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Seattle, na Costa Oeste norte-americana: até os jornais descartavam a possibilidade de a cidade ser atingida pela crise, mas agora proprietários suam para vender suas casas | Benjamin Stangland/stock.xchng
Seattle, na Costa Oeste norte-americana: até os jornais descartavam a possibilidade de a cidade ser atingida pela crise, mas agora proprietários suam para vender suas casas| Foto: Benjamin Stangland/stock.xchng

Alternativa

Enquanto não vendem casas, donos viram locatários

Entre quem pretende vender, um número cada vez maior está simplesmente se rendendo ao mercado. Há dois anos, Megan e Ryan Dortch tentaram vender seu apartamento de um quarto em Eastlake por

US$ 325 mil. Rejeitaram uma oferta de US$ 295 mil que consideraram baixa. Um ano depois, o imóvel foi recolocado à venda por US$ 289 mil e, em seguida, por US$ 279 mil, que já era menos do que haviam pago originalmente por ele. Se não vendessem a esse preço, não poderiam bancar um lugar grande o bastante para os dois, mais o bebê que acabam de ter. O casal desistiu de comprar. Seu antigo apartamento está alugado e, à custa de um pequeno prejuízo a cada mês, vive numa casa também alugada. "Não espero que o mercado melhore", diz Megan, 31 anos, que trabalha como consultora de atendimento ao cliente.

Gene Burrus também não espera. É outro proprietário frustrado que, pelas circunstâncias, alugou seu imóvel. "O aluguel é tão barato que não faz sentido comprar agora", afirma. Ele diz que passa a reconsiderar essa opinião se a baixa de mercado persistir em mais 10% ou 15%.

A Redfin, uma empresa de mediação imobiliária com sede em Seattle, informa que o movimento começou a aumentar nas últimas semanas. As taxas de hipoteca estão subindo, o que poderia levar potenciais compradores a fechar negócio agora por medo de que os juros aumentem ainda mais. Mas, assim que o mercado finalmente se recuperar, todos aqueles senhorios de aluguel acidentais vão querer voltar a tentar vender, sobrecarregando novamente o mercado. "São muitos os vendedores potenciais que estão à espreita", ilustra o executivo-chefe da Redfin, Glenn Kelman. "A oferta só vai se expandir e expandir. Não vejo cenário favorável a um aumento significativo dos preços", analisa.

Futuro dos preços ainda é incerto

Enquanto quase todos os economistas esperam uma nova rodada de baixa para os próximos meses, muitos veem um nivelamento gradual no segundo semestre do ano. A Fiserv, empresa que produz os dados mensais do índice Case-Shiller Home Price, analisou as tendências de preços em 375 comunidades. Em cerca de 75% dos casos, eles ficarão estáveis em dezembro, calcula a Fiserv. "Estamos num período de extrema baixa, mas com maior volatilidade do que normalmente vemos nessas situações", explica David Stiff, economista-chefe da empresa. "Esse tipo de mergulho duplo é inédito no mercado imobiliário", descreve.

Talvez por isso a crença de que se chegou ao fundo do poço seja tão ilusória agora quanto foram os receios de que se chegara ao topo em 2006. "Gostaríamos muito de ter uma casa", diz Dan Cun­ningham, 41 anos, que mora de aluguel. "Tenho mais do que o suficiente para uma entrada. Estou pré-aprovado para um empréstimo. Mas preciso ter certeza de que o preço não vai cair mais 20%." Antes de fazer qualquer oferta, ele pretende esperar até ver que os preços recomeçaram a subir.

Poucos acreditavam que o mercado imobiliário dos Estados Unidos algum dia fosse entrar em colapso. Agora, a pergunta é se o período de baixa algum dia vai acabar. O crash imobiliário devastador pelo qual passam a Flórida e o sudoeste do país vem causando uma nova onda de angústia para as comunidades que se pensavam imunes – cidades economicamente diversificadas onde o boom do setor antes da crise foi relativamente contido. No ano passado, os imóveis de Seattle tiveram um declínio de preço maior do que em Las Vegas. Minneapolis caiu mais que Miami, e os proprietários de Atlanta tiveram mais prejuízo que os de Phoenix.

Os mercados vítimas da bolha imobiliária, onde construtores, compradores e bancos saíram do controle, sofreram as primeiras baixas, dizem os economistas, de modo que agora estão perto do fim desse ciclo e, em alguns casos, voltando a crescer. Quase todo o resto ainda deve passar por mais uma temporada de sofrimento.

