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Uma lição de Davos: o Brasil precisa criar as próprias condições de atração

Presidente Jair Bolsonaro em raro momento de conversa com a imprensa durante o Fórum Econômico de Davos. | FABRICE COFFRINI/AFP
Presidente Jair Bolsonaro em raro momento de conversa com a imprensa durante o Fórum Econômico de Davos. (Foto: FABRICE COFFRINI/AFP)

Nesses dias que passaram, Davos nos mostrou que em um ambiente global de relativo pessimismo atrair confiança e investimentos para o Brasil não é tarefa trivial.

Talvez por isso o presidente, Jair Bolsonaro,  em sua apresentação optou por jogar para não errar. Não quis entrar em bola dividida e não arriscou argumentações mais elaboradas sobre a agenda econômica do país, preferindo reafirmar as bases políticas que firmou para sua gestão.

Tendo Bolsonaro falado bem, mal ou neutro (todos os tipos de avaliação foram feitas nos últimos dias), o que de fato importava para muitos dos presentes neste fórum mundial eram as palavras que viriam do Ministro da Economia, Paulo Guedes. Dele se esperava a revelação da narrativa que a equipe econômica  planeja para os próximos meses.

Guedes não deu cronogramas, mas foi firme em sua fala quando mencionou que a reforma da previdência é imperativa, prioritária e não será frouxa.

Mais que colocar esses pontos, foi o tom enfático e positivo de Guedes que animou o mercado.

A pergunta agora evolui para a questão: quando o congresso reabrir as portas no início de fevereiro, o grosso da proposta estará à frente da base aliada? Se sim, o otimismo continuará firme e forte. Caso contrário, a pressão por mais detalhes voltará à tona.

Vimos um ministro à vontade naquele ambiente e colocando mais alguns objetivos que estão claros para ele, como o desejo de participar da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o que representaria um golaço para sua administração.

Importante levar em consideração que Davos não carrega mais a relevância política de outros anos. As ausências de Donald Trump, Xi Jinping, Emmanuel Macron, Theresa May e Narendra Modi empobreceram politicamente o evento e mostram que a era do “cada um por si” pode estar cada vez mais próxima. Os EUA, por exemplo, não enviaram representante governamental algum. O simbolismo por trás de Davos se encontra em um momento bem distinto.

Com a crise do liberalismo, pragmaticamente o evento tem se voltado à discussão de temas globais sob a ótica do seu impacto nas oportunidades de negócios.

O Brasil está volta ao centro das atenções do mercado mundial como uma oportunidade a ser explorada dada a expectativa de desaceleração do crescimento econômico global, que pode se acentuar a depender dos desdobramentos da guerra comercial entre EUA e China, Brexit, e a evolução da economia chinesa.

Poucos países desfrutam de uma esperança de crescimento contingente em grande medida de decisões de seu próprio governo e de um governo que acaba de se eleger com grande apoio popular.

A postura firme de Guedes de não abrir mão de certas convicções liberais foi bem recebida e lhe valeu um saldo positivo em Davos. Mas o país precisará ir além das expectativas do mercado e cumprir com as reformas estruturais prometidas.

Para poder “inundar” o Brasil com investimentos, uma trinca de ouro foi jogada na mesa: reforma da previdência, privatizações e reforma tributária.

Essa trinca ainda foi acompanhada de opiniões aqui e acolá sobre reforma fiscal e desburocratização.

As engrenagens têm de avançar e rapidamente. Se chegarmos até 2 de fevereiro sem que o projeto da reforma da previdência não tenha data para ser divulgado e encaminhado, o mercado receberá como um malogro do governo.

Dependemos mais do que nunca de nossas próprias decisões e Davos deixou isso muito claro. A China, por exemplo, pode se ver obrigada a compensar os EUA com importações de soja. Nesse cenário, ser atraente não é mais ter o produto, mas ter a melhor estrutura regulatória e legal para que o mercado global se convença de que o Brasil, esse Brasil, realmente vale a pena.

*Thiado de Aragão é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Johns Hopkins, pesquisador sênior do Instituto Francês de Relações Internacionais e diretor de Estratégia da Arko Advice.

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