São Paulo - O crescimento da renda, que garantiu recordes de venda ao setor supermercadista em 2010, deve manter o consumo aquecido em 2011, mas o possível aumento dos preços dos alimentos, puxado pela alta das commodities e pela demanda aquecida, poderá desacelerar o volume das vendas de alimentos nos supermercados. Isso porque a inflação afeta, sobretudo, o poder de consumo das classes C e D, faixas da população que mais ampliaram o consumo.
"O desafio será manter o mesmo patamar de crescimento em 2011. A tendência é de que a alta de preços afete o volume", diz o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Sussumu Honda. Segundo ele, a quantidade de produtos vendidos cresceu na faixa dos 7% no ano passado na comparação com 2009, com base em levantamento da Nielsen, realizado a pedido da Abras. Esse patamar de crescimento será o maior ao menos desde 2005, quando a pesquisa passou a ser realizada.
Mesmo com o consumidor se deparando com preços mais altos nas prateleiras dos supermercados, a demanda permanecerá aquecida em 2011. Isso ocorre pelos ganhos de massa salarial acumulados nos últimos anos, incluindo as 30 milhões de pessoas que migraram entre 2004 e 2009 das classes D e E para a C faixa que concentra renda de 4 a 10 salários mínimos. Segundo a consultoria econômica MB Associados, a massa real de rendimentos projetada para 2011 aponta para uma evolução de 6,3%, diante de ganhos de 7,5% de 2010. "A demanda continuará forte, mas num patamar diferente, um pouco abaixo, mas com crescimento, é claro", afirma Honda, da Abras.
Consumo garantido
O economista da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) Denis Ribeiro afirma que a alta dos preços poderá prejudicar o volume produzido em 2011, mas salienta que o mercado interno está fortalecido. "Mesmo com a desaceleração prevista para o PIB em 2011, a manutenção do emprego e da renda garantirá o consumo", diz Ribeiro. "Nunca o mercado de trabalho esteve tão bom quanto neste ano (2010), não só pelo baixo desemprego, mas também pela qualidade do emprego gerado", diz Cimar Azeredo, do IBGE.
O vice-presidente de relações corporativas do Pão de Açúcar, Hugo Bethlen, afirma que a recente aceleração dos preços ainda não afetou as vendas nos supermercados e hipermercados. Ele enfatiza que, desde a implementação do Plano Real, em 1994, os preços se mantêm numa relativa estabilidade. "Não vemos nenhuma pressão inflacionária. Estamos tendo, inclusive, redução de preços em linhas de produtos industrializados", afirma. "O cliente não compra mais apenas a cesta básica ou promoção, mas sim um mix mais abrangente de produtos", completa. Segundo relatório da Link Investimentos, um dos fatores de risco para o desempenho das ações do Pão de Açúcar em 2011 reside no impacto da alta dos preços sobre o volume das vendas.
Além da inflação gerada pela demanda no Brasil por produtos alimentícios, puxada pelos ganhos de renda, não há no longo prazo sinais visíveis de que possa ocorrer um recuo na demanda internacional por commodities, principalmente no setor agrícola, afirma o coordenador de Análises Econômicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Salomão Quadros. "Uma das grandes questões entre os analistas, pelo que pude perceber, é o que vai acontecer com os preços dos alimentos (em 2011). O que posso dizer é que, no caso dos alimentos, a demanda está forte, e não dá mostras de arrefecimento, tanto no mercado doméstico quanto no mercado internacional", disse.