Está praticamente fechado: O Brasil deve mesmo adotar o padrão japonês para a tevê digital. Conhecido como ISDB (Integrated Services Digital Broadcast), o modelo é o preferido do Ministro das Comunicações, Hélio Costa, e das grandes redes de televisão brasileiras. Mas a visita ao país, esta semana, do comissário de comércio da União Européia, Peter Mandelson, promete embolar o meio de campo até a decisão definitiva.
Mandelson, que circulará por São Paulo, Ribeiro Preto e Rio de Janeiro de amanhã até o dia 1.° de abril, pretende usar suas últimas cartas em defesa da adoção do modelo europeu, o DVB (Digital Video Broadcast). A questão da tevê digital é o principal motivo da vinda do comissário, que deve se reunir com os ministros Celso Amorim (Relações Exteriores) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento) no sábado. Antônio Palocci (Fazenda), que pediu afastamento ontem, também participaria da reunião.
Na semana passada, o comissário criticou publicamente a opção brasileira pelo sistema japonês, que, de acordo com ele, pode "isolar" o país em relação ao resto do mundo. Seu argumento é, no mínimo, digno de atenção. Afinal, o DVB é utilizado em mais de 50 países, incluindo toda a Europa, Austrália, Nova Zelândia e Índia enquanto o ISDB é adotado somente no Japão.
O Planalto, é claro, não gostou da declaração de Mandelson. Para Hélio Costa, seu alerta não passa de "balela" e "blefe". "Eles (os europeus) é que vão acabar ficando isolados porque estão vendendo um sistema que não funciona nem para eles", respondeu o ministro, referindo-se aos testes insatisfatórios realizados recentemente com o DVB em São Paulo.
Aliás, Costa e um grupo de ministros estão de viagem marcada para a Ásia, daqui a duas semanas, para discutir a possibilidade de implantação de uma fábrica de semicondutores matéria-prima para microchips no Brasil. Atualmente, o país não produz esse tipo de produto e gasta cerca de US$ 2,5 bilhões por ano só com importações (quase metade dos US$ 5,2 bilhões desembolsados na compra de equipamentos e componentes eletrônicos).
Para o governo, a implantação de uma fábrica de semicondutores representa mais do que uma economia na balança comercial: seria a prova de que o Brasil entrou de vez na era da tecnologia da informação. Por isso sua instalação é a condição estabelecida na escolha do padrão. De acordo com o ministro das Comunicações, os detentores do sistema escolhido deverão investir entre US$ 400 milhões e US$ 500 milhões na fábrica.
Não existe um prazo formal para a escolha entre os três sistemas (há ainda o padrão norte-americano, ATSC, praticamente fora do páreo por conta dos baixos investimentos prometidos pelos EUA). Mas, em ano eleitoral, está claro que o governo preferiu ter o apoio das redes abertas de televisão, entusiastas do ISDB. As emissoras defendem o padrão japonês porque ele impede a entrada de novos concorrentes no mercado, como as empresas de telefonia e outras operadoras. Ou seja, é o que menos afeta o seu atual modelo de negócios.
Por essas e outras, um grupo de ONGs, associações e movimentos sociais vem pedindo o adiamento da escolha para depois das eleições. As entidades também querem que o sistema de exploração da tevê digital seja debatido por meio de um projeto de lei, e não definido por decreto. Seja como for, um aspecto ainda carece de debate: o modelo de conteúdo, que é o que mais importa para o telespectador.
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