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Depois de quase um ano adiando a entrega, o governo finalmente encaminhou ao Congresso a primeira parte da sua proposta de reforma tributária. O texto foi entregue nesta terça-feira (21) pessoalmente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, aos presidentes do Congresso e da Câmara, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Rodrigo Maia (DEM-RJ), respectivamente.
O governo propôs nessa primeira etapa apenas a unificação do PIS/Pasep (Programa de Integração Social e Formação do Patrimônio do Servidor Público) e da Cofins (Contribuição sobre o Financiamento da Seguridade Social) em um único imposto sobre valor agregado (IVA).
O tributo que vai reunir o PIS-Cofins será chamado de CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), caso seja aprovado pelo Congresso. A alíquota será única, de 12%, com exceção para os bancos, que pagarão 5,8%, porque eles não geram e não se apropriam de crédito tributário ao longo da cadeia de produção, ao contrário das outras empresas, segundo o governo.
Quem ficou isento de pagar a CBS
Ficam isentos de pagar a CBS produtos da cesta básica; serviços de saúde custeados pelo SUS; transporte coletivo de passageiros; templos religiosos; sindicatos; partidos políticos; instituições e fundações filantrópicas; e entidades e conselhos de classe. Além dos bancos que pagarão uma alíquota menor, haverá modelos especiais para produtos da área de óleo e gás e pequenos agricultores.
Conforme mostrou a Gazeta do Povo em outubro de 2019, a equipe econômica planejava reonerar parte dos produtos da cesta básica, em especial queijos e derivados. Os recursos obtidos com essa reoneração seriam destinados ao programa Bolsa Família.
Segundo Vanessa Canado, assessora especial do ministro Paulo Guedes para assuntos tributários, a discussão sobre a reoneração da cesta básica realmente saiu da reforma tributária, mas fica no radar da equipe econômica e deve ser incluída na reformulação de programas de assistência social, ainda em discussão no governo.
ICMS e ISS também ficam de fora
O governo ainda deve enviar ao Congresso uma segunda, terceira e quarta partes da sua proposta de reforma tributária. Essas novas fases vão mexer com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto de Renda (IR), folha de pagamentos e imposto sobre transações digitais.
A opção da equipe econômica foi por não tratar do ICMS, o principal imposto estadual, e do ISS, municipal, na reforma tributária do Executivo. Para justificar a exclusão dos dois tributos da unificação, o ministro Paulo Guedes disse que os textos em tramitação no Congresso já abordam o tema, e que é função do Parlamento – e não do Executivo – fazer modificações nos impostos regionais.
Tudo sobre a CBS: como e de quem ela será cobrada
A primeira parte da reforma tributária do Executivo foi enviada ao Congresso na forma de um projeto de lei. Segundo a equipe econômica, a opção por mirar o PIS/Pasep e na Cofins se relaciona à complexidade desses tributos.
Somente a legislação que versa sobre ambos tem mais de duas mil páginas. Há regimes diferenciados para cada setor e os impostos incidem sobre a folha, a receita e a importação, gerando um emaranhado de normas. Além disso, esses tributos são cumulativos.
A opção do governo, então, foi trocá-los por um imposto do tipo valor agregado (IVA), que é mais moderno e usado por mais de 100 países. A Receita Federal definiu que a alíquota da CBS será de 12%. Cada empresa recolherá apenas sobre a receita bruta, ou seja, a receita decorrente de operações com bens e serviços, e não sobre a receita total, como aconteceu quando foi instituída a apuração não cumulativa da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins.
Uma novidade trazida pelo projeto do governo é que as plataformas digitais terão de recolher a CBS quando intermediarem operações em que o vendedor pessoa física não emita nota fiscal eletrônica. É o caso de plataformas de vendas entre pessoas físicas, que antes não recolhiam PIS/Cofins.
Ficarão isentos de recolher a CBS serviços de saúde pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS); a venda de produtos da cesta básica; serviços de transporte público coletivo municipal de passageiros; e vendas de imóveis residenciais a não contribuintes, desde que não abarcadas pelo Regime Especial de Tributação (RET).
