A turbulência que ecoou da bolsa chinesa para o mundo sinalizou que o Brasil pode sofrer mais do que o previsto com a desaceleração do país asiático. O Brasil seria afetado não apenas porque a China consumirá menos e forçará a queda no preço de matérias-primas. O Brasil também tende a ser visto como um país mais arriscado.

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O economista José Júlio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), explica como o contágio tende a ocorrer. “Nesta segunda-feira, ficou claro que a desaceleração da China aumenta o mau humor em relação a todos os emergentes, e o Brasil, que tem a economia em recessão e a política fragilizada, vai ser visto com mais desconfiança ainda”, diz.

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Senna vem acompanhando o Dólar Index (indicador que mede o desempenho do dólar ante várias moedas), o risco Brasil e a variação do real. Ao longo de todo o ano de 2014 e no primeiro trimestre de 2015, não houve tendência definida entre eles. “Mas, a partir de 17 de julho, quando o presidente da Câmara anuncia o rompimento com o governo, passamos a sofrer com o ambiente político: o risco Brasil subiu e o dólar acompanhou”, diz Senna. “A desaceleração da China agrava o quadro.”

O mercado sinalizou que compartilha dessa percepção. Os contratos de proteção contra eventual calote brasileiro, os credit default swap (CDS), atingiram nesta segunda-feira (24) o nível mais alto desde 2009, acompanhando o movimento de aversão global aos risco. O CDS do Brasil de cinco anos atingiu 370 pontos-base, o nível mais alto desde 13 de março de 2009.

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Outro fator que preocupa é o preço das matérias-primas, que tende a ser afetado de diferentes maneiras. “Brasil e China vinham adotando modelos de crescimento quase opostos: no Brasil, prevalecia o consumo como motor, na China, o investimento; agora a China se volta para o consumo”, lembra Raul Velloso, especialista em contas públicas que acompanha o cenário internacional para medir os impactos sobre a economia local.

Por causa da virada, os produtos mais afetados são minerais e metais ligados a investimentos em infraestrutura, que arrefeceram, lembra Velloso. A Bolsa sinalizou quais setores são vistos como mais frágeis. A lista de maiores quedas na BM&F Bovespa nesta segunda foi encabeçada por Metalúrgica Gerdau PN (-12,46%), Usiminas PNA (-10,42%) e Oi PN (-9,67%). Vale ON recuou 7,78%, a R$ 15,40, e Vale PNA ficou 7,96% mais barata, a R$ 12,38. O preço do minério de ferro caiu 4,1% no mercado à vista chinês.

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Produtos agrícolas se mostraram mais resistentes. Contratos de soja na Bolsa de Chicago fecharam com leves baixas, mas podem se recuperar na visão de analistas. Alcides Torres Junior, diretor-fundador da Scot Consultoria, também descarta que as carnes sofrerão, ainda mais a carne brasileira. “Nossos produtos são mais baratos que os chineses.”

País está preparado para a volatilidade, diz Levy

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, disse nesta segunda-feira (24), em Washington que o período de volatilidade nos mercados globais era esperado pelo governo e que o Brasil está preparado para enfrentá-lo. “Nós já vimos esse filme antes”, disse Levy, ressaltando que os fundamentos da economia devem estar sólidos para o enfrentamento da turbulência internacional.

Segundo ele, parte desse esforço deve se refletir no envio ao Congresso de uma proposta orçamentária “robusta”, que dê confiança de que o governo cumprirá a meta de superávit primário para 2016 e terá recursos para cobrir suas despesas obrigatórias. Levy disse que não haverá aumento da Cide (imposto que incide sobre a comercialização de combustíveis), mas não descartou a possibilidade de elevação de outros tributos para geração de receita no próximo ano. “Estamos avaliando todas as alternativas.”

O ministro observou que é preciso ter disciplina nas despesas para minimizar a necessidade de aumento de impostos. Também defendeu a necessidade de reforma do Estado, de criação de uma gestão pública mais eficiente e de definição de despesas obrigatórias que não “asfixiem o governo”.

Principal fonte das incertezas que assombram os mercados globais, a situação da China está sendo acompanhada com “bastante atenção” pelo governo, disse. O ministro ressaltou que o país asiático passa por uma transição necessária de um modelo de crescimento excessivamente impulsionado por investimentos para outro dependente de mecanismos “mais tradicionais” de demanda.