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O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo, que pediu vista e ganhou mais 20 dias para analisar o processo de privatização da Eletrobras, alegando que o preço mínimo definido para a ação da estatal no aumento de capital está subestimado, é, como se costuma dizer, uma velha raposa da política nacional.
Integrante de uma tradicional família política paraibana, ele foi deputado federal e senador da República entre 2007 e 2014. Vital do Rêgo foi citado na Operação Lava Jato, enfrentou uma denúncia por caixa dois e por recebimento de propina e foi um dos votos favoráveis no processo que resultou no impeachment da presidente Dilma Rousseff.
O TCU analisa a venda da Eletrobras desde setembro do ano passado. A primeira etapa do processo – que aprovou, entre outras coisas, o valor de R$ 67 bilhões de outorga – foi aprovada em 15 de fevereiro. O pedido de vistas de Vital do Rêgo impede, por falta de tempo hábil, que a venda da estatal seja feita em 13 de maio, como queria o governo.
A equipe econômica preferia finalizar o processo o quanto antes, para evitar a proximidade do período eleitoral, que eleva a incerteza sobre operações desse tipo. Agora, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, diz que a privatização deve ocorrer até julho.
Se concretizada, a venda da Eletrobras será a maior privatização do governo Bolsonaro. Até agora, a única estatal de controle direto da União já repassada ao setor privado foi a Companhia de Docas do Espírito Santo (Codesa), leiloada no fim de março. Outras empresas vendidas foram subsidiárias de "estatais-mãe". Em paralelo, o BNDES se desfez de participações em várias empresas, e o governo leiloou concessões de dezenas de ativos.
Paulo Guedes criticou tentativa de paralisar privatização
Na semana passada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez referência a rumores de que Vital do Rêgo estaria atrasando o processo da privatização da Eletrobras a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato do PT à presidência da República.
"Um candidato, em vez de fazer o seu programa e enfrentar o nosso presidente nas urnas, fica ligando para ministro do TCU pressionando e tentando paralisar uma pauta aprovada pelo Congresso. A solução foi construída com o TCU ao longo de dois anos e meio. Como é que pode querer melar uma desestatização?", disse o ministro.
A fala de Guedes foi rebatida por Vital do Rêgo. "No TCU, temos o hábito de julgar gestores que abandonam um planejamento mínimo para fabricar situações emergenciais que dispensam a Lei de Licitações e as regras concorrenciais, e invariavelmente atentam contra os cofres públicos", disse o ministro do TCU à Folha de S.Paulo. Vital do Rêgo disse ainda que conhece "pressões exógenas e poderosas sobre a Corte, que nunca se curvou ante essas ações".
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Vital do Rêgo vem de tradicional família política paraibana
Antônio Vital do Rêgo Filho é formado em Medicina pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), onde também foi professor de Direito Eleitoral entre 1992 e 1995.
Pertence a uma tradicional família política paraibana. Segundo o Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da Fundação Getulio Vargas (CPDoc/FGV), seu pai Antônio Vital do Rêgo foi deputado estadual (1959-1962) e federal (1962-69 e 1990-94). Foi também secretário da Justiça da Paraíba (2003-2009) e da Articulação Governamental (2009-10).
O tio-avô Argemiro de Figueiredo foi governador e interventor da Paraíba (1935-1940), deputado federal (1946-51) e senador (1955-71).
O irmão, Veneziano Vital do Rêgo, foi eleito vereador em Campina Grande (1996-2003) e foi prefeito da cidade (2004-2011). Em 2014 foi eleito deputado federal e em 2018, senador.
A trajetória política de Vital do Rêgo
O atual ministro do TCU começou sua carreira política em 1989, como vereador em Campina Grande. Esteve na Câmara de Vereadores por dois mandatos consecutivos. Em 1995, foi eleito deputado estadual, tendo ocupado o cargo por três mandatos consecutivos. Foi deputado federal de 2007 a 2011 e senador, de 2011 a 2014, cargo que deixou para assumir o posto de ministro do Tribunal de Contas da União.
No Senado, foi presidente da Comissão Mista de Planos e Orçamento em 2011; e da Comissão de Constituição e Justiça, de 2012 a 2014. Comandou a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Petrobras (CPMI), em 2014.
Também foi relator da reforma do Código de Processo Civil (CPC) e do Código Penal (CP); da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2015; da Lei de Arbitragem; e da lei que altera o modelo de partilha dos royalties do petróleo.
É ministro do TCU desde fevereiro de 2015. Herdou, do ministro José Jorge, os processos que envolviam a Petrobras até então. Entre eles estava o referente à compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.
Com seu voto, o TCU deu parecer favorável à rejeição das contas do governo Dilma, em 2015, por causa de pedaladas fiscais e decretos orçamentários que foram usados no processo de impeachment dela.
Inquérito por suspeita de caixa 2 da Odebrecht
Delações de executivos e ex-executivos da Odebrecht levaram, em abril de 2017, à abertura de inquérito contra ele no STF. Vital do Rêgo era suspeito de receber R$ 350 mil em recursos de campanha originários de caixa dois. Os pagamentos teriam sido solicitados pelo então presidente da Petrobras Transportes (Transpetro), Sérgio Machado.
O inquérito foi arquivado em novembro do ano seguinte, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo o ministro Edson Fachin, do STF, a determinação do arquivamento, atendida em “razão da ausência de provas suficientes de prática delitiva”, não impediria uma eventual retomada das apurações caso surgissem novas evidências.
Inquérito por suspeita de propina na reeleição de Dilma
Vital do Rêgo também esteve envolvido em outro caso. Em maio de 2017, Ricardo Saud, diretor da JBS, afirmou à PGR que pagou propina ao então senador para garantir apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT). Em nota, na ocasião, a assessoria de Vital do Rêgo disse que o parlamentar recebeu doações legais do frigorífico em 2014, quando foi candidato ao governo da Paraíba.
“Elas estão na prestação de contas já analisada e aprovada pela Justiça. O ministro Vital desconhece os fatos narrados pelo delator”, informou a nota.
O inquérito foi arquivado em novembro de 2021, pelo STF, atendendo a pedidos da PGR, que alegou que após cinco anos de investigações não foram colhidas evidências suficientes para acusar os investigados.
Investigação na Lava Jato foi encerrada pelo STF
Vital do Rêgo foi um dos alvos da 73ª fase da Operação Lava Jato, em agosto de 2020, que tinha por objetivo colher provas relacionadas à participação de intermediários no recebimento das propinas.
Ele foi denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro pela força-tarefa. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), Vital do Rêgo, quando era senador e presidente da CPMI da Petrobras, teria recebido R$ 3 milhões de Léo Pinheiro, então presidente da construtora OAS, para que os executivos da empreiteira não fossem convocados para depor na comissão.
Na ocasião, Vital do Rêgo disse ter sido surpreendido. “Causa estranheza e indignação o fato de que a denúncia nasceu de um inquérito aberto sem a autorização do STF”, afirmou.
A investigação foi encerrada em abril do ano seguinte pela Segunda Turma do Supremo. Os ministros consideraram que não havia elementos que justificassem a continuidade das investigações, já que a denúncia foi baseada em delações premiadas, sem elementos para reforçar a acusação.