No ano em que se comemoram os 200 anos de nascimento do cientista britânico Charles Darwin e os 150 anos de sua obra-prima, "A origem das espécies", o economista norte-americano Robert H. Frank defende que as idéias do naturalista se aplicam mais apropriadamente à economia do que as teorias de Adam Smith, "pai" da teoria econômica clássica.
Economista, autor de livros e professor da Cornell University (EUA), Frank contesta o conceito da "mão invisível" de Smith e diz que o que beneficia um indivíduo não necessariamente beneficia toda a sociedade.
Crítico da intervenção estatal na economia, Smith defendia que, em um ambiente de livre concorrência, o bem-estar coletivo é decorrência da harmonização dos interesses dos indivíduos por meio da "mão invisível" do mercado.
Para Robert H. Franck, a teoria da seleção natural de Darwin, além de ajudar a explicar a crise financeira enfrentada desde o ano passado, pode apontar saídas para os governos das economias prejudicadas.
"A competição favorece qualidades e comportamentos de acordo com a maneira que eles afetam o sucesso de indivíduos, não de espécies ou de grupos", escreveu o economista em artigo publicado no jornal "The New York Times".
Leia trechos da entrevista:
O sr. defende que a teoria da seleção natural, de Darwin, pode ser aplicada à economia. Como isso pode acontecer exatamente?
Coisas que beneficiam uma pessoa não necessariamente beneficiam a coletividade. A idéia da "mão invisível", de Adam Smith, sugere que o que é positivo para o indivíduo também é para a sociedade. Mas Smith não disse exatamente isso. Seus discípulos modernos é que afirmam que ele pregava a coincidência entre interesses individuais e coletivos. Darwin, com os princípios da competição e da seleção natural, mostrou que esses interesses nem sempre são os mesmos às vezes sim, outras não.
Como isso funciona na prática?
Um exemplo é o dos produtores industriais que querem baratear seus preços. Um jeito é tirar o filtro da chaminé das fábricas - é mais barato produzir sem filtro do que comprar um. Os concorrentes copiam a idéia porque também precisam de preços mais baixos. Todos conseguem preços menores, mas o ar fica muito poluído. É uma situação pior do que se todos tivessem filtros em suas chaminés e os preços fossem apenas um pouco maiores.
Mas há exemplos ainda mais cotidianos. Você quer que seus filhos tenham uma educação acima da média. Então, todos trabalham mais para pagar por escolas melhores para os filhos. Mas quando todos gastam 20% a mais para pagar pela escola, todos ficam na mesma situação. Então, as pessoas trabalham mais horas ou pegam turnos extras ou novos empregos. Nesse caso, a mão invisível não leva ao melhor resultado, mas à pior consequência.
O sr. acha que esse é um fenômeno contemporâneo ou poderia ser relacionado à economia de cem anos atrás?
Nada sobre a economia mudou [de cem anos para cá], mas a competição aumentou muito. Então, se você acredita na versão inocente da mão invisível, o resultado deveria ser cada vez melhor. Mas quando o ambiente fica mais competitivo na versão darwiniana, o resultado pode ser cada vez pior. Por exemplo: quanto maior é a competição entre os alces machos na busca por parceiras, mais os chifres deles crescem. Isso é ruim para eles, como um grupo, porque eles ficam mais fáceis de serem capturados. Já a boa visão de uma águia é um bom exemplo do que o que é bom para o indivíduo também é bom para o grupo. Pode acontecer dos dois jeitos.
O sr. diria que as idéias de Darwin, aplicadas à economia, podem explicar a crise financeira internacional que começou no ano passado?
Eu diria que sim. Os investimentos mais arriscados ficaram cada vez mais populares porque as pessoas queriam ganhar mais, e as pessoas estavam dispostas a investir neles porque seus vizinhos investiam e eles queriam tanto dinheiro quanto os vizinhos. Todos investiram no risco, e todos perderam.
E como a teoria pode ajudar a encontrar uma saída para a crise?
O que a teoria pode ajudar a entender é o porquê da necessidade de regular o mercado. Pela mão invisível, não há essa necessidade. Mas se você observa a teoria da seleção natural de Darwin você consegue compreender a importância da regulação. Os governos não deveriam supor que tudo vai dar certo automaticamente.