O Twitter anunciou nesta quarta-feira (30) que proibirá todos os anúncios sobre candidatos, eleições e questões políticas importantes, como aborto e imigração. A mudança significativa na rede vem em resposta a preocupações crescentes de que políticos estariam se aproveitando do amplo alcance das mídias sociais para enganar eleitores às vésperas das eleições presidenciais de 2020, nos Estados Unidos.
O CEO do Twitter, Jack Dorsey, anunciou a mudança em uma série de tweets, enfatizando que pagar pelo discurso político tem o efeito de "forçar às pessoas mensagens políticas altamente otimizadas e direcionadas". A proibição marca uma ruptura com os "colegas" Facebook e YouTube, que defenderam suas políticas em relação a anúncios políticos nas últimas semanas.
"Embora a publicidade na internet seja incrivelmente poderosa e muito eficaz para anunciantes comerciais, esse poder traz riscos significativos para a política, podendo ser usado para influenciar os votos e afetar a vida de milhões", disse Dorsey.
O anúncio do Twitter diz respeito a conteúdos destinados a influenciar eleições, incluindo medidas em votação, bem como aqueles que abordam "questões de importância nacional". As novas regras serão aplicadas globalmente. Segundo Dorsey, as normas serão divulgadas em meados de novembro e entrarão em vigor no final do mês.
Repercussão
A mudança anunciada teve recepção mista, com alguns críticos destacando que a medida não afeta o que os usuários podem twittar e compartilhar por conta própria. Teddy Goff, que atuou como diretor digital do presidente norte-americano Barack Obama em 2012 e como consultor sênior de Hillary Clinton em 2016, classificou como insuficiente qualquer atualização no Twitter que não atenda à "disseminação orgânica e algorítmica do discurso de ódio, discriminação e desonestidade".
A proibição de anúncios políticos também pode ter pouco impacto em contas amplamente seguidas, incluindo as do presidente dos EUA Donald Trump, cujos tweets já alcançam mais de 66 milhões de usuários por dia. Mesmo assim, o gerente de campanha de Trump em 2020, Brad Parscale, criticou a empresa pela decisão. "É mais uma tentativa de silenciar os conservadores, já que o Twitter sabe que o presidente Trump tem o programa online mais sofisticado já conhecido", disse em comunicado.
Outra preocupação apontada é de que a decisão possa significar problemas para candidatos menos expressivos e que tenham menos seguidores. Para Daniel Kreiss, professor de mídia e jornalismo da Universidade da Carolina do Norte, os anúncios no Twitter são "uma das maneiras pelas quais os candidatos passam sua mensagem para um público cuja atenção é extremamente dividida e fragmentada".
Receitas ou princípios?
A decisão do Twitter demonstra uma brecha simbólica acentuada entre Dorsey e um de seus colegas, o CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, que também na quarta-feira (30) defendeu a política polêmica de sua empresa, que basicamente permite que os políticos mintam em anúncios. "Em uma democracia, não acho certo que empresas privadas censurem políticos ou as notícias", disse ele, ao enfatizar que uma gigante da tecnologia não deve atrapalhar o discurso dos líderes políticos.
Em paralelo a essa defesa, cabe lembrar que os anúncios representam dinheiro. Durante teleconferência, Zuckerberg estimou que a publicidade política no próximo ano representaria cerca de 0,5% da receita do Facebook. Com base em valores de 2019, a fatia equivaleria a pelo menos US$ 88,5 milhões.
Na quarta, os executivos do Twitter trabalharam para explicar sua decisão por uma questão de princípio, reconhecendo que os gastos com anúncios políticos chegavam a menos de US$ 3 milhões durante as eleições de meio de 2018. Jasmine Enberg, analista sênior da eMarketer, disse que é "provável que a publicidade política não faça parte crítica do core business do Twitter".
Como exemplo da diferença do peso dos anúncios em cada rede, Trump não publicou um único anúncio no Twitter nos últimos sete dias, enquanto gastou quase US$ 250 mil dólares no Facebook no mesmo período, de acordo com os arquivos das empresas.
Histórico difícil
Há tempos que a publicidade política é uma questão espinhosa para o Vale do Silício: um lucro potencial que tem custado caro nos últimos anos. Durante as eleições de 2016, agentes vinculados ao governo russo compraram tweets impulsionados e outras formas de anúncios online como parte de sua campanha para alimentar discórdia política, promover o então candidato Trump e prejudicar a democrata Hillary Clinton, de acordo com investigadores do Congresso americano.
À época, os reguladores responderam criticando sites de mídia social por não conseguirem identificar tais esforços de uma potência estrangeira para interferir nas eleições dos EUA. Aquela pressão resultou em grandes mudanças - incluindo esforços do Twitter e de outros países para rotular mais claramente os anúncios políticos e verificar as pessoas que os compram. Ainda assim, os legisladores ameaçaram aprovar novas leis, argumentando que os anúncios online estavam sujeitos a muito menos regras e menos restritivas do que as de transmissão televisiva.
Em seus tweets com o anúncio da proibição, Dorsey endossou os pedidos de novas regras federais. "Os requisitos de transparência de anúncios são progresso, mas não o suficiente", escreveu ele. "A internet oferece recursos totalmente novos e os reguladores precisam pensar além dos dias atuais para garantir condições equitativas", concluiu o CEO.