A surpreendente decisão do governo de enviar ao Congresso uma proposta de Orçamento que prevê mais gastos que receitas, algo inédito na história brasileira, empurrou a nota de crédito do Brasil para a zona de rebaixamento. Para economistas, o fato de o Executivo admitir que não consegue fechar suas contas – e que, portanto, a dívida pública crescerá ainda mais rápido que o esperado – representa um passo decisivo rumo à perda do grau de investimento, espécie de selo de bom pagador que o país ostenta desde 2008.
Sabe-se que as agências de rating perderam credibilidade após o estouro da bolha imobiliária norte-americana, e também que a decisão de investir no Brasil não depende apenas do “cadastro positivo”. Mas regredir à condição de aplicação especulativa após sete anos certamente não melhora as coisas e pode adiar o início de uma recuperação da economia.
Há quem preveja a queda para 2016, como o banco JP Morgan e a gestora Franklin Templeton. Há quem diga, como o especialista em finanças públicas Mansueto Almeida, que o Brasil só não caiu até agora porque as agências “reagem com extrema lentidão”. Mas a Fitch – uma das três grandes, ao lado de Standard & Poor’s e Moody’s – deu a dica dias atrás, quando uma analista avisou que a tendência para o cenário fiscal ficou “muito abaixo” das condições que, em abril, levaram a agência a revisar de “estável” para “negativa” a perspectiva da nota brasileira.
Reflexos
A seu modo, o mercado financeiro se antecipa. Os reflexos aparecem na queda dos preços das ações, na alta dos juros dos títulos públicos e na disparada da taxa de câmbio. Captar dinheiro lá fora está ficando mais caro, para o governo e para as empresas. O prêmio do Credit Default Swap (CDS) brasileiro, uma espécie de seguro contra calote, chegou a 360 pontos-base no início da semana, o maior nível desde 2009. Para países com o mesmo rating do Brasil, o prêmio é de menos da metade. Também saem mais baratos os títulos de países sem grau de investimento, como Turquia, Indonésia, Croácia e Hungria.
“A perda do rating seria apenas a cereja de um bolo que está se desmanchando”, diz o economista Thiago Biscuola, da RC Consultores. Mesmo assim, é muito provável que a situação piore um pouco se a nota for cortada, avalia: “A partir do momento em que se perde o grau, há uma pressão adicional”.
Para Claudio Felisoni, presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo e Mercado de Consumo (Ibevar), a retirada do selo de qualidade criaria a convicção de que a crise será ainda mais longa. “A perda não modificaria substancialmente o quadro atual, mas afastaria ainda mais o investidor, com efeito sobre o investimento produtivo, o que no futuro teria consequências sobre PIB, emprego, nível de produtividade, salários”, diz.
O relator do Orçamento, o deputado federal paranaense Ricardo Barros (PP), disse na tribuna da Câmara na quarta-feira (2) que o eventual rebaixamento custará muito mais caro para as empresas que um aumento da carga tributária –referência à tentativa de ressurreição da CPMF.