Também não serão contribuintes da CBS instituições filantrópicas e fundações; partidos políticos; sindicatos; serviços sociais autônomos; templos de qualquer culto; condomínios de proprietários de imóveis; e entidades representativas de classes e conselhos de fiscalização de profissões.
Já os bancos vão pagar uma alíquota menor da CBS: 5,8%. Segundo o Ministério da Economia, o setor financeiro pagará menos porque essas empresas não geram e não se apropriam de crédito tributário ao longo da cadeia de produção, ao contrário das outras empresas, que vão acumular crédito para descontar ao longo da cadeia.
Vanessa Canado, assessora especial do ministro Paulo Guedes para assuntos tributários, explicou ainda que, na prática, a alíquota paga por bancos vai aumentar na comparação com que as instituições pagam hoje de PIS/Cofins.
O secretário especial da Receita Federal, José Tostes, afirmou em coletiva de imprensa que o governo não está "só" fazendo uma reforma do PIS/Cofins. "É um modelo completamente novo. Nós estamos abandonando duas contribuições que acabaram sendo distorcidas ao longo dos anos em função de inúmeras alterações. O tributo será mais simples para as empresas e transparente para o consumidor ", disse.
Proposta muda carga tributária?
Segundo o projeto enviado pelo governo e assinado pelo ministro Paulo Guedes, a criação do novo tributo não implicará em aumento de carga tributária. O objetivo da proposta, assim, foi simplificar o sistema tributário em âmbito federal.
O governo destaca que a CBS, por se tratar de um tributo sobre valor agregado, não será cumulativa. "Todo e qualquer crédito vinculado à atividade empresarial poderá ser descontado da CBS devida e os créditos acumulados serão devolvidos", explica Guedes no projeto.
A CBS terá sua não cumulatividade operacionalizada da seguinte forma: o tributo incidente nas etapas anteriores poderá ser abatido das contribuições incidentes nas etapas posteriores. O abatimento será feito a partir da comprovação dos documentos fiscais. Empresas optantes do Simples Nacional também terão direito aos créditos.
Os créditos acumulados da CBS também podem ser ressarcidos ou compensados em outros tributos. As empresas têm até cinco anos para utilizar o crédito. Depois desse prazo, ele expira.
O projeto do Executivo prevê, por fim, que a CBS entra em vigor seis meses após a publicação da nova lei. Segundo a equipe econômica, a implantação da CBS garantirá um sistema tributário mais simples, neutro e homogêneo. "Isso impulsionará a produtividade e o crescimento econômico", garantiram os integrantes do governo.
Veja a íntegra do projeto de lei que institui a CBS:
Projeto é apenas a 1ª fase da reforma tributária pretendida pelo governo
O projeto do governo vai se juntar a outras duas propostas de emenda à Constituição (PEC) que já estão em tramitação no Congresso e que propõem mudanças mais amplas do que as idealizadas pelo Executivo: a PEC 45, da Câmara; e a PEC 110, do Senado. Deputados e senadores vão se reunir em uma comissão mista ao longo deste segundo semestre para chegar a um texto de consenso.
Além disso, o governo ainda deve enviar ao Congresso a segunda, a terceira e a quarta partes da sua proposta de reforma tributária. A segunda fase trará mudanças na tributação da renda para pessoas físicas e jurídicas, acabando com algumas deduções do Imposto de Renda (IR) e tributando dividendos.
Já a terceira parte vai propor mudanças no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que vai ficar mais seletivo. Por fim, a última fase trata da criação de um imposto sobre transações comerciais digitais para bancar a desoneração da folha de pagamentos e o programa Renda Brasil.
A equipe econômica promete que vai encaminhas nas próximas semanas as próximas fases da reforma. O presidente do Congresso, por sua vez, não informou uma data para reinício dos trabalhos da comissão mista, que vai analisar as propostas do governo, do Senado e da Câmara.