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Preço do dinheiro

De olho nos EUA, BC define juros com crise de bancos lá fora, PIB freando e inflação alta

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto: mercado prevê manutenção da taxa Selic, apesar de pressão de Lula e do PT por queda dos juros. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central define no início da noite desta quarta-feira (22) a taxa básica de juros (Selic), de olho no comportamento do Fed, o banco central dos Estados Unidos, que horas antes decidirá se continua ou não com seu ciclo de aperto monetário.

Por aqui, em meio a um cenário dos mais complexos, a expectativa da maior parte do mercado financeiro é de que a Selic seja mantida em 13,75% ao ano. Ao que parece, não surtirá efeito a pressão por redução dos juros feita desde o início do ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por parte de seu governo e também pelo seu partido – que convocou protestos nesta terça (21) pela saída do presidente do BC, Roberto Campos Neto.

A decisão do BC norte-americano é relevante porque afeta o fluxo do dinheiro no mundo. Se continuar elevando os juros, os EUA tendem a atrair investimentos (em títulos do Tesouro, por exemplo), estimulando a saída de recursos de países como o Brasil. Essa migração empurra para cima a cotação do dólar, o que por sua vez pressiona inflação e juros aqui.

Analistas apontam que a decisão desta quarta-feira é mais complexa que o habitual, para os BCs dos EUA e do Brasil, devido a uma série de fatores:

  • nos EUA, três bancos entraram em colapso nas últimas duas semanas e um quarto recebeu auxílio de grandes instituições financeiras locais. No Brasil, há os rescaldos do caso Americanas e um aperto no mercado de crédito;
  • o mercado de trabalho norte-americano continua aquecido. As contratações não agrícolas vieram acima das expectativas no primeiro bimestre do ano, o que significa manutenção das pressões sobre a inflação;
  • a inflação segue acima das metas nos EUA e no Brasil; e
  • no Brasil, o saldo do emprego formal ainda é positivo, mas declinante, em linha com a desaceleração da atividade econômica observada desde o fim de 2022.

Tanto Fed quanto Copom devem olhar o cenário com maior cautela. Parte dos efeitos potenciais desse cenário são recessivos e, de alguma forma, podem a ajudar a combater a inflação.

A alta nos preços é, justamente, o maior foco de atenção das autoridades monetárias. Na maior economia global, o objetivo final do Fed é uma inflação de 2% ao ano. Na última apuração, divulgada no dia 14 pelo US Bureau of Labor Statistics, a inflação acumulada em 12 meses até fevereiro estava em 6%.

No Brasil, para uma meta fixada em 3,25%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto porcentual, a inflação em 12 meses até fevereiro era de 5,6%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Mesmo para prazos mais longos, as expectativas de inflação não estão acomodadas. O boletim Focus, do BC, mostrou nesta segunda (20) um aumento nas projeções para a alta nos preços em 2024, de 4,02% para 4,11%. O teto da meta do ano que vem, de 4,5%, está ficando cada vez mais próximo. Também piorou o cenário para 2025 e 2026.

Quem já tomou uma decisão em relação ao dilema entre preços e situação do sistema financeiro foi a zona do euro. Em meio à derrocada do banco Credit Suisse, que no fim de semana acabou sendo adquirido pelo UBS, a estratégia do Banco Central Europeu (BCE) foi a de priorizar o combate à inflação. Na quinta-feira (16), a instituição elevou o juro básico em meio ponto porcentual. “Não há escolha entre estabilidade financeira e inflação”, enfatizou Christine Lagarde, presidente do BCE.

Sinalização de manutenção da Selic no Brasil

As expectativas para o Brasil, segundo levantamento do boletim Focus, indicam que o Copom deve manter a taxa Selic em 13,75% ao ano nas próximas duas reuniões – a que se encerra nesta quarta e a do início de maio.

A expectativa da economista-chefe do banco Inter, Rafaela Vitória, é de que, na reunião, o Banco Central indique uma mudança no balanço de riscos para a inflação, o que abre espaço para o início do corte nos juros antes do esperado.

“O cenário à frente será de desaceleração da atividade. A elevação de juros em vários países vem resultando em aumento do risco de recessão. A maior cautela por parte de investidores e bancos deve reduzir a oferta de crédito”, destaca a economista do Inter.

O Itaú é mais cauteloso. “O comitê deve sinalizar que ainda vê riscos simétricos para a inflação”, apontam analistas em relatório.

Segundo eles, o Copom deve mencionar que vai continuar acompanhando “com serenidade e atenção” os desenvolvimentos futuros da política fiscal, com atenção para a evolução do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais que implicam sustentação da demanda agregada e, adicionalmente, os impactos dos episódios de crédito corporativo recentes.

