Concessão
Para Economist, modelo cria armadilha
Em reportagem que começa a circular neste fim de semana, a revista britânica The Economist classifica o leilão de Libra como uma "decepção" e diz que a obrigação para a Petrobras de operar em todas as áreas do pré-sal com uma participação mínima de 30% criou uma armadilha para a companhia.
A publicação ressalta a situação complicada que vive a empresa, com a Petrobras perdendo quantias expressivas de capital em meio à importação de derivados de combustível, enquanto tem que repassá-los por preços mais baixos no Brasil como forma de o governo diminuir pressões sobre a inflação.
Para a Economist, a menos que as regras de licitação sejam alteradas para o próximo leilão do pré-sal, em 2015, a empresa pode se ver comprometida com um negócio caro, que não teria escolhido livremente.
O jornal Financial Times, por sua vez, ressalta que a Petrobras está realizando o maior programa de investimento empresarial do mundo e que tem um dos maiores níveis de endividamento do mundo para rolar. Ao mesmo tempo, tem tido de se adaptar às necessidades do governo, subsidiando extraoficialmente os preços dos combustíveis. Assim, segundo a publicação, suspeita-se que o governo esteja pressionando demais a Petrobras.
O leilão do primeiro bloco do pré-sal, a reserva de Libra, realizado na última segunda-feira, levantou o debate sobre o modelo de partilha e a capacidade financeira da Petrobras de fazer frente aos investimentos previstos.
O primeiro desembolso será o bônus exigido de R$ 6 bilhões para a exploração do campo. O valor deve ser pago ao governo à vista, dentro de 40 dias. A presidente da Petrobras, Graça Foster, descartou, na semana passada, a possibilidade de aumentar o combustível para fazer frente à necessidade de recursos da empresa, mas o fato é que o leilão ocorre no pior momento financeiro da estatal.
Pressionada por manter uma pesada estrutura de investimentos e pela necessidade de segurar reajustes de preços da gasolina como forma de o governo controlar a alta da inflação , a empresa exibe hoje uma situação de caixa menos favorável, com alto endividamento.
Recentemente, o Bank of America Merrill Lynch tornou público um relatório em que classifica a dívida da Petrobras como a maior do planeta entre as empresas de capital aberto não financeiras. No último trimestre, os compromissos somavam US$ 112,7 bilhões, contra US$ 104 bilhões da China State Grid.
Desembolsar R$ 6 bilhões exigirá esforço. O valor equivale ao bônus de assinatura referente à participação de 40% da empresa no consórcio vencedor, que tem ainda como sócios a Shell e a Total (cada uma com 20%) e as chinesas CNPC e CNOOC, cada uma com 10%. O valor total do bônus no consórcio será de R$ 15 bilhões.
Ao contrário do que se chegou a cogitar, as sócias chinesas não vão financiar parte do bônus da Petrobras em troca de petróleo. A empresa terá de arcar sozinha com o compromisso.
Mas a questão, segundo alguns analistas, é a capacidade no médio prazo. A Petrobras tem cerca de R$ 60 bilhões em disponibilidade de curto prazo para investimentos. O campo de Libra exigirá US$ 80 bilhões em dez anos desses, 40% serão bancados pela Petrobras. Os investimentos no campo se somarão aos US$ 236,7 bilhões já projetados em investimentos pela companhia até 2017.
"O ponto principal não é se a empresa vai pagar os R$ 6 bilhões de bônus. É como ficará a estratégia financeira e a política de reajuste de preços da companhia no médio prazo, já que a empresa terá uma agenda pesada de investimentos", diz Marcelo Torto, analista chefe da corretora Ativa. Embora o novo patamar do câmbio entre R$ 2,16 e R$ 2,18 tenha reduzido a defasagem entre os preços internacional e doméstico do petróleo, a questão do reajuste ainda está na pauta.
Para a Ativa, porém, dificilmente a empresa terá problemas para se financiar. A agência de classificação de risco Standard & Poors afirmou que os ratings atribuídos à Petrobras não serão afetados pelo leilão de Libra.
Formato de leilão agradou governo e irritou analistas
Como era de se esperar, o resultado do leilão foi elogiado pelo governo, mas o formato de Libra dividiu opiniões no mercado. A ausência de ágio a proposta ficou no lance mínimo e a grande presença da Petrobras na condução do negócio (a estatal vai controlar as operações, o que significa definir o ritmo de exploração, a origem e o destino das encomendas) irritou os que defendem a participação maior do mercado. Por outro lado, quem quer um estado mais forte não gostou da entrada de capital privado na exploração da maior jazida de pré-sal já identificada.
Para o professor de direito regulatório da Universidade Gama Filho, do Rio de Janeiro, José Vicente de Mendonça, a única conclusão que se pode tirar no momento é que o leilão não foi muito eficiente em promover a competitividade, já que houve apenas um lance. "Trata-se de um modelo bastante intervencionista, mas ele não é necessariamente bom ou ruim. Há outros países que adotam modelos tanto ou mais intervencionistas", afirma. Segundo ele, os investidores resolveram "entrar mais devagar" porque ainda não se sabe como será a atuação, na prática, da PPSA, nova subsidiária da Petrobras que vai ficar responsável pela operação. "Como se trata do primeiro leilão, ainda não há experiência para saber como será, por exemplo, a gestão de ativos da empresa", acrescenta.
Ponderações
O ponto positivo do leilão, segundo a consultoria LCA, foi que a Petrobras ficou com uma participação no consórcio inferior ao esperado. Os investidores previam que ela poderia ter que ficar com mais de 50% do consórcio no leilão, o que forçaria uma política de desembolsos ainda mais agressiva. Como é uma sócia obrigatória, a empresa pode se ver obrigada a entrar em um negócio em que um terceiro escolha sua margem de lucro.
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