Classe C

Eles vão precisar de ajuda

O sócio-diretor da Data Popular, empresa de pesquisa e consultoria sobre mercado popular no Brasil, Renato Meirelles, chama a atenção para o despreparo dos funcionários dos aeroportos em atender passageiros de primeira viagem. "É normal que, nesse caso, tudo demore mais: check-in, revista eletrônica, tudo. A prática que está se tornando comum nos aeroportos é o encaminhamento para o check-in automático, nos totens instalados no saguão, o que piora o transtorno", afirma.

Ele lembra que 80% das viagens das classes da base da pirâmide social têm foco em lazer. Apenas uma pequena parte tem motivação dividida entre trabalho, saúde, compras e outros. "A maioria viaja a lazer, para visitar a família. Não podemos esquecer que em São Paulo, por exemplo, há 5,5 milhões de nordestinos. São contingentes como estes que estão movimentando os aeroportos", diz Meirelles.

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Oferta de assentos cresceu mais devagar

Os dados mais recentes da Anac sobre tráfego aéreo e ocupação dos aviões mostra que as empresas aéreas não estão conseguindo elevar a oferta de assentos na mesma velocidade com que a demanda tem crescido. A consequência disso é voos mais lotados e uma maior pressão sobre a infraestrutura aeroportuária, além de uma tendência ao aumento de preços.

Na comparação de janeiro a outubro deste ano com o mesmo período de 2009, a oferta cresceu 17,92% nos voos domésticos, enquanto que o número de passageiros transportados cresceu 25%. No transporte internacional, a diferença é ainda maior: a oferta de assentos cresceu 8%, enquanto que o número de passageiros transportados elevou-se em 21,3%. Esse dado, entretanto, limita-se às empresas brasileiras que operam voos internacionais – Gol, TAM e algumas outras companhias, que fazem voos fretados. Empresas estrangeiras, como Air France, American Airlines ou Iberia, não entram na estatística.

O descompasso entre oferta e demanda ocorre em todas as grandes empresas áreas nacionais. A maior diferença ocorreu com a Webjet, que elevou em 48,7% a oferta de assentos, e em 76,5% a quantidade de passageiros transportados. A empresa teve diversos voos cancelados em fins de setembro, devido à falta de tripulantes. A situação obrigou a Anac a suspender a venda de bilhetes por parte da empresa.

Franco Iacomini

A um mês das festas de fim de ano, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) se reúne hoje às pressas com os principais representantes do setor em iniciativa que especialistas em aviação consideram positiva, porém tardia. No quadro que pode levar a mais filas e atrasos nos aeroportos brasileiros, falta coordenação entre o Estado e as empresas, infraestrutura, mão de obra, e sobram pressões mercadológicas das companhias aéreas, opinam.

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No encontro deve ser apresenta­­do um plano de ação desenvolvido pe­­la agência e pelas empresas, em con­­junto. As medidas teriam validade de meados de dezembro até 10 de janeiro, e envolverá os princi­­pais aeroportos do país. Segundo in­­formações preliminares, as em­­presas colocarão aviões-reservas em alguns aeroportos, para atender a situações de emergência. A TAM, por exemplo, terá cinco aeronaves disponíveis para voos de curta e média distância, e outras três a postos para viagens internacionais. A companhia selecionou ainda terminais alternativos para desviar tráfego – Curi­­tiba, Ribeirão Preto, Cam­­pinas, Con­­fins e Galeão. O objetivo é evitar a formação de gargalos que le­­vem a atrasos em cadeia por todo o país.

Exercício

"Esta reunião tem um supermérito como exercício, mas revela uma visão de curto prazo. Estão mirando o mês que vem, e não os próximos 18 ou 60 meses. O que era para ser feito de forma estratégica, estrutural, é feito como se fosse para apagar um incêndio", diz o professor do MBA em logística da Fundação Getulio Vargas (FGV) Marcio Nobre Migon.

Uma Anac mais atuante na área fiscalizadora, com multas e punições para atrasos e cancelamentos é uma das urgências do setor para outro especialista do setor. "A aviação brasileira vai crescer enormemente e precisa ser reordenada. Isso passa por um esforço de planejamento e articulação com as companhias aéreas, mas sem ceder aos interesses do mercado. Este é um setor muito sujeito a abusos, e a reunião é oportuna para colocar as coisas nos eixos", diz o professor da Univer­­sidade Federal Fluminense (UFF) Marco Aurélio Cabral.

Estudo da consultoria Lafis mostra que o número de passageiros em voos aéreos nacionais e internacionais deve subir 32% neste ano em comparação a 2009. A consultoria projeta um cenário de atrasos em voos pelo menos até 2012. "A classe emergente intensificou o problema; mas, mesmo sem ela, já haveria uma probabilidade grande de atrasos nos voos, por causa do desenvolvimento natural do setor", explicou o analista Jonas Okawara, da Lafis.

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Voos extras

Uma das questões que, segundo o ministro da Defesa, Nelson Jobim, será discutida na reunião é a venda excessiva de passagens. Foram vendidas milhares de passagens para voos extras ainda não autorizados, num compromisso das companhias que pode não ser cumprido. Outro problema grave é a escassez de mão de obra especializada, com companhias excedendo o limite de horas de voos permitido para pilotos e copilotos.

Além da Anac, estarão presentes no encontro de hoje representantes do Ministério da Defesa, da Empresa Brasileira de Infraestru­­tura Aeroportuária (Infraero), presidentes das principais companhias aéreas, Polícia Federal, Receita Federal e Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea).

Apesar de a reunião ter sido convocada às pressas, Jobim assegurou na sexta-feira que o sistema aéreo está sob controle e disse não haver preocupações para a Copa do Mundo em 2014. Ele também lembrou que, no ano passado, a imprensa noticiou análises de especialistas prevendo caos aéreo durante o período de eleições e Páscoa, mas "não houve loucura nenhuma, problema nenhum". "Não tem perigo, está tudo sob controle", afirmou.

Perda de qualidade

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Mas atrasos, filas e cancelamentos de voos são esperados por especialistas. Okawara, da Lafis, disse ser preocupante o cenário atual, especialmente com a proximidade da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada em 2016. "Esse é um problema cuja solução passa não só pela esfera econômica, mas também pela esfera política", disse. "A regulação por parte da Anac deveria ser melhorada, com poder maior de contro­­le sobre a oferta e sobre a demanda por voos", acrescentou.

Para Cabral, esta não é uma discussão de instabilidade do setor, e sim sobre qualidade."Não diria que vamos ter um 'caos', mas sim uma perda de qualidade mais acentuada. Mas essa perda de qualidade já está acontecendo, está bem aquém do que mereceríamos. Precisamos acreditar menos na concorrência das empresas", disse.