Em meio a um aumento de incertezas no mundo e ao maior protecionismo dos Estados Unidos sob a presidência de Donald Trump, o brasileiro Roberto Azevêdo foi confirmado formalmente na terça-feira (28) para um segundo mandato de quatro anos à frente da Organização Mundial do Comércio (OMC). Ele foi candidato único à reeleição de diretor-geral e teve o nome aprovado em reunião do Conselho Geral da OMC pelos 164 países-membros.
Em entrevista ao jornal O Globo por e-mail, o embaixador se mostrou cauteloso para avaliar a política comercial dos EUA, mas afirmou que a OMC está aberta ao diálogo com o país, que chamou de importante membro da organização.
A preocupação com o avanço do protecionismo e com as ações do governo Trump na área de comércio internacional marcou a reunião que decidiu reeleger Azevêdo. Mais de 20 países fizeram perguntas durante a sabatina do embaixador, na última segunda-feira (27) . A China foi uma das nações que citaram o temor com medidas protecionistas, enquanto os Estados Unidos perguntaram sobre comércio desleal.
Em seu discurso aos países-membros, ele afirmou que a OMC é mais forte hoje que há quatro anos, mas foi claro em reconhecer o que chamou de “tempos desafiadores”, citando o baixo crescimento econômico, a ameaça do protecionismo e a persistência de questões como pobreza e desigualdade.
Confira, abaixo, a entrevista da Roberto Azevêdo ao jornal O Globo:
Qual é o significado de sua eleição a partir de uma candidatura única? Isso traz mais força para seu segundo mandato?
Quando fui candidato em 2012, havia nove nomes no páreo. Desta vez, fui candidato único. Quero acreditar que isso seja um reconhecimento das conquistas da OMC nos últimos três anos e meio. No período, obtivemos resultados expressivos, entre eles o primeiro acordo global da OMC — o Acordo de Facilitação do Comércio —, e a maior reforma do comércio agrícola em décadas. Para o segundo mandato, há muitos desafios, e, nesse contexto, a forma rápida e descomplicada com que ocorreu esta eleição por consenso certamente ajuda. Os membros da OMC precisam estar unidos em defesa da organização, do comércio e da cooperação internacional.
Reportagem do Financial Times relatou esta semana que os EUA, sob comando de Trump, estudam medidas legais que possam ser adotadas como alternativa às disputas comerciais travadas na OMC. Qual é o risco para o comércio mundial se isso for à frente?
Prefiro não especular sobre qual será a política comercial da nova administração nos Estados Unidos. A própria Casa Branca disse que se deve aguardar a equipe ser formada, para que possam falar sobre política comercial. De forma geral, é importante lembrar que a OMC foi criada justamente para que os países possam discutir suas diferenças de maneira transparente e previsível, de acordo com regras acordadas por todos. A Organização possui diversas ferramentas para que os países lidem com suas preocupações comerciais. Todos os países têm interesse em usar o comércio para promover emprego e crescimento, ninguém é a favor do comércio desleal — e a OMC oferece os instrumentos para que os países lidem com essas preocupações. A OMC está plenamente aberta para o diálogo com os EUA, que são um importante membro da Organização.
O senhor afirmou, no fim do ano passado, que há menos tolerância a importações com preços muito baixos, mas que ainda não havia política de fechamento de fronteiras em nenhum dos mercados centrais. O cenário mudou no ano de 2017?
Seguimos monitorando de perto a situação do comércio mundial. No pós-crise de 2008, o crescimento do comércio, de forma geral, tem sido baixo. Por enquanto, o caráter modesto da expansão comercial não tem o protecionismo como causa. A economia mundial é que está crescendo pouco. No entanto, se o discurso anticomércio começar a se traduzir em barreiras, é provável que isso se reflita nos números gerais do comércio. Como sabemos, barreiras comerciais se espalham rapidamente. A ameaça de efeito dominó é real. É importante evitar que isso ocorra porque as consequências são graves, e porque reverter barreiras protecionistas tende a ser muito difícil.
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