O esgotamento das pautas ligadas à pandemia do coronavírus no Congresso Nacional abriu espaço para que o Parlamento voltasse a dar atenção à reforma tributária. O próprio presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que quer dar prosseguimento às discussões em agosto.
Mas, para que as alterações no sistema tributário de fato avancem, deputados e senadores terão que entrar em acordo sobre qual proposta será levada adiante. Duas propostas de emenda à Constituição já estão em tramitação no Congresso desde o ano passado: a PEC 45, da Câmara; e a PEC 110, do Senado. Agora, um novo texto deve entrar no jogo, enviada pelo governo federal.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, garantiu que entregará a primeira etapa da reforma tributária idealizada pelo governo ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na próxima terça-feira (21). Se o texto de fato for enviado, a proposta do governo chegará no momento em que Maia e Alcolumbre buscam superar um desentendimento precisamente por conta da reforma tributária.
O episódio que gerou a rusga tem suas origens na comissão mista instalada pelas duas Casas para buscar unificar as duas PECs da reforma. A ideia da comissão era evitar uma disputa por protagonismo entre deputados e senadores: com as discussões no grupo, uma única proposta seria levada adiante no Congresso, o que evitaria que as PECs ficassem “na gaveta” depois de aprovadas nas respectivas Casas de origem.
A pandemia, porém, acabou travando os trabalhos. Como a comissão ainda não retomou as discussões, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, resolveu dar prosseguimento à reforma idealizada pelos deputados – o que irritou Davi Alcolumbre. Depois de um mal estar, o próprio Maia disse ter conversado com Alcolumbre, pedindo a retomada da comissão mista. “Não queremos aprovar a reforma da Câmara, mas a proposta do Congresso Nacional, junto com o governo federal”, afirmou o presidente da Câmara.
O que está nas propostas da Câmara e do Senado
Consta nas duas PECs em tramitação no Congresso a unificação dos impostos sobre o consumo, na forma de tributos do tipo IVA (Imposto sobre Valor Agregado). Na matéria dos senadores, originada de um relatório do ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly, nove tributos são transformados em dois. Assim, os seguintes tributos deixariam de existir:
Federais:
- Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI);
- Imposto sobre Operações Financeiras (IOF);
- Programa Integração social (PIS);
- Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep);
- Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
- Salário-educação;
- CIDE-Combustíveis.
Estadual:
- Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Municipal:
- Imposto sobre Serviços (ISS).
No lugar deles, passariam a ser cobrados um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que seria de competência estadual; e um imposto seletivo, federal, que incidiria sobre produtos como bebidas alcoólicas. Outro tributo que deixaria de existir, a Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) seria incorporada ao Imposto de Renda.
De modo geral, a proposta que tramita na Câmara, formulada pelo economista Bernard Appy, segue na mesma linha da matéria originada no Senado. Nessa PEC, entretanto, o número de impostos extintos é menor: IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS seriam fundidos em um Imposto sobre Bens e Serviços.
Outra diferença está na gestão dos recursos. Na proposta da Câmara, a arrecadação seria compartilhada entre União, estados e municípios – que poderiam fixar alíquotas distintas para o mesmo tributo. A intenção, nesse caso, é não desrespeitar o princípio de autonomia dos entes federativos, presente na Constituição.
A PEC 45, da Câmara, também prevê a possibilidade de criação de um tributo exclusivo, que seria de competência federal. Com isso, a União poderia taxar produtos como cigarros e bebidas alcoólicas, para desestimular o consumo. O texto propõe, ainda, um mecanismo de devolução de recursos para os mais pobres, que originaria uma nova forma de transferência de renda do governo para famílias em situação de vulnerabilidade social.
Onde entra a reforma tributária do governo?
A equipe econômica, por sua vez, promete enviar uma proposta de reforma tributária ao Congresso desde o ano passado. Um primeiro texto teria sido concluído ainda em 2019, mas acabou não sendo encaminhado depois de polêmicas envolvendo a criação de um imposto sobre pagamentos, semelhante à CPMF. À época, o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra – um entusiasta do imposto único – foi demitido do cargo por conta da ideia.
O ministro Paulo Guedes, porém, nunca desistiu de um imposto desse tipo. A ideia de Guedes é usar a tributação dos pagamentos para substituir os impostos que recaem sobre a folha de salários. Com a rejeição a um imposto mais amplo, como a CPMF, o ministro agora cogita implementar uma contribuição que se restrinja aos pagamentos do comércio eletrônico, com alíquota de 0,2%.
Essa, entretanto, seria apenas uma das alterações propostas pelo governo. A ideia de Guedes é enviar as mudanças em etapas ao Congresso, para evitar que a rejeição ao imposto sobre pagamentos contamine toda a discussão. Ainda não está claro, entretanto, em quantas partes a reforma será fatiada. No ano passado, o atual secretário da Receita, José Roberto Tostes Neto, afirmou que seriam quatro etapas.
Ao que tudo indica, a primeira fase, a ser encaminhada nesta semana, também envolveria a criação de um imposto sobre valor agregado. Mas, nesse caso, seria um IVA Dual, ou seja, implementado aos poucos. Os primeiros tributos unificados seriam federais (PIS e Cofins), que dariam lugar a um imposto com alíquota de 12%. Só depois seriam incluídos o ICMS, estadual, e o ISS, municipal, para, por fim, haver a padronização das alíquotas.
Segundo o que já havia sido publicado pelo governo, além do IVA Dual e da contribuição sobre pagamentos, a reforma de Guedes incluiria etapas com mudanças no Imposto de Renda e com a criação de um imposto seletivo a partir do IPI. Mas, até agora, não há detalhes concretos sobre essas ideias.
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