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Comércio Exterior

Vizinhos de pouca conversa

Curitiba – Os países da América Latina ainda terão de trabalhar muito para que a integração na região seja mais do que um projeto e se transforme em negócios e trocas culturais de peso. Um sinal de que o continente fez pouco nos últimos anos para se tornar mais unido está no comércio exterior. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) mostram que pouco mais de 15% do fluxo comercial latino-americano fica dentro das fronteiras que vão do México à Argentina.

Em 2003, último dado compilado pela Cepal, dos US$ 691 bilhões englobados pelo comércio exterior na América Latina, apenas US$ 109 bilhões vieram de contratos de compra e venda fechados dentro da região – ou 15,7% do total. A parcela do comércio intra-continental ficou estável entre 1990 e 2003, de acordo com a Cepal. No meio da década de 90, o comércio entre os vizinhos parecia estar pronto para decolar. Mas uma série de crises econômicas fez com que a tendência se retraísse.

O economista Rodolfo Prates, professor do Centro Universitário Positivo (UnicenP) e da Universidade de São Paulo (USP), lembra que as primeiras propostas de integração surgiram na década de 50, em teses da Cepal. "Segundo elas, o avanço da industrialização era freado pela fragilidade dos mercados nacionais. A integração entre os países ampliaria os mercados, imprimindo um novo impulso à industrialização", comenta. Só que a estratégia não foi colocada em prática até a década de 90, quando ganhou força um processo de abertura comercial. Agora, há sinais de que a idéia não se tornou ainda uma prioridade regional.

O ideal de integração comercial do continente esbarrou em características econômicas, falta de infra-estrutura, rusgas diplomáticas constantes e na instabilidade política da região. "Há uma relação entre todas essas coisas e comércio", afirma a especialista em comércio exterior Denise Gregory, diretora-executiva do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). "Os interesses comerciais levam ao fortalecimento de relações diplomáticas, investimentos em infra-estrutura e colaboram para a estabilidade política", explica.

Essa relação pressupõe uma evolução de todos os fatores ao mesmo tempo, algo que não ocorreu na América Latina. "O crescimento de comércio que houve no continente foi resultado mais do cenário externo do que de evoluções internas", avalia o diretor-executivo da Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB), José Augusto de Castro. A única novidade durante os últimos 15 anos foi a formação de blocos comerciais dentro da própria AL, como o Mercosul e o Pacto Andino. O resultado foi uma expansão maior nas trocas entre países com acordos comerciais do que entre outros vizinhos.

Para que a integração tenha mais efeitos práticos, é necessário um esforço enorme: construir estradas ligando os principais centros, reformar portos e aeroportos e estimular a melhoria de produtos e serviços para exportação. Essa é a parte fácil, que se resolve apenas com investimentos – algo escasso no continente. O trabalho para superar disputas diplomáticas, criar acordos comerciais eficientes, estabilizar a política regional e fazer com que as economias se complementem é bem mais difícil.

Historicamente os países da América Latina tiveram as economias voltadas para a exportação de bens primários para países mais desenvolvidos. Assim, os vizinhos têm em comum a vontade de vender produtos com baixo valor agregado. Coisas que eles não querem comprar. Essa característica fez com que na década de 60 essas nações tentassem um caminho alternativo à integração regional: a substituição das importações. O Brasil liderou com vantagens essa tendência e hoje abastece a América Latina com dezenas de bens industrializados, como veículos e máquinas, com a vantagem de ter superávit comercial. Parece bom, mas isso não levou a um desenvolvimento linear no continente.

O mais vantajoso para o continente seria o surgimento de ca-deias produtivas interligadas, o que demanda um planejamento integrado das políticas industriais. "Mudar cadeias produtivas não é um ponto trivial e transcende a esfera puramente política. Portanto, é um problema estrutural que impede o avanço comercial entre os países da América", define Rodolfo Prates.

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