"Quando saio e converso com o pessoal da cidade, eles dizem: ‘Uau, pensei que íamos ter reajustes de preço de 12% e acabar com isso’", diz Stan Humphries, economista-chefe do website especializado em habitação Zillow, com base em Seattle. "Mas a coisa não tem fim", lamenta. O mercado imobiliário de Seattle teve queda de aproximadamente 31% em relação a seu pico, em meados de 2007, segundo cálculos do Zillow, e ainda pode cair algo como 10%. Humphries estima que o resto do país sofrerá uma queda adicional da ordem de 5% a 7%, uma vez que o crédito para compradores de imóveis continuou a ser corroído no último ano fiscal. "Entramos 2010 nos sentindo poderosos graças ao Tio Sam", conta Humphries. "Terminamos o ano sem dinheiro, com os preços das casas em queda livre", completa.

O fato de que mesmo uma região bastante próspera como a de Seattle tenha se enredado na crise mostra o quanto esse crash é um fenômeno nacional. Tudo começou quando os empréstimos de baixa qualidade que proporcionaram a última fase do boom começaram a fazer água, mas a recessão resultante agravou amplamente a crise. Muitas pessoas não conseguiram hipotecar suas casas, outras simplesmente desistiram de buscar essa saída.

Agora, embora a economia global pareça estar em recuperação, o mercado imobiliário teima em continuar desaquecido. O que representa um sério problema para a administração Obama, que lançou várias iniciativas destinadas a ajudar os proprietários de imóveis, com variados graus de sucesso.

A CoreLogic, empresa que coleta dados do setor, divulgou, no início de fevereiro, que os preços das casas americanas caíram 5,5% em 2010, voltando ao patamar de março de 2009, em plena recessão. As vendas de casas novas bateram no fundo do poço. E os pedidos de hipotecas estão próximos da maior baixa em 15 anos, um mau sinal para o que se pode esperar no fim deste inverno americano.

Tem sido um longo e doloroso declínio. No auge do setor, uma desaceleração imobiliária em Seattle era quase impensável. Em setembro de 2006, depois que os preços começaram a cair em muitas partes do país, mas lá ainda estavam subindo, o Seattle Times observou que a última queda nos valores, pela medição trimestral, fora durante o período de grave recessão de 1982. Dois economistas locais eram citados na matéria dizendo, simplesmente, que Seattle estava imune, "se a história nos servir de referência". Um índice de risco de mercado da PMI Mortgage Insurance apontou insignificantes 11% de chance de que os preços ali cairiam.

Hoje, o clima é de austeridade, quando não francamente fatalista. Se a recuperação depender da crença em dias melhores, isso parece muito distante. Quem precisa vender fecha os olhos e torce pelo melhor. Aqueles que esperam comprar veem os preços mais baixos, mas muitas vezes têm orçamentos ainda mais limitados, o que elimina qualquer sentido de urgência nas decisões.

Arne Klubberud e Melissa Lee-Klubberud pagaram US$ 358 mil por uma casa nova de cerca de 300 metros quadrados, no elegante bairro de Capitol Hill, poucas semanas depois que o artigo do Seattle Times foi publicado. Agora, com um filho e a expectativa de que venham outros, eles precisam de mais espaço. Acabaram de colocar a casa à venda por US$ 300 mil. "Obviamente, não é a situação ideal", diz Melissa, uma advogada de 32 anos. Ela e o marido esperam tirar vantagem do mercado em baixa para comprar a bom preço, mas antes precisam vender o imóvel atual por um valor aceitável. "Todo mundo tem seu teto. Nós temos nosso piso", observa.

Num domingo escuro e úmido, algumas pessoas apareceram para visitar a casa de três andares. Uma delas foi Katherine Davis, que tinha acabado de vender a sua num subúrbio no lado leste da cidade. Demorou 14 meses para arrumar comprador, durante os quais teve de baixar o preço várias vezes. O patrimônio que acumulou ao longo de décadas foi embora rapidamente. "No começo, achei que estaria bom se saísse dessa com US$ 200 mil, mas adaptei minhas expectativas", conta Katherine. Saiu do negócio com menos da metade do valor. Seu objetivo é comprar uma casa pequena na cidade, mas não por enquanto. "Estou sendo egoísta e torcendo para que o setor continue em queda", diz ela.

Tradução: Christian Schwartz

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