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Câmbio

Por que o real está ganhando força contra o dólar, e o que esperar daqui em diante

(Foto: Pixabay)

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A taxa de câmbio caiu 16% desde o início do ano, de acordo com dados do Banco Central. A cotação média do dólar comercial na última sexta-feira (1.º) foi de R$ 4,69, quase R$ 0,90 abaixo da registrada no fim de 2021. A valorização do real está sendo impulsionada pelo fluxo de capitais em direção ao Brasil.

Nos três primeiros meses do ano, as entradas líquidas (compras menos vendas) de recursos estrangeiros foram de R$ 64 bilhões na B3. Até o dia 18, o movimento de câmbio contratado era comprador em US$ 9,45 bilhões, 54% mais do que o registrado em todo ano passado, segundo o BC.

Uma série de fatores explica este movimento, apontam especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo:

  • os juros em patamares elevados deixam o país mais atraente para o investidor estrangeiro;
  • as perspectivas de novas altas na taxa básica de juros, a Selic;
  • países que concorrem com o Brasil na atração de capitais estrangeiros, como a Rússia e a Turquia, apresentam risco mais elevado; e
  • os papéis brasileiros, especialmente as ações, estão oferecendo uma relação favorável entre risco e retorno.

O especialista em renda variável do grupo Aplix, Kaue Franklin, aponta que há papéis valendo menos que o caixa das empresas. Ações de empresas de commodities e do setor financeiro são tradicionalmente usadas como forma de proteção por parte dos investidores.

E a alta dos preços das commodities também contribui para a valorização do real, segundo Carlos Macedo, especialista em alocação de investimentos da Warren. “Isso favorece a entrada de dólares na economia brasileira e amplia o faturamento das empresas exportadoras."

Alef Dias, especialista em macroeconomia e grãos da hEDGE Point Global Markets, lembra que os estoques de soja e milho estão bastante apertados e a quebra da produção no Sul do Brasil contribuiu para elevar os preços das matérias-primas.

O que também está ajudando, segundo ele, é a questão fiscal. A arrecadação de tributos federais atingiu R$ 148,7 bilhões em fevereiro, com alta real (descontada a inflação) de 5,3%, em comparação com mesmo mês de 2021. É o melhor resultado para esse mês desde o início da série histórica, em 1995.

No acumulado do primeiro bimestre, o crescimento real foi de quase 13% em comparação a igual período do ano passado, aponta a Secretaria da Receita Federal.

As contas do governo central – que incluem Tesouro Nacional, Previdência e Banco Central – fecharam com um déficit de R$ 20,6 bilhões em fevereiro. É o menor, em termos reais, para este mês, desde 2015. No ano, as contas têm saldo positivo de R$ 56 bilhões.

O diretor de câmbio da corretora Ourominas, Mauriciano Cavalcante, diz que este cenário todo injeta mais confiança no investidor externo. “No exterior, há mais confiança no Brasil do que no ano passado.”

Segunda valorização do real em 12 meses

A alta do real frente ao dólar neste ano é o segundo movimento de valorização nos últimos 12 meses. Entre o fim de abril e o fim de junho do ano passado, o câmbio passou de R$ 5,404 para R$ 4,942, o que representa uma alta de 9,34% para o real.

São cenários completamente diferentes, diz Macedo: “No ano passado havia uma perspectiva de um crescimento mais resiliente. O panorama embaralhou a partir do segundo semestre, com a discussão do teto de gastos”.

Dias destaca que outro fator que contribui para o atual movimento é o grau de aperto monetário, que é maior.

Entrada de capitais tende a continuar nas próximas semanas

A expectativa dos analistas é de que, pelo menos, no curto prazo, o movimento de capitais em direção ao Brasil persista. Agora, segundo Macedo, há um nível de juro mais elevado e o preço das ações está extremamente atraente. “Os ativos brasileiros oferecem melhor remuneração. É um fluxo mais resiliente.”

Anilson Moretti, head de câmbio da HCI Invest, acredita que um patamar a ser testado nas próximas semanas é o de R$ 4,65 a R$ 4,67. A moeda norte-americana tem oscilado na casa dos R$ 4,70 desde a semana passada.

Cavalcante prevê, diante desse cenário de maior confiança do investidor estrangeiro, que o dólar possa recuar até R$ 4,60. “Até, porque, na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) teremos uma nova alta na taxa Selic.”

O que pode atrapalhar o avanço do real frente ao dólar, segundo os analistas, é a intensificação da guerra da Ucrânia, o que no momento parece estar mais distante; uma aceleração da alta nos juros nos Estados Unidos, que enfrenta a maior inflação em 40 anos; e o desenrolar do processo eleitoral.

Um dificultador, de acordo com Macedo, em relação à questão eleitoral seria a falta de sinalização de políticas pró-mercado. E, tradicionalmente, anos de eleições gerais são períodos de valorização da moeda norte-americana. “Não vai ser diferente em 2022”, destaca o executivo da Ourominas. Ele projeta que depois do processo eleitoral haverá uma tendência à estabilização do câmbio.

Dias, da hEDGE Point Global Markets, tem outra visão. Ele não vê tanto problema nas eleições, porque os dois candidatos que lideram as pesquisas não são novos. “Eles já adotaram algumas medidas de ajuste fiscal em seus mandatos”, diz ele, que não acredita que o dólar caia abaixo de R$ 4,50.

Nas últimas semanas, bancos e consultorias têm revisado para baixo suas projeções para o patamar em que estará o câmbio ao fim deste ano. Apesar da queda, o consenso do mercado ainda embute a perspectiva de uma alta do dólar (ou seja, desvalorização do real) daqui em diante. No início de fevereiro, a mediana das estimativas coletadas pelo Banco Central indicava cotação do dólar em R$ 5,60 ao fim do ano. Agora, o ponto médio é de R$ 5,25.

Nas previsões mais otimistas, porém, houve uma mudança mais significativa. A projeção mais baixa coletada pelo BC no começo de fevereiro era de dólar em R$ 5,10 ao fim do ano; agora é de R$ 4,20.

Os impactos da valorização do real na economia brasileira

Até agora, segundo os analistas, a valorização do real tem inibido maior aceleração nos preços. Mas as expectativas de inflação vêm aumentando nas últimas 11 semanas, segundo o relatório Focus, do BC. O ponto médio está em 6,86%. Quatro semanas antes estava em 5,60%.

Moretti aponta que antes, o dólar era a principal fonte de preocupação. Agora, é o preço do barril do petróleo, na faixa de US$ 120 por barril, e o das commodities.

“Há um arrefecimento das pressões inflacionárias. A importação de bens de capital e de insumos se torna mais barata e tende a haver maior oferta de produtos domésticos”, explica Macedo, da Warren.

Dias não prevê muitos impactos sobre as exportações. Tradicionalmente, momentos de valorização da moeda tornam menos competitivas as vendas para o exterior. “É que a maioria dos negócios envolve commodities e o balanço entre oferta e demanda está apertado.”

Por outro lado, pelo fato de as expectativas não sinalizarem um grande crescimento da economia – a mediana das projeções no relatório Focus, do BC, aponta para um crescimento de 0,5% neste ano –, não deve haver impacto sobre as importações, destaca o especialista da hEDGE Point. “Os termos de troca (relação entre exportações e importações) estão mais favoráveis em 2022.”

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