Reforma administrativa pode impactar atuais servidores| Foto: Roque de Sá/Agência Senado
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Quando propôs sua reforma administrativa, o governo de Jair Bolsonaro se preocupou em frisar repetidamente que ela só atingiria os futuros servidores. Quem já estava no serviço público não precisaria se preocupar, porque os salários e a estabilidade seguiriam garantidos. Em tese, apenas uma proposta afetaria todo o funcionalismo: a regulamentação da lei que permite a demissão dos servidores por mau desempenho, mecanismo previsto na Constituição.

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Passadas algumas semanas da apresentação da reforma, outros pontos foram levantados e vistos como problemáticos, porque poderiam impactar os atuais servidores. Entre eles, estão a ampliação dos poderes do presidente para extinção de órgãos e ministérios e a reformulação do desenho das carreiras, associada à mudança nas regras para ocupar funções comissionadas.

Como a proposta ainda passará pelo crivo do Congresso e será faseada, especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que é complexo cravar que haverá prejuízos aos atuais servidores. Mas, ainda que em menor medida, haverá alguns impactos.

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A Gazeta do Povo separou quatro pontos que devem ser mais amplamente debatidos nos próximos meses e estão relacionados aos atuais servidores.

1. Quem são os futuros servidores?

O advogado especialista em direito administrativo Pedro Henrique Costódio pondera que como o objetivo da reforma é implementar uma série de mudanças, invariavelmente haverá novas discussões e novas propostas. Para ele, o processo de discussão legislativa vai servir para dirimir dúvidas sobre regras de transição e alcance das novas regras.

Uma questão que se imporá é como definir quem serão os futuros servidores. “Os aprovados em concurso público que não tiverem sido nomeados até a data da aprovação da PEC da Reforma Administrativa serão enquadrados no conceito de servidor público atual? Entendo que não”, observa.

2. Estabilidade na carreira

A reforma administrativa altera a estabilidade do serviço público ao acabar com o regime jurídico único e permitir novos vínculos de contratação para os servidores. Para os atuais servidores, as dispensas terão de respeitar três regras que já existem: sentença judicial, infração disciplinar e insuficiência de desempenho.

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Há uma mudança no entendimento da sentença judicial e a proposta de regulamentar a demissão por mau desempenho. Pela reforma, isso será feito posteriormente por meio de lei ordinária, que seria uma modificação da atual exigência de lei complementar, que nunca foi implementada embora esteja prevista na Constituição. Esses dois casos afetarão quem já está na ativa.

O advogado Douglas Oliveira, sócio do escritório Oliveira, Vale, Securato & Abdul Ahad Advogados, explica que atualmente há uma exigência para que a demissão de um servidor por decisão da justiça só ocorra após o trânsito em julgado da sentença – ou seja: quando não há mais possibilidade de recorrer. A mudança, que valeria para todos, muda esse entendimento para após uma decisão de colegiado, ou a segunda instância da Justiça.

Para ele, essa discussão segue a mesma linha do cumprimento de pena após condenação em segunda instância. “Isso é redução de direito? Eu entendo que não, porque só afetará casos de servidores com decisão em segunda instância futuramente. A lei não vai retroagir. E não se reduz um direito: reduz a prerrogativa de continuar no serviço público”, argumenta, e lembra que o processo seguirá tramitando.

Em relação a regulamentação da avaliação de desempenho, que pode ocasionar demissões, o ex-ministro da Controladoria-Geral da União Valdir Simão, atualmente no escritório Warde Advogados, considera que é um item que vai demandar atenção para a redação da futura lei.

“A avaliação de desempenho virá. Os servidores têm que zelar para que, no desenho desse processo de avaliação, esse instrumento não seja usado para intimidação do servidor, até porque o governo está rebaixando a hierarquia da norma, de lei complementar para ordinária, que é mais fácil de aprovar”, observa.

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3. Novas carreiras e cargos em comissão

A remodelação das carreiras foi apontada como um possível risco aos atuais servidores. O governo argumenta que o atual e futuro modelo coexistirão por um período, mas que as atuais carreiras manterão suas características, e os servidores atuais manterão os direitos. O redesenho também prevê novas regras para preenchimento de cargos em comissão, que passarão a ser tratados como cargos de liderança.

A avaliação de Valdir Simão é de que um conjunto de servidores poderá ser enfraquecido, uma vez que manterá estabilidade, mas as carreiras serão descontinuadas ao longo do tempo. “Os servidores dessas carreiras perderão importância estratégica, e acabarão, com o tempo, perdendo a possibilidade de melhor desenvolvimento das carreiras, ganhar pleitos de remuneração”, aponta.

A diminuição de cargos em comissão ou mudança nas regras para ocupá-los não é uma perda de direito dos atuais servidores, na opinião do especialista. “Teremos uma redução forte dos cargos de comissão e função de confiança, que virarão cargos de liderança. Em alguns casos, não faz sentido o servidor receber um adicional para algo que deveria ser uma atribuição natural do cargo dele”, pondera.

O advogado Douglas Oliveira segue a mesma linha de raciocínio. “O cargo em comissão já pode ser ocupado por pessoas que não são servidoras atualmente. Isso [a mudança nas regras] não geraria prejuízo ao servidor, porque ele poderá ocupar a nova modalidade”, avalia.

4. Mais poder ao presidente

Ponto polêmico da proposta, a ampliação dos poderes do presidente em relação a extinção de órgãos, ministérios ou autarquias não afetará o servidor, porque não implicará na sua dispensa. O Brasil já tem, por exemplo, um departamento de órgãos extintos, que agrupa servidores de instituições que não existem mais. “A função não é extinta, mas o arranjo organizacional vai ser ajustado”, aponta Valdir Simão. Para ele, neste caso o problema maior é em relação ao tipo de prerrogativa que poderá ser aberta caso a medida avance como foi proposta.

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Douglas Oliveira também concorda que a extinção de um órgão não implica em demissão do servidor, ainda que seja o caso específico de um tipo de cargo da administração pública que só existia ali. “Já há previsão jurídica para fusões [de órgãos] e reaproveitamento do servidor em outras funções”, aponta.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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