A recessão tem abatido os menos instruídos. Estudo do economista Naercio Menezes, do Insper, revela que aumentou a distância salarial entre os trabalhadores com menor escolaridade e os que têm nível superior. Este é mais um indicador sobre o comportamento da distribuição de renda no mercado de trabalho, que vem piorando este ano diante da crise que castiga os mais pobres.
De acordo com números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, é possível constatar que o Brasil vinha diminuindo sistematicamente as distâncias salariais provocadas pelo grau de instrução. Esse movimento vinha firme até o fim de 2014. A tendência se inverteu, a ponto de o salário de quem tem curso superior ser 179% maior do que o de quem completou o ensino médio. A diferença aumentou em relação ao início de 2012, quando o percentual era de 175,4%:
— O tipo de crescimento econômico dos últimos anos foi muito concentrado no mercado de trabalho, muito baseado na inclusão de trabalhadores menos qualificados, com a expansão do emprego no setor de serviços. Como a recessão atingiu o mercado de trabalho, esse grupo que foi incluído começa a ser excluído novamente, aumentando a desigualdade — afirma Menezes.
Em razão da desigualdade, o retorno da educação no Brasil é muito alto. A diferença salarial entre quem tem nível superior e os analfabetos ou com pouca instrução é de 342,4%. Com o avanço da escolaridade entre os trabalhadores, principalmente no mercado de trabalho, esse abismo de renda determinado pelos bancos escolares vinha caindo. Em 2004, 10,2% dos ocupados não tinham instrução. Essa parcela baixou para 6,6% em 2014. E, entre os mais escolarizados, houve avanço: 50% tinham 11 anos ou mais de estudo em 2014. bem acima dos 34,3% em 2004.
‘POVO ESTÁ COM MENOS DINHEIRO’
Alailson Brito vende capa para banco de carro e proteção para volante na Rua Uruguaiana, no Centro do Rio, há 22 anos. Com o fundamental incompleto, viu o movimento cair 50% nos últimos meses:
— Acho que o camelô nunca sentiu uma crise como essa agora. O povo está com menos dinheiro. Então, as pessoas preferem comprar comida, roupa, coisas mais essenciais. Nem os itens que custam R$ 10 ou R$ 15 estão vendendo como antes.
Brito trabalha com a mulher, Jaciara Azeredo. Os dois pararam de estudar quando cursavam o sétimo ano do ensino fundamental. Eles conseguiam faturar, até um ano atrás, cerca de dois salários mínimos e meio, cerca de R$ 1.800. Agora, nem um salário mínimo conseguem ganhar com a atividade informal. Os tempos já foram bem melhores, lembra Brito. O filho chegou a trabalhar com ele nas vendas na Uruguaiana, mas não foi possível continuar com a ajuda extra.
— Ele teve de procurar outro emprego. Não deu para continuar pagando o salário.
Os números do economista Naercio Menezes mostram apenas a desigualdade no mercado de trabalho. Nessa conta, não entram rendas de aposentadorias, pensões e benefícios, como o Bolsa Família. Mas Menezes lembra que a melhora na distribuição de renda da última década foi ditada pelo mercado de trabalho, que responde, em média, por uma fatia de 70% a 80% da renda das famílias.
— Desde janeiro, a distância salarial vem subindo continuamente. Parece que o ciclo de melhora na distribuição de renda vai chegar ao fim. A situação vai ficar bem difícil.
MENOS QUALIFICADOS
O economista Lauro Ramos, especialista em mercado de trabalho do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz que os primeiros trabalhadores a serem sacrificados quando há crise econômica são os menos qualificados. Nos momentos de crise, acontece o que os economistas chamam de represamento da mão de obra:
— O custo do treinamento sobe com o nível educacional. No primeiro momento da crise, segura-se a mão de obra cujo treinamento custou mais.
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