O governo de Michel Temer vai apoiar a proposta de terceirização irrestrita, para qualquer tipo de atividade, nos moldes propostos pelo projeto aprovado na Câmara, no início de 2015, e que está à espera da votação no Senado. O Palácio do Planalto quer que o projeto, que conta com a simpatia de associações patronais, mas a ojeriza das centrais sindicais, seja aprovado ainda este ano, concomitantemente ao andamento da reforma da Previdência.
Apesar de o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, ter dito que o governo vai encaminhar ao Congresso outro projeto sobre o tema, não há dúvidas no núcleo duro que assessora Temer do apoio a essa proposta, que já passou pelo trâmite na Câmara. A ideia é economizar tempo e entregar ao setor produtivo, no prazo mais breve possível, uma medida concreta que represente redução de custos.
Regulamentar a terceirização é um dos pontos do que está sendo chamado no Planalto como “modernização” das relações de emprego. A reforma trabalhista deve permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais. Sob essa premissa, além dos itens que a própria Constituição permite flexibilizar – como jornada de trabalho, banco de horas, redução de salário, participação nos lucros e resultados –, outros benefícios, como férias e 13.º salário, adicionais noturno e de insalubridade, salário mínimo, licenças e FGTS, também serão negociados.
A reportagem apurou que a avaliação de Nogueira no mercado e entre seus pares no ministério é ruim. Ele não teria força para tocar uma reforma trabalhista desse calibre e deve ser enquadrado pelo Planalto para encampar os princípios que o governo Temer defende. O ministro do Trabalho chegou a prometer às centrais que só haveria posição sobre terceirização depois de discussões em um grupo de trabalho – que foi criado, mas nunca se reuniu.
A equipe de Temer também quer tirar do papel duas novas modalidades de contrato de trabalho: o parcial e o intermitente, com jornada inferior a 44 horas semanais e salários proporcionais.
“Ninguém imagina que vai conseguir unanimidade em qualquer desses projetos”, afirmou à reportagem o ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, quando questionado sobre a força da base aliada do governo para aprovar a regulamentação da terceirização de qualquer atividade. “Veja que, nas grandes democracias do mundo, toda vez que se fala em mudanças de regras trabalhistas e previdenciárias sempre dá turbulência”, completou o ministro. Segundo ele, porém, essas são medidas necessárias para garantir crescimento de longo prazo. “Diferente desses processos cíclicos que se aproveitam de circunstâncias internacionais, dando ilusão a todo brasileiro”, alfinetou.
O projeto aprovado na Câmara, depois da atuação com mãos de ferro do ex-presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não tinha a adesão do governo da presidente cassada Dilma Rousseff. Será preciso o governo Temer convencer o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sobre o teor do projeto aprovado na Câmara. Ele não concorda com o texto por considerar que haverá precarização das condições de trabalho. Mesmo opinião tem o senador Paulo Paim (PT-RS), relator do projeto na comissão especial. Ele vai apresentar um novo texto para garantir, segundo ele, os direitos básicos trabalhistas aos 13 milhões de brasileiros que são terceirizados. “O projeto da Câmara não coloca limite para a terceirização. Dessa forma, não passará aqui no Senado”, afirmou. Paim disse que visitou todas as capitais brasileiras e foi “unânime” a opinião que o texto aprovado pelos deputados tem de ser rejeitado.
Proposta opõe empresários e sindicatos
A possibilidade de adotar a terceirização em qualquer tipo de atividade acentua a disposição em lados opostos do empresariado, que defende a medida pelo potencial de corte de custos que representa, e das centrais sindicais, que consideram a proposta uma afronta aos direitos trabalhistas.
Na avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), é um dos “avanços fundamentais” para a melhora do ambiente de negócios brasileiro, principalmente ao eliminar a distinção entre “atividade-meio” e “atividade-fim”, que causa divergências até no Judiciário.
Desde o início do governo Temer, ainda na etapa de interinidade, a CNI pedia agilidade para a regulamentação dos empregados terceirizados da forma como a Câmara aprovou. “O mais importante é dar segurança jurídica aos trabalhadores que são terceirizados e assegurar os direitos a eles. O mundo inteiro trabalha assim”, disse Robson de Andrade, presidente da CNI. Ele se opõe ao texto substitutivo do senador Paulo Paim (PT-RS) que restringe a terceirização à atividade-meio.
Atualmente, não há lei em vigor que regulamente a terceirização de atividades, mas uma jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) impede a terceirização de atividades-fim. Ou seja, pela regra atual, uma fábrica de veículos não pode terceirizar as atividades dos metalúrgicos, mas analistas de sistema, seguranças e equipe de limpeza, sim.
Da forma como está, se o projeto for aprovado no Senado e sancionado pelo presidente, um banco poderia, em tese, contratar caixas terceirizados. No entanto, provavelmente não o fará porque o texto diz que o profissional da contratada não pode ser subordinado à empresa contratante. O caixa, portanto, não responderia a um chefe do banco, mas sim a alguém da terceirizadora, o que deve inibir a terceirização de atividades consideradas cruciais ao negócio das empresas.
Para as centrais sindicais, o projeto da forma como está só beneficia as empresas e promoverá uma “precarização” nas condições de trabalho, com redução de salário e retirada de benefícios. “O governo Temer acha que pode aproveitar esse momento de fragilidade na economia para passar o rodo nos trabalhadores”, afirma Ricardo Patah, presidente da UGT, ligada ao PSD, do ministro Gilberto Kassab (Ciência e Tecnologia) e de Henrique Meirelles (Fazenda).
A UGT, que tem maior representação na área de serviços, defende a regulamentação apenas de atividades-meio. Patah afirmou que as centrais vão se unir para evitar que “medidas irresponsáveis” como esse projeto da terceirização e a fixação de uma idade mínima para aposentadoria no Brasil de 65 anos sejam aprovados no Congresso.
Para Sérgio Nobre, secretário geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o projeto de terceirização que está no Senado é uma “tragédia”. “Se esse programa de governo tivesse passado pelo crivo dos eleitores, o PMDB nunca conseguiria assumir o poder. Esse governo não tem legitimidade para tocar reformas dessa magnitude”, afirmou.
A Força Sindical mudou de lado e agora também defende, como a UGT, que a terceirização seja restrita a atividades-meio, segundo o presidente da central, deputado federal Paulo Pereira da Silva (SD-SP). No ano passado, CUT e Força se enfrentaram no dia 1.º de maio por causa do projeto que regulamenta e amplia a terceirização nas empresas.
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