Os efeitos da retração do mercado de caminhões estão se espalhando pela cadeia produtiva do setor. De um lado, a freada nas linhas de montagem se reflete em queda nas encomendas para as empresas que fornecem peças e componentes às montadoras. Na outra ponta, a redução nas vendas desses veículos diminui a demanda por implementos rodoviários reboques e outros equipamentos acoplados aos caminhões.
Além de hospedar a montadora Volvo, o Paraná tem empresas em vários pontos dessa cadeia. Algumas ainda conseguem elevar produção e vendas, mas a maioria das consultadas pela Gazeta do Povo diz estar faturando menos que no ano passado. As horas extras, frequentes em 2011, desapareceram.
As medidas de estímulo anunciadas a partir de abril pelo governo queda dos juros e ampliação dos prazos da linha Finame, do BNDES são elogiadas, mas na maior parte dos casos inspiram apenas um otimismo moderado entre empresários e executivos do setor.
Fornecedora de algumas das maiores montadoras do país, a curitibana Ibratec reduziu sua produção pela metade neste ano. Sem abrir números, revela que já teve de dispensar funcionários. "Se fizermos uma fotografia do que acontece hoje e projetá-la no futuro, poderemos fechar o ano com queda 40% no faturamento", conta Dorival Soares, diretor de produção da empresa, que produz peças usinadas para suspensão, motor e cabine de caminhões.
Na MVC Soluções em Plásticos, de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), a retração foi ainda mais forte. "Nos últimos cinco meses produzimos para algumas empresas o mesmo volume de peças que, no ano passado, produzíamos em um mês", conta o diretor-geral, Gilmar Lima. Em 2011, a produção de componentes para caminhões respondeu por 20% das receitas da empresa; neste ano, a fatia deve cair para 10%. Parte dos 200 funcionários dessa linha foi deslocada para outras áreas da empresa, que estão crescendo.
Os fabricantes de implementos rodoviários, que no ano passado celebravam recordes, agora enfrentam uma redução média de 7% nas vendas para o mercado interno, segundo dados nacionais da Anfir (representante do setor) referentes ao período entre 1.º de janeiro e 28 de maio.
A situação varia conforme a empresa e seu nicho de atuação. Na Metalesp, de Rio Branco do Sul (RMC), as vendas de equipamentos do tipo silo e tanque caíram 20% no primeiro trimestre. "É o pior cenário dos últimos cinco anos", lamenta João Manuel de Carvalho Cardoso, gerente de vendas e marketing. Segundo ele, a negociação de preços com fornecedores ajudou a baratear os implementos, mas nem isso reverteu a baixa nas vendas. "Toda vez que havia alguma redução de juros, a melhora no mercado era percebida imediatamente. Não é o que acontece hoje", diz Cardoso.
A contração da indústria de implementos se reproduz em seus fornecedores. A Aesa, que produz molas e acessórios em Cambé (Norte do estado), informa que as vendas para o setor caíram 30% no primeiro quadrimestre. "De tudo o que produzimos, 40% vai para as fábricas de implementos", conta André Bearzi, diretor comercial. "Evitamos ao máximo dispensar funcionários, mas, se não houver alguma recuperação nos próximos meses, existe essa possibilidade."
Colaborou Dilvo Rodrigues, especial para a Gazeta do Povo.
Taxa de juros caiu, mas efeito é incerto
Após sofrer duas reduções em dois meses, a taxa de juros do financiamento de caminhões e implementos rodoviários caiu para 5,5% ao ano na semana retrasada. A nova taxa é equivalente à inflação anual, o que significa que o juro real da operação é próximo de zero. Ao mesmo tempo, os prazos máximos de pagamento foram estendidos para 120 meses. Pelas condições do programa Finame/BNDES, responsável por 85% das vendas de veículos comerciais pesados, empresas poderão financiar até 90% do bem e autônomos, 100%.
As novidades foram bem recebidas, mas há dúvidas sobre o tamanho da recuperação que elas podem estimular. "Medidas assim foram testadas anteriormente e tiveram o efeito esperado. Mas não sabemos classificar a intensidade com que elas vão chegar ao mercado desta vez, e se a velocidade da retomada será suficiente para salvar o ano", diz Alcides Braga, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Implementos Rodoviários (Anfir).
Contribuem para essa desconfiança o encarecimento dos caminhões, as dúvidas quanto à oferta do diesel S50 e, principalmente, o fato de que os bancos comerciais que repassam os recursos do BNDES estão mais seletivos, o que prejudica principalmente os caminhoneiros autônomos, donos de 46% da frota nacional de caminhões. Foi por dificuldades na aprovação de crédito, diz Braga, que em seis anos a linha BNDES Procaminhoneiro conseguiu renovar apenas 3% da frota.
Estica-e-puxa
Para o executivo, a atuação do governo peca pela falta de continuidade. As últimas mudanças do Finame, lembra, fazem parte da "quarta versão" do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), lançado em meados de 2009. "Não deveríamos estar no PSI 4, e sim no PSI 1. O que o governo tem feito é lançar o programa, o mercado reagir e, no auge da reação, o governo ir lá e encerrar o programa, para esfriar a economia. É um esquenta-esfria, um estica-e-puxa muito ruim para o comprador e a indústria, que não conseguem se planejar", diz Braga. "Não é diferente agora, uma vez que o governo marcou para 31 de agosto o fim deste novo plano."