Com o avanço da internet em alta velocidade pelo celular, a telefonia fixa, quem diria, virou o calcanhar de Aquiles das empresas de telecomunicações. No momento em que se discute a revisão do marco regulatório do setor, as concessionárias Oi, Telefônica Vivo, Embratel, Sercomtel e Algar lutam para se desfazer de uma das principais heranças da privatização, ocorrida em 1998: os prédios que abrigavam as antigas e enormes centrais telefônicas, uma rede de sistemas que permite ao usuário fazer e receber chamadas de voz.
Na ponta do lápis, as teles travam hoje disputa com o órgão regulador, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), para tentar vender ou alugar boa parte dos mais de 8.500 imóveis no país, avaliados em cerca de R$ 3,3 bilhões, de acordo com documentos enviados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O valor equivale a mais da metade do investimento anual da Oi, de R$ 5,2 bilhões, por exemplo.
Especialistas avaliam que as empresas, endividadas pretendem usar os imóveis para levantar recursos e melhorar seus resultados financeiros. Embora os prédios, em sua maioria, tenham sido construídos antes da privatização, as teles avaliam que são donas. O governo entende que elas só têm a posse dos bens. A disputa está longe de acabar.
De um lado, as concessionárias alegam que esses prédios não são mais essenciais para prover o serviço de telefonia fixa, já que, com o avanço da tecnologia, esses sistemas, que antes ocupavam diversos andares, se resumem hoje a alguns pares de computadores em uma sala. E mais: as concessionárias afirmam que, se conseguissem se desfazer dos imóveis, poderiam reinvestir em infraestrutura, melhorando a qualidade do serviço.
A Anatel cita a lei do setor, que exige que as concessionárias tenham os bens. A lógica é que, caso a concessão não seja renovada em 2025, os futuros interessados devem ter os imóveis para oferecer o serviço de voz. A decisão sobre o imbróglio deve parar no Congresso.
“Com a crise, as empresas estão reduzindo investimentos. Para as teles, o importante é prover o serviço; para o governo a visão é patrimonial. Mas, mesmo que se chegue a uma solução, o governo tem que ter garantias de que elas vão investir na rede”, avalia o consultor Virgílio Torres.
“Elefantes brancos”
Em meio ao impasse, muitos prédios estão vazios ou subutilizados, dizem as teles, que destacam os gastos com segurança e limpeza. Ostentam sedes em bairros nobres: caso da Oi no Leblon, na Zona Sul, com seus R$ 13,5 mil por metro quadrado, um dos mais caros do Brasil, segundo a Zap Imóveis.
Se antes a central telefônica ocupava todos os oito andares do prédio, hoje cobre 25% do andar térreo. A Oi, que tem interesse em vender sua sede, coleciona construções vazias, como um imóvel em Camaragibe, no Recife, diz uma fonte. Há dois anos a Oi recorreu à polícia após seu imóvel no Engenho Novo, na Zona Norte do Rio, que ficou conhecido como “Favela da Telerj” – em referência ao nome da empresa antes da privatização – ter sido invadido.
“Temos sete mil imóveis travados. Um prédio fechado onera a companhia. Poderíamos vender e investir em infraestrutura. Com o avanço tecnológico, houve uma evolução e hoje há uma ociosidade da infraestrutura. Assim, conseguimos levar uma central para qualquer outro lugar. Agora a revisão do modelo veio coroar essa discussão”, disse Carlos Eduardo Monteiro, diretor de Regulamentação e Assuntos Institucionais da Oi, que tem a concessão fixa em todo o país, exceto em São Paulo.
Com 1.400 imóveis próprios, a Telefônica Vivo, que tem a concessão de telefonia fixa em São Paulo, já tentou se desfazer se sua antiga sede, no bairro de Bela Vista. Mas o pleito esbarrou na Anatel.
“É possível continuar oferecendo o serviço de telefonia fixa sem atrelar isso aos imóveis. Hoje, temos muitos custos para manter esses prédios, que, por estarem subutilizados, poderiam se reverter em novos investimentos em infraestrutura. Na nossa visão, a gente poderia monetizar tudo. Hoje, no geral, ninguém compra mais imóveis”, destacou Gustavo Gachineiro, vice-presidente de Assuntos Corporativos e Comunicação da Telefônica Vivo.
Assim como a Oi, a Embratel tem centenas de imóveis em Alagoas, Acre, Amazonas e Minas Gerais. Na cidade do Rio, são ao menos sete prédios, segundo a Anatel. Já a mineira Algar, com concessão fixa em 87 municípios entre Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul e São Paulo, também tem imóveis considerados reversíveis. Jean Carlos Borges, presidente da companhia, lembra, que, para abrigar as centrais, os prédios tinham pé direito alto e salas amplas. Por isso, o executivo disse que é necessária a evolução do modelo. “Temos de discutir um modelo que aumente os investimentos”, destacou.