O que você acha de ter seus dados vendidos na internet para quem tiver interesse em obtê-los? Esse serviço existe e está sendo alvo de polêmica nas últimas semanas por conta da atuação do site Tudo Sobre Todos, que comercializa informações como CPF, RG, nome de parentes e até de vizinhos. A dúvida é: como se proteger desse tipo de exposição? É possível remover as informações destes bancos de dados ou impedir a sua comercialização?
A resposta é difícil. Na prática, os dados já estão na rede e tirá-los da internet é praticamente impossível. “A essa altura, a maioria das informações já está disponível em diversos lugares. O uso e a comercialização delas é ilegal, mas tirá-las de lá é chorar pelo leite derramado. A recomendação é evitar disponibilizar dados sobre você na internet”, orienta Demi Getschko, diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).
No ar desde junho, o Tudo Sobre Todos oferece a partir de uma simples pesquisa com o nome dados como data de nascimento, bairro e endereço localizado em um mapa. Em alguns casos, as informações podem estar desatualizadas. Caso contrário, até o nome dos vizinhos, parentes, local de trabalho e empresas de propriedade da pessoa aparecem.
A essa altura a maioria das informações já estão disponíveis em diversos lugares. O uso e a comercialização deles é ilegal, mas tirá-los de lá é chorar pelo leite derramado.
Para ter acesso detalhado às informações no site, o interessado precisa pagar. Os pagamentos são feitos através da moeda virtual bitcoin. Cada crédito custa R$ 0,99 e representa um bitcoin. Os créditos valem por três meses e são descontados a partir das buscas feitas no site.
Embora esteja em português e localize informações de cidadãos brasileiros, a página tem domínio sueco e o servidor está localizado na França. Na descrição, o site afirma que a empresa Top Documents LLC é a responsável por sua operação. A empresa é sediada em Sychelles, país formado por ilhas no Oceano Pacífico.
Dificuldade
As diferentes localizações servem justamente para tentar dificultar a ação da Justiça brasileira caso seja determinada a ilegalidade da comercialização de dados. “Tratando-se de servidor internacional, sem sede no Brasil, nossas leis nada podem fazer, sendo que resta somente a expedição de uma carta-rogatória da Justiça brasileira, o que é um procedimento extremamente demorado”, afirma o perito digital José Antonio Milagre, vice-presidente da Comissão Estadual de Informática da OAB-SP.
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Leia a matéria completaA Justiça Federal do Rio Grande do Norte determinou na última quinta-feira (30) a retirada do ar do Tudo Sobre Todos. A decisão em caráter de liminar foi deferida após uma abertura de procedimento do Ministério Público Federal do estado. Como a decisão é provisória, o juiz federal Magnus Augusto Costa Delgado determinou ainda que os provedores brasileiros criem obstáculos para dificultar o acesso à página até que o processo seja julgado em definitivo.
O despacho de abertura da investigação, de autoria do procurador da República Kléber Martins, afirma que “é óbvio que a existência de tal banco de dados, em princípio, representa uma violação às cláusulas constitucionais da inviolabilidade da intimidade, da vida privada e dos dados das pessoas, que só podem ser excepcionadas, nas hipóteses legais, para que o Estado investigue e puna a prática de crimes”. Até o fechamento desta reportagem o site ainda permanecia no ar.
Outro lado
O responsável pelo Tudo Sobre Todos, que não quis se identificar, reforça que sua empresa divulga apenas informações públicas. “Uma boa parte dos dados vem de cartórios”, diz. Entre as outras fontes de dados estariam também “decisões judiciais publicadas, diários oficiais, foros, bureaus de informação, redes sociais e consultas em sites públicos na internet”. O representante da página evitou dar mais detalhes e explicou que a “metodologia exata [de coleta de dados] não é revelada por se tratar de ser um segredo da empresa”.
Proteja-se
A venda de dados pessoais é ilegal e pode causar uma série de problemas para os internautas. Veja três dicas de especialistas para se proteger:
Não divulgue muitas informações na internet
“As pessoas devem ter um cuidado especial com a revelação de dados pessoais e sites, lojas virtuais e redes sociais. Existem empresas e criminosos especializados em crawlear (capturar) conteúdos pessoais de redes sociais e sites, para fins de aplicação de fraudes, golpes e abertura de contas”, afirma José Antonio Milagre, vice-presidente da Comissão Estadual de Informática da OAB-SP.
Questione a necessidade de passar alguns dados
“Há transações específicas, como a compra de um produto por exemplo, que você precisa disponibilizar seu endereço, para que a compra chegue. O problema é quando isso não é necessário. Se determinado cadastro não lhe permitir avançar para a próxima etapa se, por exemplo, você não colocar sua data de nascimento, coloque outra que não seja a certa”, diz Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br.
Conheça seus direitos
“O Marco Civil assegura que o usuário tem direito de saber, de forma clara, as finalidades da coleta de seus dados. Tem direito a exercer o consentimento expresso sobre a coleta e o uso de qualquer de seus dados e, principalmente, tem direito à exclusão definitiva dos seus dados que tiver fornecido a determinada aplicação de internet, a seu requerimento”, diz José Antonio Milagre, da OAB-SP.
Comercialização de informações privadas viola o Marco Civil, diz advogado
A comercialização de dados privados de pessoas e empresas sem autorização na internet é considerada violação de privacidade. “Mesmo que o site tenha captado essas informações de banco de dados públicos, comercializá-las sem a expressa autorização das pessoas é ilegal”, afirma o advogado Gilson Goulart Júnior, especialista em Direito Civil.
Segundo Goulart, caso se sinta prejudicado por essa comercialização de dados, qualquer cidadão pode buscar uma ação individual para que as informações sejam excluídas do banco de dados do site. O Marco Civil da Internet, conjunto de regras e condutas para usuários e empresas de internet no Brasil, trata da garantia da inviolabilidade dos dados no artigo 7.º. A proteção também aparece na Constituição Federal.
O especialista destaca que, apesar do uso ilegal de informações pessoais, a coleta de dados por empresas que realizam transações na internet, como venda de produtos por exemplo, não é por si só abusiva. “O que ela não pode fazer é transferir esses dados para outra empresa, como o site, ou comercializar esses bancos de dados de clientes”, diz.
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