O relator da reforma tributária no Senado, senador Eduardo Braga (MDB-AM), incluiu no texto da proposta de emenda à Constituição (PEC) 45/2019 um dispositivo que cria uma trava para impedir o aumento da carga tributária sobre consumo, acatando uma sugestão do Tribunal de Contas da União (TCU).
O eixo central da reforma é a adoção de um sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Passam a vigorar o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) no lugar do ICMS estadual e do ISS municipal; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substitui três tributos federais: PIS, Cofins e IPI.
Em seu relatório, protocolado no fim da manhã desta quarta-feira (25), Braga propõe um teto de referência para as alíquotas do novo sistema de tributação, com base na média da receita de 2012 a 2021, calculada como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). A comparação, no entanto, será feita apenas a partir de 2030, e a tributação será reduzida caso ultrapasse o teto de referência.
“Quanto maior o período e quanto maior o prazo de verificação, maior a confiabilidade dele. E ele é móvel, então vai dar um retrato mais preciso da economia”, explicou o relator em entrevista coletiva.
Aumento nos recursos para o Fundo de Desenvolvimento Regional
Em outra mudança em relação à versão da PEC aprovada pela Câmara em julho, o relator ampliou o volume de recursos que serão repassados pela União ao Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).
Anteriormente estavam previstos aportes anuais crescentes que chegariam a R$ 40 bilhões em 2033. Braga propôs manter as transferências, mas estabeleceu outros pagamentos, a partir de 2034 e até 2043, ampliados anualmente à razão de R$ 2 bilhões, chegando a R$ 60 bilhões ao fim do período.
Conforme a proposta, 70% dos recursos serão distribuídos entre as unidades federativas com base nos critérios do Fundo de Participação nos Estados (FPE) e os 30% restantes, pela razão direta da população. “Um estado como Minas Gerais receberia pelos números anteriores R$ 2,7 bilhões por ano. Com os R$ 60 bilhões, passará a receber R$ 4 bilhões por ano. Isso faz uma grande diferença no desenvolvimento regional do Brasil”, disse o senador.
Senador propôs duas categorias de cestas básicas
O parlamentar propôs ainda a criação de duas categorias diferentes de cesta básica, uma delas isenta dos novos tributos, e outra com alíquota reduzida em 60% em relação à tributação padrão. A redação do senador ainda prevê que a cesta seja nacional, porém com características de regionalização desde que nutricionalmente adequada.
A ideia, segundo ele, foi atender às diversas demandas que recebeu para incluir produtos no pacote com imposto zerado, mas, por outro lado, não tornar a lista abrangente demais. Os itens que comporão cada uma das cestas, no entanto, serão definidos por lei complementar.
Imposto seletivo não incidirá mais sobre bicicletas
Outra mudança importante foi a exclusão do dispositivo que previa a incidência do imposto seletivo sobre bens e serviços produzidos na Zona Franca de Manaus (ZFM) que sejam fabricados em outros locais, de modo a dar benefícios competitivos à região.
O objetivo original do imposto seletivo, também conhecido como “imposto do pecado”, é sobretaxar produtos considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente para desestimular seu consumo. Na Câmara, foi incluído o novo uso para o tributo, que acabaria incidindo sobre produtos como bicicletas, motocicletas, computadores, televisores, celulares, entre outros.
“O Ministério da Fazenda reconheceu que havia uma disfunção e aí tiramos o imposto seletivo da Zona Franca e criamos uma Cide que vai manter as vantagens comparativas dos produtos da Zona Franca”, disse Braga, que é senador eleito pelo Amazonas. “Com isso, o imposto seletivo não ocorrerá mais sobre os produtos da Zona Franca, a não ser que algum produto tenha algum tipo de impacto ao meio ambiente ou à saúde.”
Redução de alíquota para profissionais liberais
Com já havia adiantado, o senador também incluiu uma redução de alíquota de 30% dos novos tributos para profissionais liberais, como advogados, médicos, contadores e engenheiros.
“Você tem aqueles [profissionais] que estão no Simples e aqueles que estão acima do Simples. Aí, a carga tributária aprovada pelo texto da Câmara aumentava o tributo sobremaneira para esses profissionais. Então, é aquele ditado ‘nem tanto, nem tão pouco’. Nem ficar com a alíquota atual, nem estabelecer uma alíquota que acabaria forçando que eles acabassem desmontando a ‘pejotização’ dessas profissões”, disse Braga ainda na segunda-feira (23).
Novos setores com regimes específicos de tributação
No parecer do senador, houve mudanças também nos setores que terão regimes específicos de tributação. Combustíveis e lubrificantes, por exemplo, terão alíquotas uniformes definidas por resolução do Senado Federal, sob critérios de uma lei complementar.
Foram incluídas ainda operações alcançadas por tratado ou convenção internacional; saneamento e concessões de rodovias; operações que envolvam a disposição de estrutura compartilhada de serviços de telecomunicações; serviços de agências de viagens e turismo; e transporte coletivo intermunicipal, interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo.
Sai conselho federativo, entra comitê gestor
O relatório de Braga ainda altera o funcionamento do órgão responsável por gerir o IBS, que, outrora denominado conselho federativo, agora passa a se chamar comitê gestor. No novo modelo, foi incluída a possibilidade de o Congresso Nacional convocar o presidente do órgão e solicitar informações da mesma forma que hoje já ocorre com ministros de Estado. Também foi retirada a prerrogativa de proposição de lei pelo comitê.
Pela proposta, haverá ainda um controle externo pelos tribunais de contas dos estados e, onde houver, dos municípios. As deliberações no âmbito do comitê serão por maioria absoluta de representantes de estado, que correspondam a pelo menos 50% da população.
Já as responsabilidades continuam as mesmas: arrecadação, partilha, devolução de créditos, solução de de conflitos entre fisco e contribuintes e regulamentação do IBS.
Prorrogação de benefícios para setor automotivo
Acenando ao governo federal, o relator também inseriu na proposta a prorrogação até 2032 do programa de benefícios fiscais para o setor automotivo nas regiões Nordeste e Centro-Oeste.
Na Câmara, a PEC previa a prorrogação até 2030 em um artigo que foi apelidado de “emenda Lula”. O dispositivo, que teria sido encomendado pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no entanto, acabou derrubado pelos deputados.
Para economista, relatório piora PEC da reforma tributária
Para Felipe Salto, economista-chefe da Warren Rena, o novo texto apresentado nesta quarte-feira propõe mudanças que não corrigem os problemas da versão aprovada pela Câmara e ainda adiciona outras dificuldades.
“No que se refere à transição, nada foi feito para trazê-la a um horizonte de curto prazo, bem como atenuar o problema da redução de alíquotas do ICMS e do ISS concentrada entre 2029 e 2032. Também não se avançou na redução das exceções. Ao contrário, introduziu-se a possibilidade de redução de alíquota de 30% para categorias profissionais eleitas. A gestão do IBS continuará centralizada em um único órgão e sua regulamentação virá por lei complementar”, diz.
Pacheco quer concluir votação em novembro
A expectativa é que o parecer de Braga seja votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no dia 7 de novembro e, na sequência, vá para a apreciação em plenário.
Na terça-feira (24), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que espera concluir a votação em plenário da reforma tributária ainda em novembro.
“Uma vez votado na CCJ, vamos mandar imediatamente para o Plenário do Senado. Acredito que no mês de novembro conseguimos votar tanto na CCJ quanto no Plenário. É uma reforma muito aguardada ela sociedade”, disse.
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