original, mas caiu no gosto da clientela e virou moda na cidade. "Culpa" de duas irmãs catarinenses, que há 14 anos montaram a lanchonete Dois Corações e depois separaram a sociedade, ajudando a espalhar a receita por outros estabelecimentos. Quer encontrar uma coxinha assim? Então olhe se a confeitaria tem "coração" no nome.
A coxinha rechonchuda de Curitiba é uma criação de Solange Maria Giacomelli. Catarinense de Itajaí, ela e a família tinham uma fazenda de cacau na Bahia, quando resolveram morar em Curitiba, onde viviam alguns parentes. Na época, Solange se juntou à irmã, Lígia Giacomelli Leal, na abertura da primeira confeitaria Dois Corações, na Galeria César Franco (Rua Emiliano Perneta). O "arredondamento" do salgado foi resultado da mistura de requeijão ao recheio de frango. "Na Bahia, coxinha com catupiry não é comum, por causa do calor. Queria saber se era possível colocar bastante recheio e conseguir fechar o salgado. Perdi algumas noites tentando", diz.
Solange fazia os salgados e Lígia, os bolos da casa de lanches. A experiência culinária anterior das duas se resumia à cozinha do dia-a-dia. "Ela sempre foi boa cozinheira, mas não trabalhava com isso", conta o filho de Solange, Rafael Francisco de Morais, hoje responsável pela parte administrativa da Dois Corações. A sociedade não durou muito tempo: Lígia vendeu sua parte e Solange passou a tocar o negócio com a família.
A receptividade da clientela aos salgados de formato modificado e tamanho avantajado fizeram a empresa prosperar e chegar a cinco lojas. Mas, quando a família se dividiu, o negócio partido ao meio deu início a uma curiosa multiplicação das coxinhas do coração. Solange vendeu as três lojas que eram suas e quem comprou preferiu manter a referência ao coração no nome e a famosa coxinha gordinha. Lígia, irmã de Solange que estava afastada do ramo de lanches, comprou um dos pontos com um sócio e abriu a Doces Corações. Outra loja vendida deu origem a Belo Coração. Para tornar a história ainda mais complexa, Solange, depois de três anos fora de Curitiba, voltou e montou duas novas lojas, mantendo o nome Dois Corações.
Hoje há cinco Dois Corações originais em Curitiba duas de Solange e três do ex-marido, administradas pelos filhos. A concorrência soma um placar de quatro lojas, todas no Centro. "Entre as lojas que levam o nome da nossa, não há concorrência. Trocamos receitas e dicas e temos os mesmos fornecedores. Mas, em relação aos outros, a gente se incomoda. O nome parecido confunde o cliente. Se ele não gostar do salgado da outra pensa que foi a qualidade do nosso que caiu", avalia Morais, da "original".
Suficiente para empanturrar como uma refeição completa, as coxinhas custam um pouco mais caro que um salgado comum: R$ 2,50 contra um preço médio de R$ 1,80. "É o custo da qualidade. Todos os nossos salgados são preparados no dia, com produtos frescos. O que sobra na vitrine é descartado", justifica Morais. O gerente administrativo da Dois Corações prefere não revelar resultados, e só a muito custo diz que vende cerca de 500 coxinhas por dia nas três lojas que administra. "Olhando o número, talvez pareça que é fácil. Não é, isso tudo é resultado de um processo de melhoria e manutenção de qualidade muito forte", diz. A analista financeira Ana Cláudia Fernandes, cliente da confeitaria há três anos, confirma. "Vale a pena pagar pela qualidade. Um lanche destes vale por uma refeição."