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O Brasil que inspira

Como esta rede de ginástica para o cérebro com “DNA presencial” cresceu na pandemia

Antônio Carlos Perpétuo, proprietário da rede de franquias Supera. (Foto: Divulgação)

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O Supera, rede de escolas de "ginástica para o cérebro", começou 2020 comemorando resultados ao entrar no ranking das 50 maiores franquias do Brasil segundo o relatório da Associação Brasileira de Franchising (ABF). Na época a rede contabilizava 321 unidades, 21% mais que no ano anterior, e fazia projeções otimistas para os meses seguintes. Mas a principal característica de seu método – treinamento analógico, presencial e em grupo – foi colocada à prova durante o período de restrições decorrentes da pandemia de coronavírus.

“A essência da metodologia sempre foi presencial. Quando veio a pandemia a gente teve um desafio muito grande, o de levar aulas, no formato que a gente tinha no presencial, para o digital, para a casa dos alunos”, diz o fundador da empresa, Antônio Carlos Perpétuo. Entretanto, como ocorre em qualquer rede, houve franqueados que não conseguiram manter o ritmo de negócios. Algumas unidades fecharam, e o Supera saiu do ranking da ABF publicado em janeiro de 2021.

Entretanto, as inaugurações voltaram com força nos últimos meses e o Supera conta hoje com 350 escolas por todo o Brasil. Conheça essa trajetória a seguir, em mais uma reportagem da série O Brasil que inspira, que apresenta histórias de coragem, criatividade e perseverança, de brasileiras e brasileiros que encontraram novas formas de trabalhar e empreender em meio à pandemia.

Inspiração para a empresa veio de uma necessidade familiar

O método do Supera, empresa inaugurada em 2006 em São José dos Campos (SP), está baseado no uso do ábaco, uma antiga ferramenta de cálculo manual, e também na aplicação de jogos de lógica e dinâmicas de grupo. A inspiração veio de uma necessidade familiar: o filho caçula, então com 9 anos, apresentava dificuldades de concentração na escola. A família consultou vários especialistas, mas o problema persistia.

Sem desistir de uma solução efetiva, Antônio Carlos encontrou uma associação de professores japoneses que aplicavam o soroban (ábaco), com resultados escolares muito bons. “Conversando, coletei relatos fantásticos. Alunos que tinham dificuldades, alunos repetentes contumazes, que fizeram um ano de soroban não repetiram mais de ano. Teve também uma garota que passou em Medicina na USP sem fazer cursinho. Então me convenci de que aquela ferramenta era transformadora”, relata.

A partir daí a veia empreendedora pulsou mais forte. Além de resolver o problema familiar, Antonio Carlos enxergou uma oportunidade. Começou a traçar um plano de negócios e mapeou os riscos.

“O principal risco era que a sociedade fosse resistente a uma prática tão antiga e manual para fazer contas. Mas superamos isso e a prática do ábaco se mostrou um grande diferencial competitivo, porque a gente se tornou uma válvula de escape, o oposto desse mundo digitalizado em que vivemos hoje”, observa.

Uma dificuldade inicial foi o treinamento dos primeiros professores e a adaptação do ensino do soroban para os propósitos do Supera. “Os japoneses são muito focados em campeonato e o nosso foco é o desenvolvimento cognitivo. Então fizemos muitas adaptações, é uma metodologia bem diferente da que os orientais praticam. E temos mais cinco ferramentas pedagógicas que fomos agregando”, explica o presidente da empresa.

A metodologia do Supera tem um embasamento na neurociência, mas a teoria veio em um segundo momento. “Depois que estava tudo pronto, depois que a gente entendeu que o método funcionava mesmo, aí a gente foi buscar a neurociência para entender por que funcionava", diz Antônio Carlos.

A intenção dele era desenvolver uma escola que trabalhasse a inteligência, a criatividade e a autoestima, e foi fazendo isso de modo empírico.

“Acho que se eu fosse professor eu não teria feito. Como sou engenheiro e empresário, procurei desenvolver uma metodologia que acreditava ser necessária. Estudei no ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica], mas questões muito importantes como raciocínio lógico, inteligência financeira, inteligência emocional, comunicação, liderança, eu não aprendi, não fui ensinado. E na verdade são essas habilidades que fazem diferença para a gente. Não só no aspecto do sucesso profissional, mas também na jornada da vida”, diz.

Desde o início o empresário previu a expansão por meio de franquias: “Eu sabia que se o risco fosse superado e a metodologia se mostrasse um sucesso, a gente seria copiada rapidamente. Então precisaria crescer rápido para conquistar a liderança e se manter. O franchising permite expansão e ocupação de espaços, então hoje estamos presentes em todos os estados”.

O método do Supera se baseia no uso do ábaco, uma antiga ferramenta de cálculo manual, e também na aplicação de jogos de lógica e dinâmicas de grupo. Foto: Divulgação (Foto: Adilson Lobo)

Rede ofereceu plano de apoio para os franqueados na pandemia

Coordenar uma rede exige responsabilidade por parte do franqueador. Durante a pandemia, o Supera ofertou um plano de suporte para as unidades, com redução no pagamento dos royalties e também assessoria jurídica e financeira para revisão e renegociação de contratos e dívidas, entre outros incentivos.

“Nos primeiros meses, o objetivo era preservar o caixa. Mas essa pandemia foi muito pior que o imaginado. A segunda onda pegou todo mundo de calça curta novamente. Ela nem chegou perto da primeira em termos de colapso econômico, mas em termos sanitários foi muito pior, matou muito mais gente”, diz o empresário.

