Opinião
Para quem trabalha o governo? Para o marketing das montadoras?
"A desoneração termina este mês. Se você está pensando em adquirir um automóvel, aproveite a oportunidade, porque os preços ainda estão reduzidos."
Quem falou isso foi o ministro Guido Mantega, em junho de 2009. Ele se referia à redução de IPI para os automóveis: naquele ano, para combater uma crise e dar fôlego à indústria nacional, o governo havia concedido esse benefício às montadoras e a alguns outros setores escolhidos. Exatamente como fez este ano.
Uma semana depois de proferir a tal frase, Mantega assinou uma medida prorrogando o benefício. Ao que tudo indica, fará o mesmo este ano. Em 2012, ao menos, ficou de boca fechada.
Fechada até demais, para dizer a verdade. Ao adiar a divulgação de uma informação dessa importância, o ministro está servindo a quem, afinal? Ao cidadão brasileiro ou ao marketing das montadoras?
Não é à toa que os teóricos costumam destacar a importância da transparência para o ambiente econômico. Para tomar uma boa decisão é preciso levar em conta o maior número de fatores possível. É possível que muitos brasileiros estejam hoje fazendo contas para saber quanto dinheiro têm disponível para comprar um carro. Eles merecem o direito de saber se precisam mesmo fechar negócio agora para garantir um preço melhor, ou se terão mais 60 dias para dar uma entrada maior e, talvez, pagar menos juros.
É essa informação que o governo está sonegando.
Franco Iacomini, editor de Economia
O governo parece decidido a ampliar por mais dois meses a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). O benefício fiscal está em vigor desde maio deste ano e, em tese, expira no dia 31 de agosto, próxima sexta-feira. Trabalhando com esse prazo, as montadoras programaram feirões para este fim de semana, com o objetivo de transformar agosto de 2012 no melhor mês de vendas da história.
Oficialmente, o martelo será batido somente na próxima semana, depois de um encontro entre representantes da indústria de automóveis e o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Na reunião, o ministro deve receber informações do segmento sobre preços, emprego e de produção das montadoras no período do IPI reduzido. É bem possível, entretanto, que esse evento sirva apenas para sacramentar uma decisão já tomada, que não foi divulgada antes para evitar prejuízos para as vendas no fim de semana.
Entre os integrantes do governo, a tese majoritária é que a prorrogação é necessária para estimular e acelerar a atividade econômica nos últimos meses do ano. A avaliação da equipe do governo é que, apesar do recorde de vendas em julho (364 mil unidades), o setor ainda mantém estoque elevados e, retirar a medida agora poderia levar a um retrocesso, com impactos negativos nos empregos.
De acordo com dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), com o IPI reduzido, as vendas diárias subiram de 12 mil em maio para 16 mil em agosto. No mês passado, a medida foi bastante questionada, depois que a GM anunciou que demitiria funcionários em uma das fábricas de São José dos Campos. A notícia irritou a presidente Dilma Rousseff, que cobrou como contrapartida a manutenção dos empregos. Depois de intensas reuniões entre representantes da empresa, do governo (Ministérios da Fazenda e do Trabalho) e o Sindicato dos trabalhadores no local, as demissões foram adiadas.
Críticas
O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel fez críticas duras à adoção e às prorrogações de medidas de desoneração fiscal pelo governo, entre elas a redução do IPI para veículos e produtos da linha branca. "A prorrogação de medidas de desoneração fiscal é inadministrável", disse. "Essa insegurança na alíquota do IPI afeta dramaticamente o mercado e produz uma insegurança enorme, em função estritamente de uma preocupação com as metas e com o PIB."
Na avaliação de Maciel, o governo precisa adotar uma política de medidas tributárias estáveis, mesmo que não haja a desoneração para incentivar o consumo. "Tem de ter regras mais estáveis para que haja ou não uma redução permanente. Regras instáveis só em circunstâncias especialíssimas", afirmou.
"Você compraria um carro quando a alíquota do IPI subisse ou aguardaria que ela caísse?", indagou. "Ninguém sabe o que deve ser feito. Nem os quem têm (para vender) nem os que compram. O mercado de carros usados está parado", ressaltou.
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