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Ensino infantil

“A escola, como está, é prejudicial à aprendizagem”

 | Hugo Harada/ Gazeta do Povo
(Foto: Hugo Harada/ Gazeta do Povo)
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A educação pública no Brasil tem de melhorar muito para o ensino obrigatório desde os 4 anos valer a pena. Esse é um dos alertas feitos pelo psiquiatra e educador Içami Tiba, autor de dezenas de livros sobre a educação dos filhos e o combate às drogas, que também defende ser impossível resolver o problema da violência sem falar de valores. O especialista esteve em Curitiba no mês passado, a convite da escola Santo Anjo, e falou com a Gazeta do Povo sobre o tema principal de suas palestras na capital: a educação infantil.

A partir de 2016, será obrigatória a matrícula a partir dos 4 anos de idade. Há quem defenda os benefícios da aprendizagem e quem considere a medida abusiva. Qual a sua opinião?

Se a educação no Brasil fosse mesmo um projeto sério, seria ótimo. Mas, infelizmente, sem mudanças drásticas na pedagogia usada por aqui, acho que será apenas mais uma extensão de tempo na escola. Minha opinião é de que a escola, como está, é altamente prejudicial à aprendizagem porque toma tempo demais da vida de nossas crianças e adolescentes para ensinar muito pouco. Gastar 11 anos da vida em bancos escolares para sair de lá como analfabeto funcional? É um absurdo, e é a realidade de muitos dos que saem de uma escola pública. Há jovens que saem do ensino médio sem saber interpretar um relatório.

No entanto, eu não concordo com quem pensa que seja cedo demais para uma criança começar a aprender. Acho retrógrada a ideia de que existe uma idade ideal para começar a estudar. Eu sabia ler e escrever antes de entrar na escola. Quando alguns pais dizem que é preciso poupar os filhos mais novos, eles querem é se poupar. A fase dos zero aos 3 anos é aquela em que a criança mais aprende e é um período muito desperdiçado. Portanto, não sou contra a escola desde cedo, mas sou contra a educação que este governo oferece.

E sobre estímulos pedagógicos desde cedo?

Aprender desde cedo não causa dano algum. Eu acho realmente uma pena que muitos acreditem nisso porque, o que acaba acontecendo, os pais limitam a capacidade dos filhos, reduzindo o saber das crianças somente àqueles conhecimentos que os próprios pais tiveram quando eram pequenos. Além disso, não faz sentido achar que é possível preservar a criança para que não receba muita informação. Antigamente, a família e a escola eram centros de referência, mas hoje se aprende de muitas maneiras diferentes, em muitos ambientes. É como se aprendêssemos no ar. Se os pais ou a escola não ensinarem, a criança vai aprender com a tevê, a internet e os colegas. E aprender qualquer coisa, sem orientação, sem guia, é muito pior.

Por que o senhor acha que o poder público tem tanta dificuldade para suprir a necessidade de vagas na educação infantil?

Porque aqui não se faz planejamento. Os problemas da educação são sempre resolvidos no sufoco, de improviso. As gerações passadas tinham muito mais crianças do que as atuais, portanto, o problema poderia ter sido previsto e resolvido anos atrás. Nos Estados Unidos, por exemplo, há algumas décadas, as classes possuíam 30 alunos por turma. Hoje, eles têm 10 alunos por turma. Você percebe, então, que o problema ficou menor. Aqui, por conta do descaso do governo, nós deixamos o problema crescer. O Brasil tem mais adolescentes do que crianças, mas não dá conta de oferecer escola de qualidade nem a esse número menor de crianças.

O senhor fala muito sobre valores. Acha que a formação em valores recebida desde a educação infantil influencia no caráter de uma pessoa adulta?

Sim, influencia muito. Cito como exemplo os rolezinhos. Seria um movimento bastante normal se não fosse por alguns jovens violentos ali no meio. Sempre penso se o pai daquele jovem sabe que é seu filho quem começa a violência. A falta de valores está na causa de tudo aquilo e a questão dos valores aprende-se, principalmente, em casa. Jovens que não tiveram nenhuma educação em valores vivem e aprendem o que aparece no momento, deixam-se levar por aquilo que é vigente. Quem tem valores sólidos dentro de si é capaz de olhar para uma situação sem ser envolvido por ela, e pode analisá-la e criticá-la.

Qual o papel dos pais nesse processo?

Eu tenho notado muitos pais tolerando coisas demais, coisas que nem entendem, mas acabam sendo intolerantes com o essencial. A impaciência dos pais gera a impaciência nos filhos e a impaciência é a primeira semente para a pressa. Se a pessoa começa a ter pressa demais, fica irritada e depois fica agressiva. Se ficou agressiva, falta pouco para ficar violenta. Vejo muita gente tentando resolver a violência sem falar em valores. Não vai funcionar. É preciso mexer na semente e a semente é ensinar valores às nossas crianças.

E quanto à disciplina? Muitos pais se preocupam em acertar nessa questão, mas ficam inseguros sobre quando e como disciplinar crianças tão pequenas.

A primeira coisa a saber é que não há uma idade ideal para começar a se trabalhar disciplina. Ela começa desde que o recém-nascido pede para mamar. Se a mãe quer ajudar o filho a desenvolver a disciplina, não pode dar o peito sempre que a criança chora e a criança não pode ficar acordada a madrugada toda só porque quer. Pais que querem filhos disciplinados precisam proporcionar um ritmo básico para eles. Quem não tem ritmo desobedece porque a normalidade para ele é justamente a falta de ordem.

Que benefícios isso traz às crianças?

A criança que desenvolve um ritmo básico dentro de si tem a vida melhor em muitos aspectos. Basta comparar, por exemplo, aquelas que dormem bem e sozinhas com aquelas que não têm horário para dormir e só dormem depois de muito balançar no colo ou usando outros artifícios. Aquelas que têm um ritmo bem definido até pedem para dormir na hora pré-determinada pelos pais. É esse ritmo que proporciona melhoras no comportamento, no rendimento escolar e no relacionamento com os outros.

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