O setor de franchising como um todo teve uma queda de 10,5% no faturamento em 2020, após registrar alta de 6,8% em 2019 e vários anos de crescimento acumulado. O faturamento do segmento de serviços educacionais, que vinha em um ritmo ainda melhor em 2019, com alta de 7,4%, caiu 10,7% no ano passado. O fechamento de unidades na área de educação também foi maior do que na média: variação de -5%, contra -2,6% de todas as franquias, segundo os relatórios anuais da ABF.

Segundo Antônio Carlos, o fechamento de unidades durante um ano tão difícil é algo esperado. “Na rede sempre tem aqueles franqueados que estão bem e aqueles que não estão muito bem. Se não está devidamente capitalizado fica mais difícil. Algumas fecharam, mas outras unidades abriram”, pondera.

Como foi a migração para o modelo remoto

Um dos trunfos durante a pandemia, avalia Antônio Carlos, foi a migração bem-sucedida de um modelo que tinha "DNA presencial" para a plataforma on-line. “No campo educacional como um todo, não foi algo tão bem-sucedido, há muitas pesquisas mostrando o déficit de aprendizado. Mas aqui no Supera nós conseguimos obter ótimos resultados. Nosso índice de presença nas turmas até aumentou, o índice de faltosos diminuiu. A gente retomou o presencial, e ele predomina. Mas há uma parcela de alunos que gostou tanto desse novo formato digital que a gente continua ministrando aulas nele”, relata.

A diretora pedagógica da rede, Patrícia Lessa, conta que a adaptação para o formato remoto ocorreu na base da experimentação. A mudança, feita em poucos dias, foi coordenada por uma equipe de aproximadamente 15 educadores e envolveu 27,7 mil alunos que estavam matriculados na época.

"Todos os roteiros, que eram produzidos com um mês de antecedência, passaram a ser feitos de forma muito mais dinâmica, com antecedência menor, observando principalmente a experiência do aluno com as aulas on-line e a realidade do momento", conta.

Segundo ela, a substituição de jogos presenciais por experiências on-line buscou manter o mesmo nível de desafio para o aluno: "As aulas passaram a ter cerca de 80 a 90 slides, para gerar uma sensação maior de visualização e de aproveitamento do curso".

Os educadores que atuam na sede da empresa formaram uma força-tarefa para assistir a todas as aulas on-line. O objetivo: identificar possíveis vãos de desatenção e perda de desempenho, para garantir que a experiência do aluno fosse a mais próxima possível do modelo presencial.

Para Antônio Carlos, ainda é cedo para dizer se o novo formato veio para ficar. Se por um lado há o público que prefere aula remota, o presidente do Supera conta que a maior parte dos alunos tem demonstrado muita vontade de voltar a conviver em sala de aula, encontrar os colegas e realizar as atividades presencialmente.

Preocupadas em se manter ativas, pessoas com mais de 50 anos são o maior público

Apesar de o Supera ter se originado de uma prática de reforço escolar, hoje o público atendido abrange todas as faixas etárias, com predominância daquelas acima de 50 anos. São pessoas que querem se manter ativas intelectualmente. O mês de setembro, aliás, costuma marcar o melhor momento da franquia no ano, segundo a empresa. Em meio às ações da Associação Brasileira de Alzheimer durante o “setembro roxo”, o Supera alavanca sua exposição divulgando ações de estimulação cognitiva.

“Para os idosos, principalmente, é muito importante ter um espaço de convivência. Há uma tendência natural de o idoso se isolar depois que sai do mercado de trabalho, e a atividade presencial do Supera é muito importante para tirar o idoso de casa e se manter ativo”, afirma.

Para o empresário, a rede se beneficia de uma questão relativa à própria pandemia. "A infecção [por Covid-19] pode causar sequelas como perda de memória e perda de raciocínio, e muitas habilidades que desenvolvemos estão justamente combatendo esses males.”

As aulas ocorrem em encontros semanais em grupos e, durante a pandemia, o número de alunos por turma varia conforme o espaço físico de cada escola e as regras sanitárias em vigor. O programa básico tem duração de 18 meses, mas cada aluno avança conforme o desempenho individual.

Segundo o empreendedor, os últimos meses foram de muita preocupação, e até pânico, por ter de enfrentar uma situação tão desafiadora e desconhecida.

“Mas tem uma coisa que salva o empresário. Nós somos por natureza otimistas, porque, se não for assim, a gente não empreende. Então no começo da pandemia achava que ia durar três, quatro, seis meses, mas a coisa foi esticando. Como você é otimista, você sobrevive. Se eu imaginasse que isso iria durar um ano e meio, bateria um desespero muito maior”, revela.

Mesmo em um cenário de retomada mais lenta que o esperado, Antônio Carlos aposta no potencial do empreendedorismo. “A atividade empreendedora é a mola-mestre transformadora de uma nação. Acho que isso que faz os Estados Unidos serem nação tão rica, por exemplo. Nós brasileiros somos empreendedores, temos isso no nosso DNA. Infelizmente não temos isso na nossa formação. Mas digo que mesmo que você não tenha a educação necessária é possível buscar os conhecimentos, estão disponíveis. Empreender é algo que traz uma satisfação muito grande”, defende o empresário.

Esta é a terceira reportagem da série O Brasil que inspira, que conta histórias de brasileiras e brasileiros que encontraram novas formas de trabalhar e empreender durante a pandemia de coronavírus. Acompanhe:

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