Em busca de uma resolução para um problema, o governo criou outro. Ao informar, na segunda-feira, que usaria R$ 3,5 bilhões em recursos aplicados no Fundo Soberano do Brasil (FSB) para pagar parte dos juros da dívida pública, o governo queria evidenciar ao mercado que será cumprida a meta do chamado superávit primário deste ano. A manobra curiosa, no entanto, tem sido criticada internamente e o governo está longe de um consenso sobre o uso do FSB nesse malabarismo fiscal.
Há divisões claras no governo. Uma parte da equipe econômica tem argumentado nos bastidores que o governo deve manter os recursos do Fundo Soberano como estão, isto é, aplicados nos papéis do BB e simplesmente assumir que a meta fiscal não será cumprida. Neste caso, o calendário é favorável: como o resultado final das contas públicas só é conhecido em janeiro do ano seguinte, essa admissão ficaria para a nova equipe, em caso de segundo mandato, ou para um novo governo.
O governo será obrigado a revisar a estimativa para o déficit da Previdência Social. No último relatório orçamentário, a previsão foi levemente elevada a um rombo de R$ 40,6 bilhões. Este número no entanto, continua fora da realidade, segundo especialistas em contas fiscais. Técnicos do próprio governo, como informou o jornal O Estado de S. Paulo em agosto, já admitem que o déficit será muito superior, e deve rondar R$ 55 bilhões. Essa "piora" da Previdência colocará em xeque a meta fiscal, e, para o grupo que defende a manutenção do Fundo Soberano como está, os R$ 3,5 bilhões que seriam sacados em nada ajudariam.
Outro grupo no governo, no entanto, entende o oposto. Em 2012, o governo lançou mão pela primeira vez do Fundo Soberano, como forma de atingir a meta fiscal. Nos últimos dias daquele ano, o Tesouro montou uma triangulação que envolveu a passagem de R$ 12 5 bilhões em ações da Petrobras de posse do Fundo Soberano para o BNDES e, deste, para a Caixa. Feita no apagar das luzes e com pouca transparência, essa triangulação foi duramente criticada pelo mercado e por investidores, que apelidaram o expediente de "contabilidade criativa".
Com menos dinheiro no caixa do Fundo Soberano, justamente por conta da operação de 2012, uma parte relevante dos técnicos entende que a operação deve ser repetida. Até dezembro, se as ações do BB se valorizarem, a fatia hoje estimada em R$ 3,5 bilhões pode ser elevada e, assim, "ajudar" ainda mais o fraco esforço fiscal registrado em 2014.
O jornal apurou que a própria presidente Dilma Rousseff intercedeu na discussão entre técnicos e autoridades dos ministérios da Fazenda e do Planejamento, além do Tesouro Nacional, sobre a inclusão da operação no relatório de despesas e receitas orçamentárias, divulgado na última segunda-feira.
Dilma foi favorável à ideia de usar os R$ 3,5 bilhões do FSB, atualmente aplicados em ações do Banco do Brasil (BB), para reforçar o superávit primário. Mas, para isso, o governo terá que montar uma estratégia para se desfazer dessa quantidade de ações ON (com direito a voto) do banco público.
Um movimento de venda imediatamente reduziria e o valor das ações do BB em razão da grande oferta. Dificilmente, porém, a União abriria mão desse ativo. Mas mesmo que vendesse, sua participação no BB não seria reduzida porque as ações já não entram na conta desde que passaram ao Fundo Soberano. Procurado, o BB não se pronunciou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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