Felipe Madruga e Alexandre Porsse, da UFPR: política de desoneração para um único segmento tira mercado de outros setores| Foto: Andre Rodrigues/Gazeta do Povo

O corte do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para o setor automotivo teve impacto positivo no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), mas a política de desoneração teria o mesmo efeito sobre a atividade econômica se, ao invés de beneficiar um único segmento, fosse uniforme para os demais setores industriais. A conclusão é de um estudo elaborado pelos economistas Alexandre Porsse e Felipe Madruga, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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A desoneração para as montadoras gerou um aumento de 0,0214% ao ano para o PIB do país desde que começou a ser usada, em 2009, para conter os efeitos da crise internacional. Mas, se todos os demais setores industriais recebessem o mesmo valor em desonerações, o impacto seria praticamente o mesmo: 0,0210%. Em termos de geração de emprego, o reflexo também é semelhante. A redução do IPI para o setor automotivo aumentou em 0,0481% o índice de emprego, o mesmo porcentual se a desoneração fosse ampla: 0,0423%

Baseado em um modelo econométrico, a análise mostra ainda que, ao concentrar um benefício em um setor, o incentivo acaba gerando distorções, ao tirar mercado de outros setores. "Quando se concentra o incentivo fiscal no setor automotivo, por exemplo, outras áreas da economia se ressentem, com queda de consumo. O consumidor que optar por adquirir um veículo provavelmente vai reduzir o consumo de outros bens para honrar os compromissos dessa dívida", explica Porsse.

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A ajuda às montadoras foi uma das principais estratégias do governo para promover o crescimento do consumo e da economia nos últimos anos. Segundo dados da Receita Federal, citados no estudo dos economistas, as desonerações para o setor automotivo subiram de R$ 1,8 bilhão em 2010 para R$ 2,6 bilhões em 2014, crescimento de 46,7% no período.

No total, o governo concedeu R$ 15,6 bilhões em desonerações relativas ao IPI, dos quais 53,4% para o segmento de veículos. A indústria de linha branca ficou com 6,2%; a de alimentos e similares com 7,9%; e o setor moveleiro com 10,6% do total de desonerações. O corte de IPI para a indústria de automóveis equivale a cerca de 30% da arrecadação do setor.

Artificial

No cálculo, os dois pesquisadores aplicaram o mesmo valor de desonerações concedido às montadoras para os demais segmentos industriais sujeitos à tributação do IPI. "O resultado comprova que a vantagem de incentivar um único setor, embora ele tenha importância na economia, é mais artificial do que real", afirma Porsse.

Para o professor, ao concentrar os benefícios em um único segmento, o governo também se expõe mais ao lobby setorial, o que torna a retirada da redução mais difícil. No início do mês, o governo federal resolveu manter o benefício após sofrer pressão das montadoras. O IPI reduzido para automóveis, que estava previsto para voltar no dia 1.º de julho para sua alíquota cheia (4% a 13%, dependendo do modelo), foi prorrogado e continuará entre 3% e 10% até o fim do ano.

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Renda

Corte tributária uniforme beneficia mais faixas sociais

O estudo conclui que a desoneração do IPI ajuda a estimular a economia e reduzir o risco de desemprego em períodos de contração da economia. Mas quando se analisa o impacto da medida por faixa de renda, percebe-se que ele é mais equilibrado quando o corte tributário beneficia vários setores.

Por outro lado, a desoneração do IPI no setor automotivo beneficia as faixas de renda medianas e mais elevadas. "As políticas tributárias anticíclicas de caráter setorial podem produzir efeitos regressivos ao passo que aquelas de caráter geral e uniforme tendem a ter efeitos progressivos, beneficiando grupos sociais de baixa renda que geralmente são mais vulneráveis nos períodos de crise econômica", diz o texto do estudo.

Consumo

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Concentrar a desoneração em um setor de bem durável também tem outro ponto negativo, já que esse tipo de produto não é renovado todo ano. Isso limita a continuidade dos efeitos positivos sobre o consumo no médio prazo. "Ninguém troca de carro todo ano, por isso os efeitos tendem a se esgotar ", finaliza.