O aspecto mais conhecido da reforma da Previdência é a idade mínima de 65 anos para a aposentadoria. Mas há pontos ainda mais polêmicos, que tendem a provocar uma maior rejeição entre a população, diferentes categorias profissionais e os próprios parlamentares que vão votar a proposta. Essas mudanças terão mais dificuldade para passar pelo Congresso e, se aprovadas, correm o risco de ser questionadas na Justiça.
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Degrau “gigante”
A regra de transição, que deveria suavizar o impacto da reforma da Previdência, criará uma enorme diferença nos direitos de trabalhadores com idades próximas.
As trabalhadoras que tiverem 45 anos completos ou mais na data da promulgação da proposta de emenda à Constituição (PEC) entrarão no regime de transição, assim como os homens com 50 anos ou mais. Essas pessoas terão de cumprir um “pedágio”, trabalhando 50% a mais que o tempo que faltava para se aposentar pelas regras atuais. Por outro lado, as mulheres com menos de 45 e os homens com menos de 50 obedecerão desde já às regras novas.
Isso significa que um homem com 50 anos que poderia se aposentar aos 56 terá de contribuir por três anos a mais, trabalhando até os 59. Mas um colega um pouco mais novo – de 49 anos e 11 meses de idade, por exemplo – só conseguirá se aposentar aos 65.
Esse tratamento tão distinto a trabalhadores “parecidos” tem grandes chances de ser modificado no Congresso ou questionado na Justiça, com base no princípio da razoabilidade.
Homens e mulheres
Pelas regras atuais, as mulheres podem se aposentar cinco anos antes que os homens. Ou seja, contribuem por menos tempo para a Previdência. Mas também vivem mais, o que significa que desfrutam da aposentadoria por mais tempo. A expectativa média de sobrevida de uma mulher que completou 65 anos em 2015 é de 19,8 anos, segundo o IBGE. Espera-se, portanto, que ela viva até os 85. Para um homem de 65, a sobrevida esperada é de 16,7 anos.
Essa diferença tem um custo elevado para o sistema previdenciário. Para poupar recursos, o governo pretende estabelecer uma idade mínima de 65 anos para ambos os sexos.
Mas essa equiparação abre espaço para contestações. Para muitos especialistas, as regras atuais – mais brandas para as mulheres – servem para compensar injustiças do mercado de trabalho.
Em geral as trabalhadoras têm salário mais baixo, exercem jornada dupla (depois do trabalho, cuidam da casa) e eventualmente são vítimas de preconceito por se ausentarem durante a maternidade e faltarem ao serviço para cuidar de filhos doentes.
Benefícios assistenciais
O salário mínimo, hoje em R$ 822, continuará sendo o piso das aposentadorias. Mas não será mais o valor do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que é pago a pessoas pobres com deficiência (física, mental, intelectual ou sensorial) e idosos de 65 anos ou mais. E a idade mínima para que o idoso tenha acesso ao benefício subirá para 70 anos.
O governo tem dois objetivos com essa proposta. O primeiro é estimular a contribuição à Previdência, pois, com o BPC, muita gente que jamais contribuiu para o sistema previdenciário recebe o mesmo valor que 61% dos aposentados e pensionistas do INSS. O segundo objetivo é poupar dinheiro – as despesas com o BPC saltaram de R$ 22 bilhões em 2010 para R$ 42 bilhões no ano passado.
Não é difícil imaginar a disputa que a medida vai provocar no Congresso e, eventualmente, na Justiça. Para o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), a proposta é a mais dura da reforma. “O constituinte, em 1988, preocupou-se em garantir o mínimo de sobrevivência, e agora o governo quer reduzir os benefícios aos idosos e deficientes carentes para menos que um salário mínimo”, afirmou a entidade, em nota.
49 anos de contribuição
Os brasileiros já estavam se acostumando à ideia de trabalhar até os 65 anos. Mas ninguém esperava ter de contribuir por 49 anos para receber o benefício integral. A proposta deve enfrentar resistência no Congresso.
Se a medida passar, alguém que teve seu emprego formal aos 21 anos e nunca ficou desempregado só conseguirá receber uma aposentadoria equivalente à média de seus salários se trabalhar até os 70.
A diferença em relação às regras atuais é grande. Hoje uma mulher consegue o benefício integral se a soma de idade e tempo de contribuição for de 85 – com 55 de idade e 30 de contribuição, por exemplo. Um homem recebe o mesmo benefício se somar 95 – por exemplo, aos 60 anos, após ter contribuído por 35.
Militares de fora
O governo insiste que “todos vão contribuir para a reforma”. “De uma forma ou de outra, todos contribuem, políticos, servidores, não servidores”, disse nesta terça-feira (6) o secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano. Mas existe, sim, uma exceção. E grande: as Forças Armadas.
O governo avisou que a aposentadoria dos militares será tratada à parte, em projeto de lei. Mas não esclareceu por que não enviou desde já esse projeto e nem quando pretende encaminhá-lo.
Enquanto isso não ocorre, outras categorias – como os policiais – pedem o mesmo tratamento, com o argumento de que suas profissões exigem tanto vigor físico e envolvem tantos riscos à saúde quanto a atividade dos militares.
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