O presidente Michel Temer sabe que terá enorme dificuldade para aprovar a reforma da Previdência, e seus aliados já se mobilizam para votar uma versão mais enxuta da proposta, concentrada na fixação de uma idade mínima para a aposentadoria – de 62 anos para mulheres e 65 para homens.
Presente na grande maioria dos sistemas previdenciários mundo afora, o requisito da idade mínima poderia existir no Brasil há quase duas décadas, se não fosse um erro bisonho na votação da reforma da Previdência de 1998, numa sessão da Câmara dos Deputados comandada pelo próprio Temer, então presidente da Casa.
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O principal ponto da reforma apresentada pelo governo Fernando Henrique Cardoso era justamente a idade mínima, então proposta em 55 anos para mulheres e 60 para homens. Quando esse ponto da emenda constitucional foi a votação no plenário da Câmara, na noite de 6 de maio de 1998, FHC precisava de 308 votos.
Como o tema era – e continua sendo – impopular, a tropa de choque do governo passou o dia angariando apoios entre os deputados mais ariscos da base aliada. Mas, no fim, o placar terminou em 307 votos a favor da emenda, 148 contrários e 11 abstenções.
O detalhe é que uma dessas abstenções foi de um deputado governista. Antonio Kandir (PSDB-SP), ex-ministro do Planejamento, pretendia votar a favor da reforma, e seu “sim” era o que faltava para o governo alcançar os 308 votos. Mas acabou apertando o botão errado na hora de votar.
“Companheiro Kandir”
O deputado, que no governo Collor fora um dos mentores do confisco da poupança, acabou saudado por toda a oposição aos gritos de “Kandir, Kandir”. “O companheiro Kandir ajudou a gente”, gritou Chico Vigilante (PT-DF), segundo relato feito à época pela Folha de S.Paulo. No dia seguinte, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) distribuiu nota agradecendo a abstenção.
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Alegando ter certeza de que apertou o botão correto, e que não houve tempo para retificar o voto, Kandir chegou a pedir à mesa diretora da Câmara para retificar seu voto, sem sucesso.
Poucos dias depois daquela votação, FHC daria uma declaração que o persegue até hoje. “Fiz a reforma da Previdência para que aqueles que se locupletam da Previdência não se locupletem mais, não se aposentem com menos de 50 anos, não sejam vagabundos em um país de pobres e miseráveis”, disse o então presidente.
Para compensar o impacto da derrota na idade mínima, o governo criou em 1999 o fator previdenciário, um índice que reduz o benefício de quem se aposenta precocemente. Caso Temer consiga aprovar a idade mínima, a tendência é de que o fator seja extinto, dando lugar a um outro mecanismo de cálculo.
IMPACTO
A idade mínima sugerida por Temer é de 62 anos para mulheres e 65 para homens. A proposta por FHC, que acabou derrubada pelo Congresso, era de 55 e 60, respectivamente. Mas não teria efeito imediato, pois valeria apenas para quem entrasse no mercado de trabalho após a reforma – os primeiros impactos, portanto, apareceriam três décadas após a aprovação, por volta de 2028. O que traria resultado mais rápido seria a regra de transição, válida para quem já estava trabalhando, com idades mínimas de 53 anos para homens e 48 para mulheres. O governo imaginava que pouparia perto de R$ 100 bilhões em uma década caso a regra de transição fosse aprovada – mas ela também não passou.
O QUE PODE MUDAR
Confira as principais propostas de mudanças na Previdência que o governo já sinalizou:
Idade mínima
As últimas declarações do governo indicam que após a reforma a idade mínima para aposentadoria será de 65 anos para homens e 62 para mulheres. Não se sabe o que acontecerá com a fórmula 85/95, aprovada no ano passado. O fator previdenciário pode ser extinto.
Regra de transição
O governo indica que a idade mínima valerá para quem tiver até 50 anos quando a reforma entrar em vigor. Quem tiver 51 anos ou mais terá uma regra de transição, com um acréscimo – de 40% ou 50%, segundo o governo – no tempo de contribuição que faltava para o trabalhador se aposentar pela regra atual. Assim, se faltavam quatro anos para a aposentadoria, esse prazo subirá para até seis anos.
Homens e mulheres
O governo pretende reduzir – ou eliminar, no longo prazo – as diferenças que existem nas regras de aposentadoria para homens e mulheres. Hoje elas conseguem se aposentar mais cedo.
Público e privado
Segundo o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, o governo quer unificar as regras de aposentadoria do regime geral – o INSS, que vale para os trabalhadores do setor privado – e do regime próprio, dos servidores públicos.
Especiais
As regras para profissionais como professores e policiais militares também devem ficar mais rígidas. Mas, ainda assim, tendem a continuar mais brandas que as dos demais trabalhadores.
Rural
O governo pode exigir uma contribuição previdenciária maior dos trabalhadores rurais e passar a cobrar das empresas agrícolas que são exportadoras – hoje elas não contribuem com o INSS.
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