Uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que o Ministério dos Transportes selecionou obras rodoviárias para o Novo PAC que não atendem à estratégia do Plano Setorial de Transportes Terrestres (PSTT). De acordo com informações publicadas nesta segunda (11) pela Corte, os projetos vão custar cerca de R$ 80 bilhões.
Segundo o acórdão do ministro Antônio Anastasia, o plano setorial foi criado pelo governo para identificar as principais demandas e as ações necessárias para o desenvolvimento do sistema nacional de transportes. Ao todo, o Novo PAC vai destinar R$ 185,8 bilhões em recursos para a infraestrutura rodoviária.
“A maior parcela dos projetos rodoviários encaminhados ao Novo PAC tem baixo impacto ou sequer tinha sido avaliado pelo planejamento em andamento, representando cerca de R$ 80 bilhões entre projetos privados e públicos”, apontou o acórdão do TCU sobre a auditoria que a Gazeta do Povo teve acesso (veja na íntegra). O tribunal não detalhou quais obras foram destacadas na análise.
O TCU aponta que 45% dos recursos públicos destinados às obras, somando R$ 36 bilhões, e outros 35% dos recursos privados previstos (R$ 54 bilhões) têm classificação de baixo impacto no plano setorial ou não foram avaliados. “É negativamente relevante que valores tão expressivos de recursos públicos sejam alocados em projetos de baixo impacto ou de impacto incerto (não avaliados), ampliando o alto risco de desperdício de recursos públicos”, afirma.
A auditoria do TCU também identificou baixa transparência e falta de participação social na elaboração da carteira de projetos. À Gazeta do Povo, o ministério informou que a auditoria realizada pelo tribunal adotou como premissa o que está previsto em uma minuta de Plano Setorial de Transportes Terrestres (PSTT) que foi deixada inacabada pela gestão anterior, e que, de acordo com o corpo técnico do MT, se utilizou de uma metodologia equivocada para nortear investimentos.
"Um dos principais equívocos é o de rotular empreendimentos como de 'baixo impacto' meramente por não serem viáveis para concessão ao setor privado. Ignora-se, assim, que obras de alto impacto do ponto de vista socioeconômico, de integração nacional e de segurança pública podem ser feitas com recursos públicos", disse à reportagem.
O Ministério dos Transportes afirmou que herdou a minuta de PSTT com falhas e que trabalha, desde o início do ano, para ajustar o documento para apresentá-lo em breve. "O MT esclarece ainda que recebeu um relatório preliminar da auditoria do TCU e que questionou pontos do documento: a pasta reforçará seus argumentos junto à Corte de Contas, a fim de esclarecer possíveis equívocos", completou.
Governo selecionou obras que poderiam ser tocadas pela iniciativa privada
Anastasia também apontou que o Ministério dos Transportes sugeriu investir recursos públicos em projetos que teriam vocação privada (projetos com viabilidade econômica), e encaminhou R$ 7,8 bilhões em recursos do Orçamento-Geral da União (OGU). Destes, 85% estão classificados como de alta ou média pré-viabilidade.
“Ou seja, projetos que, de acordo com o planejamento, poderiam ser realizados com capital privado estão listados entre os que receberão recursos públicos”, anotou o magistrado.
A fiscalização apurou ainda que não há um detalhamento sobre os critérios que levaram à escolha de determinadas obras e modo de financiamento do projeto, se pública ou parceria privada.
Segundo o relatório do próprio governo sobre os investimentos em infraestrutura rodoviária, serão destinados R$ 6,8 bilhões em recursos públicos para concessões em âmbito nacional, além de R$ 2,5 bilhões para estudos e projetos de obras públicas e concessões (veja na íntegra).
Já a iniciativa privada em si deve destinar R$ 50,8 bilhões em investimentos de concessões existentes e R$ 62 bilhões para novos contratos.
“Desconexão” que gera “desperdício de recursos”, diz TCU
A auditoria do TCU apontou que há uma “desconexão” entre o planejamento das obras prioritárias e a tomada de decisões para a alocação de recursos, representando uma “inversão da lógica que seria esperada para um adequado planejamento”. “Em vez de os planos orientarem a escolha dos investimentos, as decisões foram tomadas e, posteriormente, projetos que não estavam listados nos planos setoriais em andamento serão incorporados aos referidos planos”, afirma o relatório da análise.
O tribunal apontou também que o governo não comparou os custos das obras – que, segundo aponta a auditoria, chegará a R$ 80 bilhões – com os benefícios sociais para escolher os projetos que serão pagos. A análise apontou ainda que os ministérios dos Transportes e de Portos e Aeroportos não dispõem de filtros para evitar que projetos de baixa viabilidade ou inviáveis sejam incluídos nos programas de investimento.
Essa situação, afirma, impede que “investimentos ruins, de baixo retorno para sociedade” sejam identificados previamente e descartados. Entre estes problemas está a falta de conexão entre os projetos, contrariando a lógica que criou o planejamento integrado de transportes.
“Essa abordagem fragmentada aumenta os riscos de que projetos interdependentes, como portos e ferrovias, não sejam desenvolvidos de forma conjunta e, também, que projetos concorrentes disputem as mesmas cargas. As decisões isoladas de investimento aumentam os riscos de gargalos ou a duplicidade de esforços, acarretando a manutenção dos altos custos de frete”, ressaltou o ministro.
O tribunal deu um prazo de 180 dias para que os ministérios de Transportes e de Portos e Aeroportos apresentem justificativa para a inclusão de cada investimento logístico no Novo PAC.
Dentro do acórdão, o MT afirmou que o Plano Setorial de Transportes Terrestres não estava completo quando foi acessado pela nova gestão, e que está fazendo uma revisão nos documentos. Já o de Portos e Aeroportos informou que “cerca de 80% das obras e empreendimentos propostos para o novo PAC já se encontravam nos planos setoriais como relevantes e de alto impacto”, e que o plano setorial “não deve ter caráter restritivo e vinculativo”.
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