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Transferência de renda

Governo já quis tributar cesta básica para ampliar Bolsa Família, mas ideia não avançou

Reoneração da cesta básica para repasse de recursos ao Bolsa Família não é novidade
Ideia de reonerar a cesta básica e repassar recursos ao Bolsa Família não é novidade. (Foto: Daniel Castellano/Arquivo/Gazeta do Povo/Arquivo)

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A sugestão do Tribunal de Contas da União (TCU), de voltar a tributar a cesta básica e assim repassar mais de R$ 30 bilhões para ações de transferência de renda, não é exatamente uma novidade. Acabar com as renúncias fiscais – totais ou parciais – de itens desse pacote já foi alvo de estudos detalhados da equipe econômica, que cogitou incluir o tema na primeira fase da reforma tributária e acabou voltando atrás.

O TCU avalia que o investimento em um programa focalizado, como é o caso do Bolsa Família, apresenta melhores resultados na transferência de renda e diminuição da desigualdade do que quaisquer ações de renúncia fiscal.

De acordo com o órgão, as isenções fiscais que afetam o pacote de produtos da cesta básica representaram o segundo maior gasto tributário (isto é, desoneração de imposto) do governo em 2019: foram R$ 32,3 bilhões, o que equivale a 10,46% de todas as renúncias. Esse valor é bastante próximo do que é reservado para ações do Bolsa Família, que custa, em média, R$ 30 bilhões por ano (ou 0,5% do PIB). Em 2021, a proposta de orçamento prevê avanço para R$ 34,8 bilhões.

Proposta de reoneração da cesta básica é avaliada desde o governo Temer

Técnicos que trabalham para o governo federal já vêm analisando a possibilidade de reoneração total ou parcial da cesta básica desde o governo Michel Temer (MDB). No ano passado, o Ministério da Economia publicou um estudo avaliando que a renúncia fiscal desses produtos, que custaram R$ 15,9 bilhões ao governo em 2018, beneficiava a parcela mais rica da população em vez de ajudar os mais pobres.

Ao longo dos anos, muitos alimentos tiveram isenções fiscais e foram incorporados à cesta básica. Fazem parte dessa lista queijo processado (como o da marca Polenguinho), leite fermentado (como o Yakult), caviar, salmão, queijo brie e até ovo de jacaré. A realidade é que esses itens não fazem parte do pacote de consumo das famílias mais carentes. Arroz, feijão, óleo de soja e carnes – itens que estão sofrendo mais pressão inflacionária neste 2020 – é que pesam mais no consumo das classes mais baixas.

A sugestão dos técnicos, naquele momento, era de reonerar parte dos produtos isentos da cesta básica, especialmente um conjunto de itens como queijos e outros derivados de leite, cujos gastos tributários foram estimados em R$ 1,18 bilhão em 2018. A reoneração restrita a alguns produtos – que representaria 2,3% da cesta consumida pelos 20% mais pobres e 11,2% da cesta dos mais ricos – permitiria que o governo repasses esses recursos para programa de transferência de renda como o Bolsa Família.

“A política de desoneração da cesta básica, apesar de regressiva, contribui para a redução da pobreza e da desigualdade de renda. No entanto, os benefícios seriam superiores se os recursos fossem realocados para políticas alternativas de transferência direta de renda, mesmo no caso de uma política de transferência igualitária de renda, sem qualquer focalização”, explicava a 11ª edição do boletim mensal sobre os subsídios da União, que avaliou a desoneração da cesta básica e foi publicado em 25 de setembro.

Plano era que reoneração entrasse na reforma tributária

O governo cogitou incluir a reoneração da cesta básica na proposta de reforma tributária enviada ao Congresso. Como a primeira fase do projeto cria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), basicamente a junção de PIS e Cofins em um único tributo do tipo IVA federal, havia espaço para discutir as renúncias fiscais de ambos, que acabam tendo reflexo forte na cesta básica.

“A desoneração da cesta básica é uma das maiores, se não a maior desoneração fiscal no caso do PIS/Cofins. Ela é uma desoneração muito alta, porque quando ela olha para os produtos a serem desonerados, ela acaba beneficiando pessoas de alta renda que compram, inclusive, muito mais esses produtos de melhor qualidade e maior preço do que as pessoas de baixa renda. Então, a revisão da cesta básica tem muito mais relação com não desperdiçar recursos públicos do que obviamente com prejudicar as pessoas de baixa renda”, defendeu a assessora especial do ministro Paulo Guedes, Vanessa Canado, em entrevista à GloboNews em janeiro.

Depois, o governo acabou optando por manter a isenção da cesta básica na primeira etapa da sua reforma tributária. Na ocasião, em julho deste ano, Canado explicou que a discussão da reoneração da cesta básica realmente sairia da reforma tributária, mas continuaria no radar da equipe econômica, podendo ser incluída na reformulação de programas de assistência social.

O governo vem discutindo há meses a reformulação do Bolsa Família. O objetivo geral é expandir a ação, atendendo também a parte do público que foi beneficiado pelo auxílio emergencial em 2020. O programa, que já foi chamado de Renda Brasil e agora é conhecido como Renda Cidadã, esbarra na questão do financiamento.

Para pagar uma bolsa maior – o objetivo é um valor médio mensal de R$ 300 ante R$ 190 desembolsados atualmente – e atender mais pessoas, o governo precisa fazer um remanejamento no orçamento e cortar gastos obrigatórios, para não estourar o limite imposto pelo teto de gastos.

Sem consenso, a proposta foi deixada de lado e não é mais comentada no alto escalão, que ainda espera a votação da PEC Emergencial e da proposta de Orçamento de 2021 para encontrar uma solução que permita viabilizar o novo programa.

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