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O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar nesta quarta-feira (16) se municípios podem entregar carnês de arrecadação tributária e boletos de cobrança locais sem a intermediação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Quem relata o processo – que teve repercussão geral reconhecida – é o ministro Gilmar Mendes.
Embora o processo em questão diga respeito especificamente a municípios, a decisão do STF eventualmente pode ser mais abrangente. Em manifestação no decorrer do processo, Mendes afirmou ainda em fevereiro de 2012 – dez anos atrás – que a questão envolve "verificar a possibilidade de os entes federativos, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem diretamente suas guias ou boletos de cobranças aos contribuintes ou consumidores ou se é indispensável a utilização dos Correios".
O caso é discutido desde 2011, depois que os Correios ajuizaram ação no STF contra uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1.ª região, em processo envolvendo o município de Três Marias (MG), que tem população estimada de 33 mil habitantes. O TRF-1 entendeu que o serviço de coleta, transporte e entrega de documentos constitui "serviço postal, cuja exploração pertence, em regime de monopólio, à União Federal", mas ressalvou a possibilidade de o próprio ente federativo entregar os carnês sem intervenção de terceiros.
A estatal, por sua vez, questiona a prática adotada pelo município de entregar, por conta própria, em cada endereço residencial ou comercial, carnês de boletos e de impostos locais.
A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) e a Associação de Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe) ingressaram na causa como amici curiae – "amigos da corte", em latim, expressão que designa entidades que ingressam no processo a fim de trazer informações, dados e opiniões para fundamentar as decisões judiciais.
Atualmente, os Correios estão presentes em 5.556 municípios brasileiros, com um total de 11.124 agências e cerca de 98 mil funcionários.
Correios vê violação à Constituição
O argumento apresentado pelos Correios contra a decisão do TRF-1 em favor do município é de que há violação ao inciso X do artigo 21.º da Constituição Federal, segundo o qual compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional.
Em outra ocasião, o plenário do STF decidiu em 2009, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 46, que cartas pessoais e comerciais, cartões-postais e correspondências agrupadas (malotes) só podem ser transportados e entregues pelos Correios, mas que transportadoras privadas não cometem crime ao entregar outros tipos de correspondências e encomendas.
Segundo o ministro Gilmar Mendes, relator do processo que está na pauta desta quarta-feira do STF, o tema diz respeito à organização político-administrativa do Estado, alcançando, portanto, relevância econômica, política e jurídica, que ultrapassa os interesses subjetivos da causa.
"A controvérsia reclama deste STF pronunciamento jurisdicional para definir se a União detém monopólio sobre a entrega de guias de arrecadação tributária e boletos de cobrança, por se tratar de atividade inserida no conceito de serviço postal. A questão, em essência, cinge-se a verificar a possibilidade de os entes federativos, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem diretamente suas guias ou boletos de cobranças aos contribuintes ou consumidores ou se é indispensável a utilização dos Correios", escreveu Mendes em 2012, em uma manifestação do plenário virtual do STF.
Ao julgar caso semelhante, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) avaliou que, em relação ao boletos de impostos locais, no caso entrega de carnês de IPTU e ISS pelos municípios, sem a intermediação de terceiros, no seu âmbito territorial, "não há violação do privilégio da União na manutenção do serviço público postal, uma vez que a notificação, por fazer parte do processo de constituição do crédito tributário, é ato próprio do sujeito ativo da obrigação, que pode ou não delegar tal ato ao serviço público postal".