Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Contas públicas

Relatório de PEC para aliviar Orçamento não previa corte de salário; economia seria mínima

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o senador Marcio Bittar (MDB)-AC), relator do Orçamento 2021 e da PEC Emergencial.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o senador Marcio Bittar (MDB)-AC), relator do Orçamento 2021 e da PEC Emergencial. (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

Ouça este conteúdo

O relatório preliminar da proposta de emenda à Constituição (PEC) Emergencial, que abriria espaço no Orçamento ao prever uma série de medidas de corte de gastos, ficou aquém do esperado pela equipe econômica. O texto foi desidratado pelo relator, senador Márcio Bittar (MDB-AC), numa tentativa de levá-lo a votação, mas mesmo assim não houve acordo. O parecer acabou não sendo protocolado no Senado e a votação da matéria ficou para 2021.

“Nas últimas semanas trabalhei para construir um texto de consenso que ajude o Brasil a solucionar os graves problemas que enfrenta. Consultei o Governo, líderes do Congresso e parlamentares. Em vista da complexidade das medidas, bem como da atual conjuntura do país, decidi não mais apresentar o relatório da PEC Emergencial em 2020", afirmou Bittar em nota divulgada nesta sexta-feira (11). "Creio que a proposta será melhor debatida no ano que vem, tão logo o Congresso Nacional retome suas atividades e o momento político se mostre mais adequado”, completou.

O relatório divulgado por Bittar aos líderes do Senado, na noite de terça-feira (ver documento ao fim desta reportagem), não traz uma das principais medidas de contenção de gastos: a possibilidade de reduzir em 25% a jornada e o salário dos servidores públicos que atuam em serviços não essenciais. A redução estava na proposta original, elaborada pelo governo. Ela garantiria uma economia para a União de R$ 7 bilhões a R$ 10 bilhões em 12 meses, segundo informações do Ministério da Economia.

No parecer preliminar, Bittar também retirou outras medidas de contenção de gastos obrigatórios, como a proibição de progressão automática de carreiras, de modo a reduzir a economia total esperada com a PEC. O texto original do governo previa economia total de cerca de R$ 25 bilhões, sendo R$ 12 bilhões no primeiro ano. Já o substitutivo traria uma economia de apenas R$ 450 milhões no primeiro ano, segundo o jornal "O Estado de S. Paulo".

O relator também não unificou na PEC Emergencial medidas que estavam na PEC do Pacto Federativo. Entre elas, a proposta de unificar os valores mínimos a serem gastos com saúde e educação, permitindo que cada ente faça o manejo dos recursos como achar melhor.

Guedes queria, ainda, que o relator fosse além e tirasse o que ele chama de amarras do Orçamento: vinculações (recursos carimbados), indexações (reajustes automáticos) e obrigações (mínimos constitucionais). Bittar até chegou a dar declarações a favor da ideia do ministro, mas reconheceu que elas não teriam apoio no Congresso.

A PEC Emergencial era a principal aposta da equipe econômica para abrir espaço no Orçamento. Ela foi enviada ao Senado em novembro de 2019, mas praticamente não tramitou. Uma tentativa de desengavetá-la foi feita neste segundo semestre, mas não prosperou.

O que ficou no relatório

  1. Contenção de gastos obrigatórios

Bittar manteve no parecer preliminar o acionamento de gatilhos de contenção de gastos sempre que as despesas da União, estados e municípios saiam do controle. O teto de gastos (que limita o crescimento das despesas do governo federal) já prevê a adoção de gatilhos, mas a lei que criou a regra deixou de fora exatamente qual deveria ser o parâmetro que acionaria as medidas.

Pelo relatório, os gatilhos seriam acionados automaticamente quando as despesas correntes consumissem 95% ou mais das receitas. No caso de estados e municípios, se o percentual chegasse a 85%, as medidas de contenção de gastos já poderiam ser adotadas, desde que aprovadas via projeto de lei pelas assembleias locais.

Esses gatilhos vedavam:

  • aumento e reajustes de salário de servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior ao início da aplicação das medidas;
  • criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;
  • alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
  • admissão ou contratação de pessoal, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos vitalícios e as contratações temporárias para prestação de serviço militar;
  • realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias que não gerem custos ou que sejam urgentes;
  • criação ou aumento de auxílios/vantagens/bônus a servidores;
  • criação de despesa obrigatória de caráter continuado, exceto em casos de calamidade pública; e
  • reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação.

Para a União, o acionamento desses gatilhos traria duas vantagens. A primeira é liberar espaço orçamentário para novas despesas, como investimentos e programas sociais. A segunda seria ajudar a garantir o cumprimento do teto de gastos em 2021.

2. Extinção de fundos públicos

O substitutivo que seria apresentado por Bittar também incorporava à PEC Emergencial as medidas da PEC dos Fundos Públicos. Com isso, a proposta extinguiria fundos infraconstitucionais que não sejam ratificados pelo Congresso até o fim do ano subsequente à aprovação da emenda. As exceções seriam seis fundos, entre ele os da Segurança Pública (FNSP), Penitenciário (Funpen) e da Cultura (FNC). Os fundos constitucionais e privados também não seriam atingidos.

O dinheiro parado nos fundos extintos poderia ser usado livremente pelo governo, mas dentro do limite do teto de gastos. Uma versão inicial, escrita por Bittar e vazada à imprensa na segunda-feira (7), permitia o uso fora do teto de gastos por um ano.

A ideia foi criticada pelo mercado e rechaçada pela equipe econômica, então Bittar retirou esse artigo “fura-teto” na nova versão, apresentada aos líderes do Senado na terça (8). A proposta inicial da equipe econômica previa que os valores seriam destinados para abater a dívida pública, justamente para evitar essas dubiedades.

As receitas vinculadas (que originalmente iriam para os fundos extintos) teriam outras vinculações. Elas teriam de ser destinadas obrigatoriamente para:

  • projetos e programas voltados à erradicação da pobreza;
  • investimentos em infraestrutura que visem a reconstrução nacional, com prioridade à implantação e conclusão de rodovias e ferrovias, além da interiorização de gás natural produzido no Brasil;
  • projetos e programas voltados à segurança de regiões de fronteira;
  • revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco;
  • e projetos de pesquisa e Desenvolvimento Científico, Tecnológico e Inovação.

3. Redução de subsídios

O relatório preliminar de Bittar também previa a redução de subsídios e incentivos tributários destinados a empresas e setores da economia. O texto obrigava a União a encaminhar, em até 90 dias após a publicação da emenda, projeto de lei prevendo:

  • redução imediata de, pelo menos, 10% dos incentivos e benefícios tributários vigentes; e
  • plano de redução para que os subsídios não ultrapassem 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em até cinco anos.

Porém, numa redação dúbia, sem proibir as reduções, mas as desincentivando, o texto diz que não vão contar para atingimento da meta eventuais reduções nos seguintes subsídios/incentivos:

  • Simples Nacional;
  • Isenções tributárias para entidades beneficentes, filantrópicas e sem fins lucrativos;
  • Subsídios ligados à função de desenvolvimento regional;
  • Zona Franca de Manaus; e
  • Desoneração da cesta básica.

VEJA TAMBÉM:

Use este espaço apenas para a comunicação de erros