Em relação ao cenário externo, o banco avalia que o BC vai continuar monitorando os desdobramentos dos eventos bancários (colapso do SVB e crise do Credit Suisse) com “serenidade” e acompanhando seus efeitos nos preços de ativos e atividade global.

Os cenários para queda futura na taxa Selic

A XP Investimentos espera manutenção da taxa em 13,75% nesta reunião e que o comunicado pós-decisão deixe as “portas abertas” para a frente. Economistas da corretora, entretanto, consideram a possibilidade de que cortes ocorram antes do fim do ano, a depender da evolução dos choques financeiros e da forma como o Copom optará por administrar o balanço entre a desaceleração da atividade e convergência da inflação às metas.

O banco Inter reviu sua expectativa para o início do ciclo de cortes na taxa Selic, atualmente em 13,75%, de agosto para junho. O argumento do banco é de que o aperto no cenário de credito e a redução do risco fiscal, com a apresentação do novo arcabouço, deve possibilitar uma antecipação da redução no juro.

O Inter também considera que os recentes eventos globais – o colapso de três instituições financeiras nos EUA, o socorro a uma quarta e a crise no Credit Suisse – também aumentaram o risco de uma recessão, refletido na queda no preço das commodities, o que pode contribuir para uma desinflação.

Para o economista Sílvio Campos Neto, sócio da Tendências Consultoria, uma eventual sinalização para o início da queda dos juros deve ocorrer apenas na reunião de maio. “O Copom vai aguardar ter mais informações sobre o cenário. O momento é de análise do balanço de riscos”, diz.

Outra questão a que o comitê ficará atento é o desdobramento da apresentação das novas regras fiscais. Segundo o economista, é preciso ver se elas serão confiáveis e como ocorrerá a tramitação no Congresso.

“A bola está com o Executivo”, diz o economista-chefe da Porto Asset Management, José Pena. Ele destaca que uma proposta robusta abriria espaço para valorização da moeda brasileira frente ao dólar, o que possibilitaria a queda das commodities em reais e ajudaria a levar a inflação para baixo.

Segundo Pena, uma série de dados deverá ser analisada pelo Copom antes de tomar uma decisão. De um lado, a inflação não permite cortes na taxa Selic, devido ao comportamento dos dados correntes e das expectativas. Por outro lado, a atividade econômica já está se desacelerando, em função da alta no custo do dinheiro. “E no meio está a questão externa, que forma uma parte relevante da inflação doméstica", diz.

A BlueLine Asset Management aponta que a decisão do Copom nesta semana está cercada de pressões políticas para um corte na Selic, que ainda não é autorizado pelos fundamentos da inflação.

O C6 Bank não acredita em redução dos juros neste ano. A equipe de economia do banco avalia que o BC irá manter a Selic em 13,75% até que as expectativas de inflação estejam ancoradas e que a inflação prospectiva nos modelos do BC esteja na meta. “Ele deve deixar claro que só vai cortar juros depois que essas duas condições forem atingidas”, escrevem os analistas em relatório.

A Suno Research, mais otimista, acredita que os juros começam a cair em agosto. “Analistas de mercado começam a precificar quedas em maio ou junho, mas acreditamos que a tramitação da nova âncora fiscal não deverá ser tão rápida, o que retarda qualquer corte. E a reforma tributária tende a ser votada no segundo semestre", diz o economista-chefe, Gustavo Sung.

A situação nos Estados Unidos

Sobre a decisão da taxa de juros dos EUA, Sung avalia que o pico da inflação, tanto lá quanto na zona do euro, parece ter ficado para trás.

“Porém, ela continua em patamares elevados, principalmente os preços de serviços. Esse é um fator preocupante. Os dados não dão sinais claros de convergência para as metas de longo prazo, o que dificulta os trabalhos dos BCs”, afirma.

Para o economista, apesar dos episódios recentes envolvendo o banco SVB, nos Estados Unidos, e o Credit Suisse, na Suíça, a expectativa é de que os juros continuem subindo. “Ainda é cedo para compreender o verdadeiro tamanho do problema e, portanto, não deve influenciar nas decisões de juros no curtíssimo prazo”, diz. A expectativa dele é de uma alta de 0,25 ponto percentual no juro norte-americano.

Vitória, do Inter, avalia que o Fed tem uma decisão difícil pela frente, já que a crise bancária é um risco e é provável que o mercado de crédito sofra um aperto adicional nesse cenário de maior aversão a risco.

“A autoridade monetária americana pode optar por uma pausa para avaliar a evolução no cenário de liquidez e retomar o ciclo de alta em maio, ou pode considerar que os instrumentos para fornecer liquidez não interferem na trajetória da inflação e ainda é necessário elevar os juros, conforme antecipado”, diz a economista.

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