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Parecia que ia deslanchar, mas o debate da reforma tributária voltou a ficar empacado no Congresso. Enquanto propostas de emenda à Constituição e seus substitutivos não são analisados pelos parlamentares, ainda há tempo para mais discussões sobre a reformulação do sistema tributário, sobretudo com o viés do impacto que será causado a cada ente da federação. Para os estados, mexer no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) significa alterar a principal fonte de arrecadação.
O impacto das principais propostas de reforma tributária sobre os estados foi um dos temas discutidos na live “Caminhos para a Reforma Tributária”, promovida pela Secretaria de Fazenda do Paraná (Sefa-PR)e Assembleia Legislativa do Paraná na última quarta-feira (7).
O encontro contou com apresentações das PECs 110 e 45, pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly e o economista Bernard Appy; da proposta da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) do governo federal, defendida pelo subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita Federal, Sandro de Vargas Serpa; e da sugestão dos estados, defendida pelo secretário de Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha. O encontro foi mediado pelo secretário da Fazenda do Paraná, Renê Garcia Junior.
ICMS responde por 74% da arrecadação dos estados
Garcia Junior já vinha destacando a relevância do tema, já que os estados poderão se tornar mais autônomos e menos dependentes da União, desde que tenham maior capacidade de arrecadação.
Atualmente, o ICMS responde, em média, por 74% da arrecadação dos estados, explicou Décio Padilha, da Sefa-PE. É por isso que qualquer proposta de alteração no modelo do imposto gera debate: há uma concordância de que é preciso adotar medidas que acabem com a guerra fiscal entre os estados, mas alterações nas formas de cobrança (se na origem ou destino) e da repartição de um imposto unificado geram impasses.
A sistemática de cobrança no local do consumo, e não na origem da produção do bem, já foi identificada por parlamentares como um dos obstáculos para a tramitação da reforma tributária no Congresso, ao lado da possível recriação da CPMF. Conforme a Gazeta do Povo já adiantou, a análise dos parlamentares é de que isso prejudicaria estados que têm população menor mas que produzem insumos consumidos em outros locais, como energia elétrica e minérios.
A Sefa-PR já vinha realizando uma série de webinars entre secretários de Fazenda. Em julho, logo após o governo federal divulgar a sua proposta de reforma tributária, que será faseada e excluiu estados e municípios da primeira etapa, secretários de Fazenda criticaram a proposta, considerada "egoísta" e marcada pela falta de coordenação da União.
Por ora, o governo federal ainda não apresentou nada que contemple estados e municípios. A proposta formal é um projeto de lei que unifica o PIS e a Cofins na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Mas o subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita Federal, Sandro de Vargas Serpa, declarou que o órgão é favorável à criação de um Imposto sobre Bens de Serviços (IBS), como o que é proposto nas duas PECs e no substitutivo dos estados.
“Embora tenhamos encaminhado um PL, nosso plano A é trabalhar com um IBS”, declarou. Ele ainda declarou que questões como a repartição de receitas tributárias e mudanças de cobranças de origem e destino são prioritárias.
Propostas de reforma tributária convergentes
As PECs 45 e 110 e o substitutivo proposto pelo Comitê Nacional de Secretários da Fazenda, Finanças, Receitas ou Tributação dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz) são convergentes. Todos apostam na unificação de tributos, com a criação de um IBS, que inclui o ICMS, e um imposto seletivo, exclusivo da esfera federal. As principais diferenças estão no tempo de transição e na criação de fundos específicos para compensação de perdas de arrecadação.
O ex-deputado Luiz Carlos Hauly foi enfático ao dizer que, ao longo da história, a União “destruiu” o sistema tributário brasileiro, ao elevar a carga tributária e ao criar contribuições que também incidem sobre consumo. Para ele, o principal ponto de uma reforma tributária é não alterar a partilha. Por isso, propõe um IBS em que União fique com 35% da arrecadação, estados com 42% e municípios, 23%.
A participação da União será reduzida ao longo de 20 anos, à medida que transfira arrecadação desse imposto sobre consumo para a tributação sobre renda, por meio da elevação das alíquotas de Imposto de Renda.
Mentor da proposta da PEC 45, o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), defende, que após a unificação dos impostos federais, estaduais e municipais, seja implementado um modelo centralizado de gestão dessa arrecadação, fundamental para fazer os repasses a cada ente. Com esse modelo, haverá compensação da perda de arrecadação dos estados exportadores – atualmente, há isenção de impostos para exportação – e, com uma base tributária comum, não haveria mais motivos para guerra fiscal.
“A guerra fiscal é só perda de produtividade, sem nenhum ganho para nenhum ente da federação. A reforma tributária que corrigir essas distorções trará efeitos positivos. Você parte desse federalismo fratricida que temos hoje para um modelo de federalismo de cooperação”, defende.
A proposta da PEC 45 recebeu críticas pelo longo período de transição – que levaria até 50 anos para ser concluído. Por isso, a equipe do CCiF passou a desenvolver um modelo alternativo, com um fundo de transição federativa, que receberia parte da arrecadação do IBS para alocar aos estados que terão perdas.
Segundo Appy, esse é um modelo interessante porque possibilita limitar a perda estática de cada ente a um valor entre 3% e 5%, dando ao ente a segurança de que não terá grandes perdas. Complementarmente, também propõe um modelo de desenvolvimento regional, com recursos orçamentários, que permitirá que cada estado explore sua vocação regional, não apenas na indústria, mas também em outros setores, como o de serviços.
“O modelo de guerra fiscal não explora a vocação regional, você só tenta roubar as empresas dos outros estados. No agregado, não tem redução relevante de desigualdades regionais. Com a limitação de perdas e mais crescimento [com a aprovação da PEC], todos os entes serão beneficiados”, defende.
Essa criação do fundo dialoga com uma proposta dos estados, que querem um Fundo de Desenvolvimento Regional e Incentivo às Exportações, que receberia repasses da arrecadação da União com os impostos, somaria até R$ 480 bilhões em dez anos e bancaria as perdas dos estados com mudanças na repartição dos recursos e na arrecadação de exportações, atualmente isentas de tributação.
Décio Padilha, da Sefa-PE, diz que, com esse fundo, fica resolvida a questão que era vista como um entrave pelos estados, especialmente os exportadores.
O secretário lembra que o grupo também tem interesse em uma reforma tributária que acabe com a guerra fiscal – que até inicia como competição, mas se torna predatória e autofágica. “A guerra fiscal que está acontecendo no Brasil não é competição, é guerra mesmo, de zerar tributação. É jogo de perde-perde”, argumenta.
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