Quase cinco anos atrás, apresentei um plano simples de como sobreviver ao que parecia estar se transformando em uma era turbulenta no mundo da tecnologia. Na época, a tecnologia parecia emocionante e transformadora. Você podia usar um smartphone para chamar um carro como se fosse um figurão. Era possível conversar com as pessoas por vídeo em qualquer lugar do mundo, como “Os Jetsons” – e talvez algumas dessas pessoas usassem a nova tecnologia para, de alguma forma, se livrar do jugo da repressão.
Esses foram os dias de milagre e encantamento.
Mas a tecnologia também parecia confusa. Havia tantas coisas novas – todos os anos, novos celulares com muito mais recursos, feitos por várias empresas, todas desenvolvendo aplicativos inéditos e supostamente revolucionários – que era fácil se deixar levar. Também era fácil enveredar pelo caminho errado. Não havia garantia de que esta ou aquela novidade durasse mais de um ano.
Assim, para tirar o máximo proveito das inovações e evitar apostar no cavalo perdedor, meu conselho aos leitores foi seguir estes passos:
Compre hardware da Apple, use os serviços on-line do Google e compre mídia digital da Amazon
Agora chegou a hora de alterar e atualizar esse conselho.
A indústria da tecnologia em 2018 é muito mais influente do que era em 2014. É maior, mais penetrante e mais perigosa, em todos os sentidos. E também é menos maleável à pressão exterior: as empresas que comandam o show estão mais poderosas do que nunca, e em muitos casos os governos – especialmente nos Estados Unidos – provaram ser ineficientes para reduzir os excessos.
Como você, um usuário ético e honesto da tecnologia, deve se orientar por essa indústria espúria? Ofereço três novas máximas para sobreviver à próxima era da tecnologia. Preste atenção nelas, pois o mundo se baseia em suas escolhas.
1. Não basta ver o produto. Analise o modelo de negócio.
Não muito tempo atrás – nos primórdios do smartphone, dos aplicativos móveis e da misteriosa “nuvem” –, sair em busca de nova tecnologia podia ser arriscado. Você corria o risco de comprar um celular ou um tablet cujo fabricante rapidamente iria à falência. Muitas coisas não funcionavam bem: fazer backup de seus dados era uma dor de cabeça, manter suas fotos organizadas em diferentes dispositivos era um pesadelo. E mesmo as tecnologias que funcionavam nos atormentavam com culpa e preocupação. Lembra-se da maldição do spam nos e-mails?
Algo estranho e inesperado aconteceu nos últimos cinco anos: várias coisas na tecnologia ficaram muito boas. Lenta e constantemente, muitos de nossos problemas básicos foram corrigidos. Nada é perfeito, mas, para a maioria das pessoas, a era dos dispositivos móveis trouxe simplicidade à tecnologia pela primeira vez.
Ética
Sua onipresença, porém, fez surgir uma nova questão: se tudo funciona, como você deve escolher o que comprar?
Meu conselho: não basta considerar o quanto um produto funciona bem. É preciso ver quem o está fazendo e como ele é distribuído. Antes de cair de cabeça em qualquer produto novo, considere a ética, a moral, a marca e as mensagens de uma empresa. Se não se sentir confortável, procure alternativas. (Em 2017, por exemplo, parei de usar o Uber e fui para a Lyft sem nunca olhar para trás.) O mais importante: quando você está escolhendo a tecnologia, é bom considerar o modelo de negócio – porque é na compra e venda de um produto, e não em sua utilização, que é mais fácil descobrir seus perigos.
Por exemplo: mesmo que a linha de telefones Pixel do Google seja muito boa – uma opção muito mais acessível com algumas características que os usuários do iPhone iriam adorar –, eu continuo com os telefones da Apple, porque gosto de sua simplicidade comercial. Pago caro à Apple por um dispositivo, e ela toma um cuidado extraordinário para me proteger de alguns dos piores flagelos digitais.
Não duvido da capacidade do Google de fazer grandes dispositivos. Mas, porque o Google ganha a maior parte de seu dinheiro com anúncios, e porque o negócio de anúncios na internet está no cerne de quase todas as coisas terríveis on-line, prefiro não enfiar o pé mais fundo na lama.
2. Evite alimentar os gigantes
Uma coisa que não mudou nos últimos cinco anos é quem comanda o show. Quando comecei a escrever esta coluna, a Apple, o Google, o Facebook, a Amazon e a Microsoft eram as maiores e mais influentes empresas de tecnologia. Hoje, os mesmos cinco gigantes estão na liderança.
Sempre combati esse tipo de concentração – o crescente domínio dos gigantes da tecnologia arruína a inovação, prejudica a escolha do consumidor e, geralmente, deixa a maior parte da indústria ingovernável. Os legisladores de todo o mundo percebem isso agora, e é possível que nos próximos cinco anos vejamos uma maior regulamentação para frear o aumento do alcance e do tamanho desses mostrengos.
Mas você não tem de esperar que os políticos tomem uma atitude. Suas escolhas como consumidor também fazem a diferença – e, para uma indústria de tecnologia melhor e mais saudável, o ideal é evitar fortalecer os gigantes de modo impensado sempre que possível. Se você pode optar por algo feito por um dos cinco grandes ou por alguma marca independente, escolha a independente.
Aqui está um exemplo: mesmo que eu goste do hardware da Apple e aprecie seu modelo de negócio, não utilizo a Apple Music, seu serviço de streaming por assinatura. Para mim, o Spotify é superior em quase todos os sentidos. O aplicativo funciona melhor (seu algoritmo da recomendação de músicas é estranhamente bom), lança recursos inovadores mais rapidamente e seu conteúdo pode ser reproduzido em mais tipos de dispositivos.
O melhor de tudo: o Spotify é uma empresa independente. Portanto, quando pago por isso, estou de certa forma espalhando a riqueza pela indústria.
3. Comece a usar mais tarde. Vá devagar.
Uma das razões pela quais a indústria tecnológica parece tão terrível agora é que muitas pessoas não percebem o poder coletivo de suas escolhas. Dez anos atrás, os smartphones pareciam aparelhos divertidos e as redes sociais eram um passatempo inofensivo – e poucos viram as implicações para a sociedade em sua onipresença, nem mesmo as pessoas comandando as empresas e fazendo essas coisas.
A lição da última década é que nossas escolhas em tecnologia podem alterar economias e sociedades. Elas fazem diferença, principalmente quando são adotadas com pressa, sem muita consideração, quando todo mundo parece estar entrando na onda da última novidade, porque é nesse momento que perdemos a noção dos riscos de nos entregarmos à tecnologia.
É por isso que a lição mais importante que tiro ao escrever este artigo é esta: vá mais devagar. Não mergulhe de cabeça na novidade. Se não estiver cheia de bugs ou problemas de segurança, outro risco inesperado provavelmente vai surgir – e, qualquer que seja o benefício em curto prazo, você pode acabar se arrependendo.
Sim, a tecnologia pode melhorar tudo. Mas devemos estar atentos para o modo como ela poderia piorar as coisas – como os carros autônomos poderiam induzir a expansão de centros urbanos, como a “internet das coisas” poderia provocar o apocalipse, como a mídia social poderia arruinar a democracia.
Esses são perigos improváveis? Talvez. Mas vivemos em tempos imprevisíveis. O improvável acontece. Tenha cuidado. Vá devagar.